Justiça decide que mais 2 acusados pelas mortes na boate Kiss irão a júri popular

Ambos eram sócios da casa noturna atingida por uma tragédia que matou 242 pessoas

Agência Estado

Os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) decidiram que Mauro Londero Hoffmann e Marcelo de Jesus dos Santos, dois dos quatro denunciados pela morte de 242 pessoas no incêndio da boate Kiss, irão a júri popular em Porto Alegre em data ainda não definida. Mauro e Marcelo serão julgados com Elissandro Callegaro Spohr, outro acusado pela tragédia que completou sete anos no último dia 27, que já havia conseguido a transferência do julgamento para a capital do Rio Grande do Sul.

Dessa maneira, o primeiro júri referente ao caso, que está marcado para o dia 16 de março, irá analisar apenas as acusações contra Luciano Bonilha Leão, o único réu que não pediu a transferência de local e será julgado em Santa Maria, palco da tragédia.

Mauro e Elissandro, sócios da casa noturna, e Marcelo e Luciano, integrantes da banda que apresentou show pirotécnico na noite do incêndio, foram denunciados por homicídio duplamente qualificado (motivo torpe e emprego de meio cruel) por 242 vezes, e tentativa do mesmo crime por mais 636 vezes (número de sobreviventes identificados).

A decisão foi dada na última quarta-feira, 12, quando foi analisado o pedido de desaforamento - transferência do processo de um local para outro - feito por Mauro e por Marcelo. Eles alegaram que havia "interesse da ordem pública" em transferir o julgamento para Porto Alegre e que havia dúvida sobre a parcialidade dos jurados.

Além disso, as defesas argumentaram que "o ambiente mais distante e controlado da justiça de Porto Alegre distensionaria a sessão" e ainda lembraram que, em dezembro, a 1ª Câmara Criminal deferiu para Elissandro.

O relator dos pedidos, desembargador Manuel José Martinez Lucas, negou os pleitos, mas foi vencido por dois votos a um. O magistrado considera que o desaforamento é medida concedida só em situações excepcionais, uma vez "que os autores dos crimes dolosos contra a vida devem ser julgados pelos membros da comunidade onde os fatos foram cometidos".

Martinez Lucas indicou ainda que não há como afirmar que a segurança dos réus seria maior em Porto Alegre, pois "todos os interessados, especialmente os familiares das vítimas falecidas e talvez alguns sobreviventes para cá se deslocariam".

O desembargador Jayme Weingartner Neto abriu divergência, indicando que em Porto Alegre "há maiores chances de um julgamento imparcial, justo por que mais distante". A indicação foi acompanhada pelo desembargador Honório Gonçalves da Silva Neto.

"A desterritorialização do local da tragédia, com a convocação da mais distante (geográfica e simbolicamente) justiça da capital do Estado, torna muito razoável a conjectura de que a autocontenção dos mais diretamente atingidos será favorecida pelo ambiente mais neutro, menos carregado de lembranças, associações, idiossincrasias", escreveu Weingartner Neto.

O magistrado afirmou que, 70,7% dos 600 entrevistados em pesquisa de opinião realizada em Santa Maria, pelo Instituto Methodus, "perderam pessoas queridas no incêndio". Dos ouvidos na pesquisa, 9% perderam parentes, 61,7% perderam amigos. "O problema, aqui, repito, do trauma coletivo, difuso e disseminado, dificulta que funcione efetivamente o filtro, e esmaece a eficácia do contraditório, para formar-se o Conselho de Sentença (artigos 471 e 472). Em resumo, o teste empírico sobre a higidez do Conselho de Sentença é fragilizado", apontou o desembargador.

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