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Reitor da UFPA defende construção de um novo modelo de ação do poder público na Amazônia

Emmanuel Zagury Tourinho ministrou conferência, nesta quinta-feira, durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)

Dilson Pimentel

“Apenas com a construção de um novo modelo de ação do poder público na região e de construção de novos consensos nacionais sobre a Amazônia, em outras bases, alguma possibilidade existirá de conservar o seu patrimônio natural e cultural para as gerações futuras”. É o que afirmou, nesta quinta-feira (11), o reitor da Universidade Federal do Pará, Emmanuel Zagury Tourinho.

Como parte da programação científica da 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ele ministrou, no Campus da UFPA, a conferência “Ciência em rede para o desenvolvimento da Amazônia”. A mesa contou com apresentação do professor Paulo Artaxo, da Universidade de São Paulo, e vice-presidente da SBPC.

Tourinho falou sobre o significado de fazer ciência na Amazônia e das direções que podem ser seguidas para tornar o trabalho na região mais robusto e capaz de impactar as vidas das pessoas que vivem na região, contribuindo para um futuro efetivamente sustentável e inclusivo. O reitor apontou que a Amazônia é frequentemente descrita a partir das expectativas quanto à prestação de serviços ecossistêmicos, como estabilidade climática, sequestro e armazenamento de carbono, e produção e distribuição de chuvas com seus “rios voadores”.

“Tudo isso é, em algum sentido, real e justifica o interesse ou preocupação com o que nela ocorre a todo momento. Para quem vive na região, porém, é adicionalmente impositivo pensar a Amazônia como um território de intensas e recorrentes violências e violações de direitos, de acentuada degradação ambiental e comprometimento das condições de vida, de precária presença do Estado e de incontrolada ação de organizações criminosas”, afirmou, destacando a diversidade de “Amazônias” dentro da região.

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Reitor cita o “princípio do vazio” existente na região

Durante a apresentação, Tourinho também falou sobre as populações da Amazônia e a inteligência científica regional. Ele chamou atenção para o fato de que, apesar de cerca de 22 milhões de pessoas viverem na região, prevalece até hoje um “princípio do vazio” - ou seja, a prática de pensar região de fora para dentro, ignorando as populações amazônicas.

“O princípio do vazio também se manifesta no espaço de consideração das forças intelectuais e científicas que devem ser mobilizadas - ou melhor, que devem liderar o esforço de compreensão da realidade amazônica e de concepção de projetos para a região. Ocupando posições minoritárias nas sociedades científicas, nos ministérios, agências de fomento e postos de decisão política, os intelectuais e cientistas que vivem o cotidiano da Amazônia raramente estão no centro das decisões sobre o que pode ou deve ser feito na região”, criticou.

Atualmente, estão na Amazônia 13 Universidades Federais (sendo a UFPA a maior delas), três institutos de pesquisa vinculados ao MCTI (INPA, MPEG, Mamirauá) unidades de institutos de pesquisa federais sediados no sudeste (Fiocruz, INPE) e unidades da Embrapa. Há, ainda, organizações não governamentais, que formam um universo heterogêneo de competências e interesses, mas dentre as quais encontram-se alguns grupos com expertise científica. 

As instituições científicas sediadas na Amazônia abrigam 289 programas de pós-graduação, que ofertam 105 cursos de doutorado e 282 cursos de mestrado. Algumas centenas de pesquisadores sustentam esses programas e formam novas gerações de cientistas amazônidas todos os anos, com um trabalho continuado de altíssimo nível, responsável pela maior parcela de conhecimento científico sobre a região, afirmou.

“Destaco, neste ponto, que a Universidade Federal do Pará é, hoje, segundo a base internacional de dados da Web of Science, a maior produtora no mundo de ciência sobre o Amazônia, dado também apresentado no Boletim Temático de Bioeconomia do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)”, afirmou.

Forças sociais da Amazônia raramente são ouvidas, afirma Tourinho

No entanto, observou Emmanuel Zagury Tourinho, as forças sociais, políticas e intelectuais da Amazônia, no entanto, são raramente ouvidas, ou raramente exercem protagonismo na definição de programas e políticas para a região.

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Ele acrescentou: “Prevalece, como regra, o colonialismo, uma atitude de negligência para com a inteligência local e uma tendência a olhar para a região de modo fragmentado, focado, a cada momento, em uma fração das riquezas a serem exploradas, sem capacidade e disposição para a tarefa de compreender a complexa teia de relações entre os grupos sociais e a natureza que, por séculos, foi capaz de garantir a subsistência dos povos e de manter a integridade da floresta e dos rios - responsáveis pelo ativo ambiental que representa a Amazônia hoje para o país e para o todo o planeta”.

Tourinho apontou que a complexidade da realidade amazônica impõe um esforço de pesquisa diferenciado para a ciência nacional. Ele destacou a necessidade e importância da articulação em redes entre parceiros amazônicos e não amazônicos e citou a iniciativa do Centro Integrado de Sociobiodiversidade da Amazônia, o CISAM. Liderado e coordenado pela UFPA, o CISAM passou a contar com pesquisadoras e pesquisadores de todas as demais 12 Universidades Federais instaladas na Amazônia Legal.

Oito redes temáticas de pesquisa foram fortalecidas ou constituídas com a participação de cientistas das 13 Universidades Federais Amazônicas, colaboradores de universidades brasileiras de outras regiões e parceiros estrangeiros. Seu foco está em algumas das áreas hoje centrais para o debate sobre a Amazônia. São elas: 1) Biodiversidade e Conservação; 2) Monitoramento de Água, Floresta, Solo e Clima; 3) Monitoramento do Oceano e da Foz do Amazonas; 4) Contaminação Ambiental e Saúde do Amazônida; 5) Povos e Populações da Amazônia; 6) Cidades, vilas e territórios Amazônicos; 7) Dinâmicas Socioeconômicas Territoriais e Fundiárias na Amazônia; e 8) Inovação, Sociobioeconomia e Desenvolvimento Sustentável.

“As redes de pesquisa são um caminho importante para fortalecer as instituições amazônicas de pesquisa. O Brasil precisa de instituições de pesquisa fortes na Amazônia. Pelos múltiplos papeis que essas instituições desempenham e porque a sua presença no cotidiano da realidade social amazônica é essencial para que a agenda de pesquisas ganhe em escala de sua relevância social”, defendeu.

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Sob aplausos, o reitor finalizou defendendo que “as comunidades da Amazônia, com as suashistórias e com a sua diversidade étnico-racial, cultural e de modelos civilizatórios, oferecem a oportunidade de concebermos alternativas originais e mais auspiciosas para os nossos desafios como sociedade, alternativas que contemplem um futuro com bem-estar humano e equilíbrio ecológico, integrando saberes ancestrais e descobertas técnico-científicas. É preciso conhecê-las e valorizá-las, não descartá-las. A ciência que fazemos encerra capacidades valiosas nessa direção e tem enorme responsabilidade para com esse futuro”.

O evento começou dia 7, com abertura oficial no Theatro da Paz, em Belém, e segue até o próximo 13 de julho no campus universitário do Guamá, em Belém. O tema deste ano é" Ciência para um futuro sustentável e inclusivo: por um novo contrato social com a natureza", sendo uma oportunidade de não apenas falar sobre a Amazônia, mas falar a partir da Amazônia, amplificando a voz de pesquisadores locais sobre temas importantes para toda a sociedade da região.

Belém