Para uns está bom, para outros nem tanto: os dilemas do mercado funerário no Pará
Enquanto Sindicato das Empresas Funerárias do Estado do Pará quer privatização e reclama dos planos, funerárias populares apontam crescimento e dizem que o negócio está mais vivo que nunca.
O segmento de Death Care, ou ‘Cuidados da morte’, ligado a oferta de planos e serviços funerários, é um dos que mais se consolida no Brasil nos últimos anos, seguindo exemplos vindos a partir do mercado global, onde atingiu US$ 102,6 bilhões em 2023. No País, foram faturados R$ 13 bilhões no ano passado, segundo pesquisa da Zurik Advisors, feita a pedido do Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep). Ainda assim, o mercado paraense enfrenta sérias dificuldades e divergências para acompanhar este progresso.
O setor funerário no Pará, conforme destacado por Ronaldo Borges, presidente do Sindicato das Empresas Funerárias do Estado do Pará (Sindef), está “pela hora da morte com tanta precarização”. Borges ressalta a necessidade urgente de uma privatização do serviço a exemplo do que aconteceu em São Paulo no ano passado, onde quatro empresas obtiveram a concessão do serviço por 25 anos, com a responsabilidade de suprir toda demanda e modernizar os serviços.
Descrevendo um cenário paraense onde existem muitas funerárias para poucas mortes, a competição desenfreada, principalmente com o crescimento dos planos e seguros funerários no estado, resulta na diminuição das margens de lucro, levando algumas empresas a venderem seus serviços a preços mínimos.
“Com mais de 400 funerárias registradas no estado, uma proporção que excede em muito as recomendações populacionais de uma funerária para cada 70 mil habitantes, o setor está saturado. Precisamos de uma intervenção regulatória para conter a precarização, por isso a nossa luta é para convencer as autoridades a implementarem o que foi feito em São Paulo”, explica. Para o presidente do Sindef, Belém vive situação ainda mais grave, com mais de 70 funerárias funcionando legalmente, ou seja, pela proporção mencionada por Borges, a capital paraense deveria ter em torno de 20, pois possui pouco mais de 1.300.000 habitantes.
O outro lado: o caso da Sociedade Funerária em Belém
Contrastando com a visão do Sindef, a reportagem de O Liberal visitou uma sociedade funerária localizada na movimentada avenida José Malcher, em Belém, perímetro onde concentram-se mais de 10 estabelecimentos do ramo. A empresa apresenta um quadro de otimismo e progresso. Com um plano funerário individual a partir de R$ 30 e familiar de R$ 150, a empresa conquistou cerca de 50 mil beneficiários no estado, atendendo mensalmente uma média de 90 óbitos, a maioria proveniente de seus próprios planos.
Adaílton Júnior, representante da empresa, compartilha uma perspectiva diferente sobre o mercado, enfatizando o crescimento e a demanda contínua por serviços funerários. Com a captação de recursos obtidos com as vendas dos planos, a empresa pretende construir em breve um cemitério vertical, uma iniciativa ousada que visa atender à crescente demanda da região. Júnior destaca a importância dos planos funerários como fonte de receita fixa, impulsionando a inovação e aprimoramento dos serviços oferecidos.
“A morte é a única certeza que nós temos, nosso trabalho é mostrar para as pessoas a importância de ter um plano funerário. É um assunto delicado, muitas pessoas pensam que lucramos com a morte, pelo contrário, queremos nossos beneficiários bem vivos, pois é de onde vem nossos recursos para investirmos cada vez mais. Não ter onde cair morto não é barato, fica bem mais caro do que adquirir um plano”, diz, explicando que para os que falecem sem ter plano, o serviço mais básico pode exceder os R$ 5 mil na empresa, especializada no público das classes socioeconômicas baixa e média.
Planos funerários
Depósito de sociedade funerária com cerca de 100 urnas, suficientes para um mês. (Wagner Santana)
Diante das perspectivas divergentes apresentadas por Borges e Júnior, emerge um quadro complexo do mercado funerário paraense. Enquanto o Sindef defende a regulamentação e centralização do serviço, visando mitigar os efeitos da competição desenfreada, empresas como a sociedade funerária visitada pela reportagem demonstram um crescimento vigoroso.
“Um grande gargalo são esses planos funerários. Eles tiram uma boa fatia do nosso mercado, estima-se que 30% do negócio funerário está nas mãos das seguradoras, que muitas vezes querem que façamos serviços por preços insignificantes. Isso força a barra, aumenta concorrência e vai chegando onde estamos chegando, onde empresas que não tem um grande número de planos funerários estão à beira da falência”, diz o presidente do Sindef, enfatizando que hoje qualquer empresa funerária pode oferecer um plano, muitas vezes não cumprindo o que promete.
Para Adaílton, há lugar no sol para todos e os melhores se destacam naturalmente. “Nós temos clientes em todo o estado e se Deus quiser em breve expandiremos para outros locais do Brasil. Acredito que trabalhando com honestidade e transparência no seu serviço, a empresa vai ganhando a confiança e mais clientes, o mercado vai se regulando e no final só fica quem obteve a confiança do cliente”, diz Adaílton, enquanto na sala ao lado chega mais um corpo para ser tratado com tanatopraxia. Não existe hora para a morte.
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