Cantoras mostram seu protagonismo na cena musical paraense
Cantando samba e pagode, artistas encontram desafios na noite, que tem primordialmente a presença de homens no meio
Ocupar espaços tem sido uma batalha diária de muitas mulheres. Que tal fazer um exercício diário: quantas mulheres estão ao nosso redor? Por exemplo, em uma festa que toca samba e pagode: quantas mulheres estão no palco?
Cantando pagode e presente em algumas das festas populares do ritmo em Belém, Cacau Sinimbú, Leticia Moura e Rafaela Travassos dividem a satisfação e as lutas de levar a música por onde passam.
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Cacau está há quase 10 anos na música, ela manteve boa parte da sua carreira cantando sozinha, mas também foi vocalista de uma banda só de mulher. “Comecei literalmente cantando pagode! Cresci na Marambaia, em um bairro que tinha uma das maiores casas do movimento e mesmo sendo 'menor de idade', tinha altura e a postura de ficar escondida, curtindo, vendo e ouvindo as bandas se apresentarem. Era mágico pra mim!” relembrou.
A cantora consegue enxergar a dificuldade para além do Estado: “ O mercado nacional ainda está difícil, barreiras mesmo... Em Belém não é diferente... Não temos a muito tempo uma referência 'forte' e no momento temos sim, cantoras com carreiras formadas em outros estilos, cantando pagode!"
Cacau destaca ainda a ausência de mulheres nessa linha de frente e diz que quando encontra mulheres trabalhando na noite é geralmente no caixa, na cozinha ou em alguma profissão de serventia, “raramente tem mulher no palco, como musicista”, enfatizou.
Diferente de Cacau, Leticia Moura faz parte de uma banda. O Virtudão é compostos por homens e tem apenas uma mulher, que é ela. Everton Martins, sócio da banda, começou a ver o número de contratos caindo depois que ela foi anunciada no vocal da banda.
“Vi uma queda de 30% a 40%, mas algumas pessoas já voltaram a contratar. Recentemente não fechamos um casamento, porque uma contratante não queria um show todo feito por mulher”, lembra Everton.
Leticia Moura foi anunciada no Virtudão em 2020, e após esses dois anos foram sucessivas aprovações. “Acho que a cena musical é difícil para as mulheres em geral. Nossa competência sempre é questionada, nossa aparência é julgada, temos que ser muito mais que os melhores pra poder nos destacarmos, fora a valorização financeira que como qualquer meio, temos que ‘merecer’”, avaliou a cantora.
Everton disse ainda que em diversas situações Leticia Moura tem jogo de cintura, mas na verdade, como as mulheres estão em constantes aprovações, esse tipo de situação é corriqueira, mas elas não podem ser normalizadas.
“Para a mulher a vida no geral precisa ser mais democrática. Precisamos mostrar a nossa voz, competência, provar habilidades em meios predominantemente masculinos. O bom disso é que quando a gente aparece, aparece bem! Nos destacamos! Mas eu pessoalmente preferiria que essa surpresa não existisse mais. Que nossa presença já fosse algo tão comum que não causasse estranheza”, desabou.
A artista começou a cantar na igreja aos 15 anos e aos 16 já estava em uma banda de pagode. Letícia fez parte também de uma banda só de mulheres, a Sambarock S/A. Em 2015, ela entrou no formato vip do Virtudão, com show para bailes.
NO SAMBA
Quem trabalha com samba, não é diferente. Há 10 anos, Rafaela Travassos sabe bem os percalços enfrentados durante a sua caminhada. “Hoje já consigo viver da minha arte e isso pra mim é de grande importância já que venho fui muito presa em casa pois meu pai não queria isso pra mim, machismo dele (risos)”, enfatiza a artista.
Rafaela já dividiu palco com grandes nomes do samba brasileiro: JoãoMartins, Renato Milagres, Renato da Rocinha, Almir Guineto, Leci Brandão, Toninho Geraes, Arlindo Cruz, Sombrinha, Reinaldo, Marquinho Satã, Zeca Pagodinho, Fundo de Quintal e tantos outros.
Com a voz de tonalidade aguda, a paraense de 30 anos, não passa despercebida nas festas dos “bambas”. “Bem vou dizer sobre o que vejo na nossa cidade: ainda falta muito para outras grandes mulheres cantoras talentosíssimas terem mais oportunidades, eu particularmente não tive tanto problema em entrar no mercado, porém vejo que com outras colegas que estão chegando agora, tem sim uma certa falta de inclusão dos nossos colegas homens, por isso ano passado resolvemos nos unir e criar o ‘Coletivo Tem Mulher na Roda de Samba’ no intuito de emponderar e incentivar as mulheres talentosas desse estado”, finalizou.
O “Coletivo Tem Mulher na Roda de Samba” é o primeiro do Norte com cantoras, mas também instrumentistas, percussionistas, cenotécnica, direção de palco, técnicas de som, entre outros. Ele faz parte de um movimento nacional de mulheres na roda de samba.
“Nós temos vários exemplos de mulheres dentro do samba que lutaram e resistiram muito para que hoje nós possamos levar nossos talentos pelo mundo a fora, é nelas que nos espelhamos, nosso protagonismo muito das vezes é tentado ser apagado. Acho que deveriam ter mais leis culturais que beneficiassem mulheres e negras principalmente”, finalizou a artista.
Rafaela Travassos fará no dia 12 de março show na Casa de Samba Belém. A festa “O Samba é delas” terá a atração nacional Entre Elas.
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