STJ decide que Lei Maria da Penha pode ser aplicada para violência doméstica contra mulheres trans

A decisão é inédita em um tribunal superior

Luciana Carvalho
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A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu nesta terça-feira (5) que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada em casos de violência doméstica e familiar contra mulheres transexuais. A decisão é inédita em um tribunal superior e pode orientar futuras análises de casos semelhantes nas instâncias inferiores. As informações são do Estadão.

O colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto do relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, que destacou a transfobia por trás da discussão que chegou à corte superior e afirmou que o Brasil é um País com recordes ‘ignominiosos’ (vergonhosos) no trato com pessoas trans.

O ministro destacou que a ‘cultura patriarcal e misógina’ se reflete nos índices de assassinatos de transexuais e de travestis, ‘que há 13 anos insere o Brasil como o maior número de assassinatos de pessoas trans no mundo’, ressaltou o ministro.

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Citando que 140 pessoas trans foram assassinadas em 2021, o ministro destacou: “É um dado preocupante, porque reflete talvez um comportamento predominante nessa cultura, que não aceita identidade de outras pessoas que não aquelas que a nossa formação nos levou a definir, até por questões religiosas como identidades relacionadas tão somente ao sexo, à característica biológica”.

Ao defender que a Lei Maria da Penha assegura mecanismos de proteção às mulheres trans, o ministro ressaltou como seu voto foi fundamentado em estudos científicos e na jurisprudência sobre os direitos de tal população.

O entendimento foi firmado em julgamento realizado nesta terça-feira, 5, quando foi analisado recurso do Ministério Público de São Paulo contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado, que negou medidas protetivas a uma mulher trans que sofre agressões de seu pai. O argumento da corte paulista era o de que a Lei Maria da Penha só poderia ser aplicada para pessoas do sexo feminino, desconsiderando o conceito de identidade de gênero. Mas os ministros decidiram, por unanimidade, que uma mulher trans agredida pelo pai tem direito a medidas protetivas com base na Lei Maria da Penha. Eles entenderam que a lei trata de ações de violência doméstica contra a mulher baseada no gênero, e não em aspectos biológicos. 

Em manifestação realizada durante o julgamento desta terça-feira, 5, a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge destacou como a Lei Maria da Penha configura violência doméstica e familiar contra a mulher ‘qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial’. Nessa linha, a subprocuradora-geral explicou que o conceito de ‘gênero’ envolve um ‘conjunto de características e construções sociais, relacionadas aos papéis atribuídos a cada grupo’.

A ex-procuradora-geral da República, antecessora de Augusto Aras, também defendeu que o STJ levasse em consideração o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, aprovado como recomendação para o Judiciário pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

(Luciana Carvalho, estagiária, sob supervisão de Keila Ferreira, Coordenadora do Núcleo de Política.)

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