Projeto de Escolas de Samba quer tornar carnaval de Belém sustentável
A iniciativa tem ainda como parceiros a Prefeitura Municipal de Belém e o Governo do Estado do Pará
A partir deste ano, o Carnaval de Belém entrará em uma nova fase. Além da alegria dos brincantes das escolas de samba, a folia de Momo reciclará materiais para melhorar o mundo. Um novo projeto da entidade Escolas de Samba Associadas (ESA) de Belém, que congrega as escolas do grupo especial, em parceria com a Prefeitura Municipal e o Governo do Estado, planeja transformar o Carnaval da capital paraense no primeiro desfile das escolas de samba sustentável do mundo.
O projeto Carnaval Sustentável pretende criar uma grande rede em que as agremiações carnavalescas utilizem materiais recicláveis e substituam cada vez mais as matérias-primas de alegorias e fantasias por produtos reutilizados ou menos poluentes. A ideia surgida pelo presidente da ESA, Fernando Guga, pretende estabelecer para Belém um novo perfil com diferencial para o Carnaval. O intuito é fazer com que se crie uma cadeia produtiva inédita no mundo para utilização de materiais recicláveis e sustentáveis para serem utilizados pelas escolas.
“Desde que me envolvi no Carnaval, primeiro como presidente do Rancho e depois quando comecei a trabalhar na ESA, me intrigava o saudosismo do Carnaval de Belém dos anos 80. Eu sou apaixonado por esses anos também, trazíamos os grandes cantores e artistas para Belém que era riquíssimo, mas a partir daí passamos a viver da saudade do que foi. Diziam que o Carnaval de Belém era decadente. Eu penso que o nosso tempo é hoje, e o que passou já era. Comecei a pensar, o que Belém tem que fazer para voltar a ser referência da produção de Carnaval?”, relembra.
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Diante de muitas notícias negativas nos últimos anos sobre queimadas e destruição do meio ambiente, Guga teve a ideia de aproveitar o Carnaval com uma campanha de conscientização sobre a importância da preservação, depois a ideia se expandiu para a utilização de materiais renováveis e recicláveis. No início o presidente da ESA teve dificuldade para fazer as escolas entenderem do que se tratava o Carnaval Sustentável, mas depois todas decidiram aderir à iniciativa. O projeto conta com o apoio técnico dos pesquisadores Paulo Pinho e o Aldo Gatinho.
COP - O planejamento é que em 2025, ano da Conferência das Partes (COP) 30, que será realizada na capital paraense, as escolas de samba farão o 1° Carnaval Sustentável. “A ideia é que seja um percentual de alegorias e de fantasias com material reciclável. Se cada escola vai com mil fantasias em média, e em cada ala tem 100 pessoas, fora as fantasias de destaque e quesitos, queremos ter 200 fantasias feitas com materiais recicláveis, o que representará 20% do total. Vamos colocar isso como regulamento”, adiantou Guga.
Algumas escolas de samba já se adiantaram e incorporaram às suas alegorias e fantasias materiais recicláveis para substituir outros produtos. Esse é o caso da Escola de Samba da Matinha que utilizará 20 mil CDs, copos descartáveis, garrafas pet e palha do município de São Caetano em quatro alegorias e cinco alas. A escola aliou a reciclagem com o tema que será “Epaminondas Gustavo - Chama o pessuá, o caboclo d’Odivelas vai passa!”. Os CDs foram doados pelo Tribunal de Justiça do Estado o Pará, local onde Cláudio Rendero, que interpretava Epaminondas, era juiz.
“Para a Matinha veio a calhar por duas situações. Primeiro, é um material muito mais barato para os custos do Carnaval, e o segundo é porque nosso homenageado será o Epaminondas Gustavo que era uma dos caras mais regionalistas, que praticava a cultura paraoara. Vamos trazer isso para a festa, utilizar coisas regionais, o nosso Carnaval vai ser todo regional, utilizando materiais regionais como palha, paneiros e os CDs”, conta o presidente da Matinha, Rodolfo Trindade.
Em uma das alas intitulada “Juiz com alma de artista” os espelhos que seriam utilizados na fantasia foram substituídos por CDs inteiros e quebrados, o que manteve o reflexo e a intuito da fantasia. A escola analisa que economizou de sete a dez mil reais com os produtos reciclados. “Os CDs ajudam proporcionando brilho nas fantasias. Vamos utilizar aquela parte brilhosa que reflete, como se fosse um espelho. Economizamos aproximadamente de sete a dez mil reais com essa mudança”, revela.
PILOTO - O projeto piloto começa já em março de 2024 com o desfile das escolas de samba na Aldeia Cabana Amazônica David Miguel com o recolhimento dos materiais e peças de fantasias e alegorias, que caírem durante o desfile, ou que forem descartados ao final. O lixo coletado será analisado e avaliado para as possíveis destinações. Duas cooperativas de catadores já estão prontas, junto com equipes da Secretaria Municipal de Saneamento de Belém (Sesan), para esse trabalho.
INVESTIMENTOS – Para que o projeto saia do papel a ESA conta com a parceria com a Prefeitura Municipal de Belém e com o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Cultura (Secult). Tanto Estado, quanto município, já investem nas escolas de Belém com repasses que somam R$ 173 mil para cada escola do grupo especial, sendo R$ 113 mil da prefeitura e R$ 60 do Governo do Estado. No total, a gestão municipal concedeu neste ano R$ 2,7 milhões como subvenção para escolas e blocos carnavalescos de Belém e o Estado um pouco mais de R$ 1 milhão.
A Prefeitura Municipal de Belém (PMB) participará do Carnaval Sustentável com vários órgãos sob a coordenação da Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel). A presidente da Fumbel, Inês Silveira, espera que essa seja uma oportunidade para as escolas de samba angariarem recursos privados e estrangeiros para investir e se tornarem mais independentes.
“Temos conversado com as entidades que congregam as escolas e blocos para pensar projetos de captação de recursos para além da subvenção. Eu não posso hoje falar sobre aumento da subvenção, e elas gritam por isso. Esse é o primeiro Carnaval que Belém vai ter 100% de participação. Até o ano passado se fez um Carnaval ainda com algumas restrições”, compara Inês. “A gente vai iniciar o planejamento logo após o desfile para que em 2025 tenha essa movimentação todinha para a realização da COP. Para que nós estejamos junto com as entidades buscando novos momentos e recursos juntos para somarmos”, destaca.
A secretária estadual Úrsula Vidal adianta que já estão ocorrendo reuniões com o setor empresarial como a representação da Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA) para que envolver o setor privado no projeto. O planejamento do Carnaval Sustentável será realizado ao longo deste ano.
“Eu acredito que vamos fazer um Carnaval muito original no Brasil e alinhado com a missão estratégica e comunicacional do Estado do Pará e da Amazônia com a conscientização de um novo planeta. O Carnaval é essa caixa de ressonância, estamos fazendo da maior festa popular que nós temos uma prática a partir do respeito social e da biodiversidade, não só para as escolas de samba de Belém, como pode ser uma iniciativa replicada em outros estados da Amazônia”, imagina.
Para Fernando Guga, o limite para o Carnaval Sustentável é o céu da criatividade paraense. “Através dessas parcerias com as autoridades realmente vamos buscar recursos internacionais. Vamos estabelecer o Carnaval Sustentável dentro das nossas possibilidades. Se tivermos como investir em maquinário, espaço, corpo profissional e industrial, o céu é o limite, a criatividade das pessoas é o limite. Vamos jogar brilho e luz no Carnaval de Belém”, almeja Guga.
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