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Calçada obstruída é problema crônico em Belém

Irregularidades atrapalham a locomoção de pedestres, que, às vezes, se arriscam no meio-fio para desvio de obstáculos

Camila Guimarães e Eduardo Rocha

As calçadas são, por lei, espaços específicos para circulação segura de pedestres. Contudo, em Belém, não é raro que elas deixem de cumprir essa função para exercer papéis irregulares, como de estacionamentos, feiras e canteiros de obras, por exemplo. Além disso, também é comum encontrar calçadas com uma série de problemas estruturais, que dificultam a passagem e colocam em risco a vida de pedestres, principalmente daqueles com mobilidade reduzida.

Na rua Diogo Moia, bairro do Umarizal, o comerciante Talis Gama, de 60 anos, tem dificuldade de manobrar o carrinho de mão, que usa para fazer entrega de garrafões de água, por causa dos vários desníveis da calçada: “Não tem uma fiscalização das autoridades, então o morador faz a calçada do jeito que ele quer, sem se preocupar com o pedestre”.

image Na rua Diogo Moia, bairro do Umarizal, os desafios são os desníveis e buracos. (Sidney Oliveira / O Liberal)

Talis diz que há pelo menos 20 anos convive com essa realidade, mas faz uma ressalva a respeito da construção de calçadas cada vez mais altas em frente às casas: "Aqui tem o alagamento também, que faz com que a água da rua entre nas casas. Então, o morador acaba fazendo essas barreiras”.

Além disso, apesar de o artigo 181 do Código de Trânsito Brasileiro determinar que estacionar na calçada é uma infração grave, a prática é bem comum na vizinhança de Talis Gama: “Onde a calçada é baixa, os carros param em cima e o pedestre é obrigado a andar pelo meio da rua”. 

image Carros estacionados em cima das calçadas são uma realidade em vários pontos de Belém. (Sidney Oliveira / O Liberal)

Semob

Segundo dados da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (Semob), só entre janeiro e fevereiro deste ano, 146 multas já foram aplicadas por infrações do tipo. No ano passado, o número chegou a 2.665.

E além do estacionamento irregular por parte dos motoristas, empreendimentos, como uma borracharia a poucos metros da casa de Talis Gama, também acabam usando as calçadas como espaço de trabalho, para posicionar veículos em reparo.

Em outro ponto da cidade, voltando para casa pela travessa Nove de Janeiro, entre Oliveira Belo e Diogo Moia, o servidor público Henrique Almeida, de 66 anos, teve que disputar espaço com os carros na pista, por causa de uma obra particular que tomou conta de toda a calçada em determinado trecho da via: “Eu saí da calçada e vim para o asfalto e estou sujeito a quê? A um atropelamento! Também tem calçada com muito carro, calçada obstruída, com muitos defeitos e eu mesmo já caí numa dessas. E a gente tem que fazer o quê? Desviar”.

O problema se torna ainda mais grave quando se trata de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Segundo o assistente social e diretor técnico e científico da Associação Paraense das Pessoas com Deficiência (AAPPD), Jordeci Santa Brígida, esse público sofre um prejuízo ainda maior por conviver com a falta de acessibilidade nas vias.

“É um descaso do poder público, na realidade, com as calçadas de Belém. Sem acessibilidade, com ambulantes, com piso tátil que acaba dentro do buraco, com vários desníveis… É um problema da gestão do município. Nós continuamos invisíveis aos olhos do poder público no que se refere à acessibilidade”, lamenta. Jordeci alega que Belém não tem um plano municipal de acessibilidade, nem para as calçadas, nem para o sistema de transporte público como um todo.

Desafios na padronização

Conscientização é um dos desafios na padronização das calçadas
São poucos os bons exemplos que existem pela cidade, como na travessa Almirante Wandenkolk, no bairro do Umarizal, em que concessionárias determinaram um espaço de estacionamento regular para os veículos à venda, deixando de tomar o espaço destinado às calçadas. Farmácias são alguns dos estabelecimentos que começaram a adotar propostas como recuar o próprio espaço e fazer estacionamentos, sem invadir o passeio público.

"O mais difícil com relação às calçadas é conscientizar a pessoa para não ver apenas o seu interesse pessoal, mas o interesse de todos, o bem comum, porque as alterações nas calçadas costumam ser feitas para atender apenas a um cidadão". Essa colocação de Jacintho Campina, diretor do Núcleo Setorial do Código de Posturas da Secretaria Municipal de Urbanismo (Seurb), destaca muito da problemática relacionada às calçadas irregulares observadas nas vias de Belém. São de 4 a 5 notificações feitas por fiscais da Prefeitura Municipal a cada dia, e, de 2021 até agora, foram mais de mil notificações relacionadas a calçadas irregulares.

image Na Pedreira, as calçadas despadronizadas obrigam pedestres a andarem na pista. (Sidney Oliveira / O Liberal)

Jacintho disse que a gestão municipal providenciará o mapeamento das calçadas irregulares na cidade para intensificar o processo de fiscalização e ordenamento desses espaços no contexto urbano. "O problema é grande e grave, mas já foram reestruturadas cerca de 13 mil calçadas em Belém de 2005 para cá. O desafio é grande, porque, por exemplo, o Ministério Público pediu para se reestruturar uma calçada na Terra Firme; só que nós trabalhamos nessa mesma calçada em 2021, e a situação de irregularidades ocorre de novo", pontuou o diretor da Seurb.

Orientações sobre como se construir uma calçada obedecendo aos padrões delimitados são repassadas gratuitamente pela Seurb à população. "Mas, em muitos casos, as pessoas fazem as calçadas de qualquer jeito, sem importar com a circulação de um cadeirante, uma pessoa idosa, por exemplo, que são prejudicadas com a situação", acrescentou.

Fiscalização

Todos os dias, fiscais da Seurb estão em campo, averiguando denúncias relacionadas a calçadas irregulares. O efetivo de técnicos do Núcleo Setorial do Código de Posturas é de 30 pessoas. Para se solicitar orientações e para denunciar irregularidades em calçadas, pode-se ligar para 98418-3491 (Código de Posturas).

A avenida Senador Lemos ganhará calçadas no padrão normativo, que precisarão do compromisso de moradores e donos de estabelecimentos comerciais para serem mantidas sem irregularidades. No caso, uma calçada no padrão definido em lei tem de ser plana; sem degraus, obstáculos; 2,20 metros de largura, no mínimo; ter 0,08 centímetro por metro de largura de inclinação suave para as águas escorrerem para o meio-fio.

"Uma calçada não deve ser colorida, para não provocar um desequilíbrio visual e criar problemas para a circulação de pessoas; e as calçadas devem ser concordadas, mas muita gente coloca lajota, garagem para carro, escada externa, poço artesiano e fossa na área da calçada, o que é irregular", pontou Jacintho Campina. 

Tem caso de uma pessoa não se dar bem com o vizinho e, então, coloca uma mureta pequena na calçada. "A calçada é pública, sob responsabilidade da Prefeitura; não deve ser usada como se fosse de um cidadão apenas", reforçou.

Calçadas do Centro Histórico de Belém são desafio

Em ação conjunta com o Ministério Público Federal (MPF) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a Seurb iniciou o levantamento das calçadas do Centro Histórico de Belém. "O desafio nesta é que os moradores antigos, donos de imóveis, têm consciência de que se trata de patrimônio histórico, mas alguns dos moradores mais novos fazem as calçadas do jeito deles, e aí a situação se complica", salienta Jacintho Campina.

Quem constrói ou altera calçadas é passível de notificação e até de multa, com base na Lei nº 7.400, que versa sobre construções civis. O valor da multa se dá a partir de R$ 3 mil.

Estabelecimentos comerciais são responsáveis por grande parte de irregularidades em calçadas na capital paraense. A pessoa que alterou uma calçada tem de deixá-la no padrão previsto em lei em prazo variando de 30 a 60 dias, dependendo de cada caso. 

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