Festa da Chiquita é território de convivência entre gerações; conheça a festa
Evento cultural e político reúne, há 47 anos, gerações em torno da diversidade e da inclusão durante o Círio de Nazaré
Desde 2004, quando o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) deu ao Círio de Nazaré o título de Patrimônio Cultural Brasileiro, a Festa da Chiquita é reconhecida como evento integrante da agenda nazarena — ainda que, até hoje, a Igreja Católica não o legitime como tal. Em 2020, outro marco: a Chiquita foi declarada como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado do Pará (Lei Nº 9.025), reforçando sua importância para a história LGBTQIA+ de Belém. Títulos à parte, desde suas origens como um bloco de carnaval, nos anos de 1970, até os dias atuais, a Festa se consolidou como um espaço de celebração, resistência e diversidade, atravessando gerações há 47 anos.
Acompanhe a transmissão do Círio 2024 ao vivo.
VEJA MAIS
Elói Iglesias, coordenador geral do evento, é uma figura central na história da Chiquita. Aos 69 anos, ele relembra o início do movimento, que surgiu em meio à contracultura e às lutas políticas pela anistia no Brasil. “A gente sempre teve a Carmem Miranda como o ícone da cultura LGBT no mundo”, destaca, referindo-se ao impacto da artista na criação do bloco que deu origem à Festa.
O evento começou como algo "doméstico, entre amigos", mas rapidamente se transformou em uma manifestação popular que desafiava preconceitos e abraçava a diversidade na Praça da República, em pleno centro de Belém.
“Na hora que você tem essa garantia [do IPHAN], é uma carta de alforria”, afirma Elói.
Apesar desse reconhecimento, ele aponta que ainda há uma longa jornada pela frente, especialmente em um país onde “o preconceito de classe” e a marginalização de minorias persistem. Realizada no sábado logo após a passagem da Trasladação pela avenida Presidente Vargas, a Chiquita é um espaço de encontro e diálogo: “A política que é feita na Chiquita é um pouco diferente da política das paradas. Nós fazemos política com alegria, e a Chiquita é a garantia desse território de convivência e encontro”, pontua o coordenador.
VEJA MAIS
Pelo caráter político e cultural da Festa, a cada ano, novos artistas e ativistas se juntam à causa. Uma delas é Johann, drag queen e cantora de 27 anos, que vê na Festa da Chiquita um espaço de resistência e rebeldia. “Ser convidada pelo Elói para cantar é um privilégio. Ele representa a nossa própria vida. Eu existo montada na rua porque ele já fazia isso há muito tempo”, conta Johann, refletindo sobre a oportunidade de celebrar a fé de forma plural. “A Chiquita no Círio me fez perceber a dimensão desse momento. A fé se manifesta em qualquer religião, até para quem não tem religião”, completa.
A nova geração de artistas que participa da Festa, como Johann, é inspirada pelas lutas e conquistas das gerações anteriores. “Eu vejo pessoas que abriram um caminho, que peitaram muito a sociedade, e hoje eu estou aqui”, afirma Johann, reconhecendo o legado de figuras como Elói e outras drags que pavimentaram o caminho para a visibilidade LGBTQIA+ em Belém.
O publicitário Hugo Tomkiwitz, 35, faz parte de uma geração que cresceu admirando a Chiquita e, hoje, trabalha diretamente na organização do evento. Ele descreve a importância pessoal da festa: “A Chiquita me trouxe força, conhecimento, me fez transcender um pouco minha essência para descobrir quem eu sou hoje”.
Com o passar dos anos, a Festa da Chiquita se profissionalizou e ampliou seu alcance. Hugo relembra que, quando começou a frequentar a Chiquita, as drags eram vistas de forma marginalizada. Hoje, elas ocupam um lugar de destaque, com figurinos luxuosos e shows que atraem grande público. “As drags de hoje já chegam bem posicionadas, com todo esse brilho e glamour que as outras, que passaram por muitas dificuldades, não tiveram”, analisa Hugo.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA