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Clientes da 123 Milhas no Pará não querem vouchers: 'Viagem ou dinheiro de volta'

A 123 Milhas se compromete a devolver integralmente os valores pagos, mas somente na forma de vouchers; Governo Federal diz que prática é ilegal

Igor Wilson

Quando Camila Canto e Viviane Oliveira viram, na última sexta-feira (18), a notícia sobre a suspensão de todas as viagens do pacote promocional da agência de viagens 123 Milhas marcadas entre os meses de setembro e dezembro, o choque foi imediato. Como milhares de clientes paraenses, as duas haviam comprado passagens pela promoção ainda no início do ano e se programavam para a viagem tão desejada. O valor bem abaixo do convencional foi o principal atrativo, as fazendo agir até mesmo com certa impulsividade. Camila iria com o Marido para o Rio de Janeiro e comprou as duas passagens de ida e volta pelo preço total de R$ 580; Viviane comprou por R$ 1.000 duas para São Paulo, onde irá com seu companheiro ao concerto da banda RBD, entre os dias 12 e 19 de novembro. As passagens estavam tão baratas que ela comprou mais duas para Recife (PE), marcadas para o início do próximo ano.

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Com a decisão da última sexta-feira (18), clientes cujos voos têm embarque previsto entre setembro e dezembro de 2023 não poderão viajar. A 123 Milhas atribuiu sua decisão ao que classificou como uma “persistência de circunstâncias de mercado adversas, alheias à nossa vontade”. Como forma de solucionar o problema com os milhares de passageiros que adquiriram passagens pelo pacote, a 123 Milhas se comprometeu a devolver integralmente os valores pagos pelos clientes, mas exclusivamente na forma de vouchers acrescidos de correção monetária de 150% do CDI, acima da inflação e dos juros de mercado, para compra na empresa. Para solicitá-los, basta acionar a empresa pelo site oficial ou pelo WhatsApp. Boa parte dos clientes, entre eles Camila e Viviane, rechaçam a oferta e querem a viagem ou o dinheiro de volta.

“O ressarcimento oferecido por eles não cobre nem metade das milhas. Eles não me informaram nada por mail, o que vi foi no Instagram, quando percebi que tava no meio dos clientes lesados. Comprei em março, tinha reservado hotel, passeios, tinha me programado. Só nosso hotel ficou em torno de R$ 1500. Acho que dá por volta de 2.500 reais todo prejuízo. Minha expectativa foi totalmente frustrada. Eu não aceito voucher, a legislação diz que eu tenho que ser ressarcida da mesma forma que paguei, então vou entrar na Justiça com pedido de urgência pra ver se eles emitem as passagens. Tentei procurá-los, mas sempre me redirecionam para um robô e não consigo falar com ninguém”, diz Camila Canto, que mora no bairro da Pedreira.

“Foi minha primeira experiência e está sendo horrível. Comprei os ingressos para o show e depois comecei a pesquisar passagens. Na época tive acesso a 123 Milhas, é um preço bem abaixo do mercado, mas você precisa aceitar uma certa flexibilidade nas datas escolhidas, até aí tudo bem. Só comprei e disseram que dez dias antes eles enviariam um formulário para emissão das passagens. Foi tão em conta que comprei outras duas passagens para Recife. Sempre comprei normal, quando comprei dessa vez na promoção fiquei pensando se ia dar certo mesmo. Não fiz uma pesquisa se pessoas foram lesadas antes, não queria ficar ansiosa nem pensar que ia dar errado comigo. Na sexta entrei no meu Twitter e vi a notícia. Suei frio e quando vi estava no meio desse rolo todo”, diz Viviane, que precisou comprar mais duas passagens para não perder o show. “Tive que comprar no sábado de manhã mais duas passagens, cada uma a R$ 1200”, disse a moradora da Cidade Nova, que também entrará na Justiça contra a empresa.

Governo federal intercede

image Legenda (Cristino Martins/O Liberal)

A onda de clientes revoltados com a decisão da empresa fez o governo federal agir logo após o anúncio da suspensão. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) informou que notificou a agência on-line de viagens, que terá de explicar o cancelamento dos pacotes promocionais. Caso fique comprovada que a decisão da empresa foi ilegal, o governo poderá aplicar sanções econômicas.

“Caso sejam identificadas irregularidades no ressarcimento aos consumidores, abriremos processo administrativo que poderá resultar em sanções à empresa”, disse nesta segunda-feira (21) o Secretário Nacional do Consumidor, Wadih Damous. Sobre os vouchers oferecidos como forma de ressarcimento, o secretário do órgão federal afirma que o método é ilegal. “A empresa não pode oferecer apenas a opção de voucher para ressarcir os clientes, que têm o direito de optar pelo ressarcimento em dinheiro”, disse.

Visão partilhada pelo advogado paraense Kristofferson Andrade. Para o especialista em Direito do Consumidor, que está atuando na preparação da defesa de alguns clientes paraenses, a empresa precisa oferecer mais opções de ressarcimento aos clientes. “A 123 Milhas emitiu nota dizendo que foi a questão do mercado que a levou a tomar a decisão. Sendo ou não isso, o cancelamento é ilegal. A empresa quando oferece o serviço tem que ter todo um planejamento, para saber se aquilo que está vendendo e pelo preço que está vendendo é realmente sustentável financeiramente. Independentemente se houve aumento das passagens ou não, o consumidor não pode ser prejudicado pelo que já adquiriu. Ele pode buscar reparação por dano moral ou material, dependendo da situação de cada caso”, disse o advogado. Para o profissional, o Direito do Consumidor diz que o cliente tem o direito de ser ressarcido da forma como desejar ou, pelo menos, da maneira como adquiriu o produto.

“O consumidor que se sentir lesado pode procurar via judicial para exercer o direito que cabe a ele, que é o direito de escolha. Ele é o único que deve decidir se quer o dinheiro de volta, se quer a emissão do bilhete em outra data ou se aceita o voucher. Mas esse consumidor não pode ficar prejudicado, não é obrigado a aceitar essa proposta. Se quiser, pode recusar, pedir devolução do dinheiro de forma integral e corrigido, ou até mesmo a emissão das passagens na data comprada. Esperamos que o governo possa interferir, até mesmo para impedir que mais coisas assim aconteçam no mercado, pois essa não é a primeira empresa a vender e depois não cumprir”, diz Kristofferson.

O pacote ‘Promo’

A linha ‘Promo’ da 123 Milhas envolve passagens e pacotes com datas flexíveis, por isso, são vendidos em valores abaixo do mercado. Essa modalidade é muito comum em agências de viagem online. No caso das passagens flexíveis da 123 Milhas, a empresa exige que o cliente tenha flexibilidade de 24 horas na data da viagem, tanto na ida quanto na volta. A empresa emite um formulário dez dias antes da data marcada para viagem, onde o cliente preenche e em seguida emite as passagens.

Na prática, funciona da seguinte forma: primeiro, o consumidor sugere as datas e escolhe os locais de origem e destino para viajar. Após a compra, ele deve preencher um formulário detalhando sua disponibilidade. A 123 Milhas, então, emitirá a passagem considerando a flexibilidade. Já ao comprar pacote de viagem flexível, a 123 Milhas se responsabiliza pela escolha e reserva do hotel. O consumidor só precisa escolher a quantidade de diárias e a data da viagem. O voo do pacote segue a mesma lógica das passagens flexíveis.

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