Por que 9.9 e não 10? Jurados falam sobre como avaliam os desfiles das escolas de samba de Belém
Especialista no assunto Larissa Boulhosa e Miguel Santa Brígida comentam sobre o assunto
Nesse final de semana, Belém acompanhou os desfiles das escolas de samba do Grupo Especial. Nos bastidores do desfile das escolas de samba, os jurados desempenham um papel crucial com uma avaliação meticulosa de cada quesito do espetáculo. Especialistas no assunto Larissa Boulhosa, jurada do quesito comissão de frente no desfile das escolas de samba de Belém 2024, e Miguel Santa Brígida, multiartista e pesquisador de Carnaval, falam sobre os critérios de avaliação.
Com 15 anos de experiência, Larissa pontua os critérios que são essenciais no defile. "Os principais quesitos, os mais importantes, são o samba-enredo, que dá energia para a escola, o enredo, a bateria, alegorias e fantasias. Alegorias e fantasias precisam estar com a paleta de cores, de acordo com a proposta que a escola vem trazendo também”, destaca.
Miguel diz que além do sentido técnico, os avaliadores se fundamentam em três aspectos: o equilíbrio, o bom senso e a ética. complementa enfatizando a importância do equilíbrio físico e mental do jurado. Ele ressalta: "O equilíbrio de um julgador é o equilíbrio físico que é estar bem alimentado, bem dormido, preparado fisicamente, porque é uma jornada normalmente de noite, madrugada até o amanhecer. Você está com seu corpo organizado, equilibrado, tem um bom senso. O bom senso? Você está julgando uma obra de arte. É importante a gente remarcar sempre essa qualidade, que é um espetáculo cênico, artístico, da maior importância para o mundo, que só tem no Brasil, criado pelo brasileiro. Então você está julgando uma obra de arte, então você tem que ter bom senso no sentido de entender”.
No momento da apuração sempre tem aquele avaliador que dá 9.9 ao invés de 10 e o público sempre tenta entender onde se perde esse décimo. Larissa aponta que o 10 representa a excelência absoluta, algo que se define, muitas vezes, em detalhes. Ela exemplifica: "No caso da coreografia, os movimentos de braço precisam estar sincronizados. Os desenhos coreográficos não podem ter erros. São esses detalhes que custam décimos e fazem a escola ganhar o 9.9".
Miguel acrescenta que essa pequena diferença na pontuação pode estar relacionada com o deslocamento da escola pela avenida, a imprevistos, como problemas técnicos ou mudanças climáticas que afetam os elementos visuais e artísticos da apresentação. “Se chover e o que era verde claro fica verde escuro ou uma fantasia pode começar a se desmanchar porque não foi bem confeccionada, ou os brincantes se empolgam muito e a fantasia alterar sua forma devido à dança. Eu tô dando exemplo da fantasia, mas alegoria também pode acontecer isso. Um casal de mestre sala também pode estar mais cansado, a fantasia pode ter problema, a escola passa alinhada numa cabine, na outra o samba já pode ter atravessado, evolução idem. Ou seja, tudo vai se transformando nesse deslocamento entre 400 e 700 metros”.
Sobre a harmonia, Larissa destaca sua importância na fluidez do desfile: "A harmonia é um quesito bem delicado. Ela trata de manter a continuidade do desfile, sem deixar espaços vazios entre as alas. Isso é muito difícil de alcançar, especialmente com imprevistos como problemas mecânicos nos carros alegóricos. Um exemplo: Vem um carro alegórico aí passa um buraco enorme para começar uma sala, ou um quesito, um porta-estandarte, um mestre sala e porta-bandeira, então assim, a harmonia ela trata disso, ela não pode deixar acontecer esses buracos, né?"
Miguel complementa, ressaltando que cada quesito é avaliado em sua especificidade, desde o ritmo da bateria até a precisão dos passos dos dançarinos. "Não abrir buracos entre as alas, a escola manter um ritmo cadenciado de desfile, parecem coisas simples, mas conseguir isso num corpo que caminha, que se desloca, com 3.500 pessoas, em média, é uma grande dificuldade," explica ele.
Imprevistos acontecem e disso os jurados sabem. Mas, existem detalhes que eles não perdoam em um desfile. Larissa destaca a importância da disciplina dos brincantes e a qualidade do acabamento das fantasias e carros alegóricos. "O que é imperdoável é os brincantes irem pra avenida alcoolizados. A gente vê muitas pessoas com mochila na costa por cima da fantasia. Isso desconta muito ponto," diz a avaliadora. Para Miguel, o imperdoável é a falta de entusiasmo e energia por parte dos participantes. "O que é imperdoável em uma escola de samba é ela realmente não cantar e não dançar. É um espetáculo de canto, dança e batuque," ressalta ele.
Larissa complementa falando sobre a importância da musicalidade na escola, como um dos fatores mais importantes. “É imperdoável a falta de instrumentos na bateria. Mas acontece muito isso. O acabamento dos carros alegóricos e fantasias também é muito importante. Não pode ter fantasias mal acabadas. Outra coisa que é muito importante: os brincantes precisam aprender a letra do samba-enredo para arrasar na avenida. E nem sempre isso acontece”, diz.
As escolas de samba de Belém do grupo especial desfilaram neste final de semana, nos dias 1 e 2 de março. A apuração das notas e o resultado da grande campeã do carnaval paraense acontece na próxima quarta-feira (6).
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