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Violência contra idosos na pandemia mobiliza entidades e profissionais

A campanha "Junho Violeta" pauta o tema todos os anos

Abilio Dantas

O número de denúncias de casos de violência contra a população idosa cresceu no Brasil. De acordo com dados do Disque 100, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, só no primeiro semestre deste ano, foram registradas mais de 33,6 mil denúncias de violação de direitos dos idosos. Ao longo de 2020, foram 48,5 mil casos. No ano passado, entre março e junho, logo no início da pandemia, o número de denúncias cresceu cerca de 59% em relação ao mesmo período do ano anterior. O quadro demonstra a importância de mobilização e planejamento, nas esferas institucionais e pela sociedade civil. O Dia Mundial de Combate à Violência contra a Pessoa Idosa, celebrado na última terça-feira, 15 de junho, que motiva a campanha "Junho Violeta" em todo o país, coloca em evidência as iniciativas existentes e a necessidade de mais apoio.

“É necessário ter amor ao próximo, paciência e perfil para cuidar de idosos”, afirma Maria Ruth Pena de Carvalho Lobato, diretora presidente da Associação Pia União do Pão de Santo Antônio, entidade sem fins lucrativos com 91 anos de experiência em Belém, que atende tanto idosos com familiares em condições de manter os custos dos atendimentos da instituição, quanto pessoas carentes, ainda que em menor número. “Somos uma entidade sem fins lucrativos e não temos apoio constante de nenhuma instituição pública, ainda que tenhamos recebido auxílio do governo federal, por isso não somos capazes de custear atendimento gratuito, sobretudo no nível que oferecemos, mas hoje temos quatro pessoas acolhidas que não pagam, das cerca de 50, no total”, afirma a diretora.

Com atuação ininterrupta desde 1930, o Pão de Santo Antônio pode contribuir com o conhecimento adquirido para o desenvolvimento de políticas públicas, segundo defende Maria Pena. “Penso que é importante que seja feito um intercâmbio. Antes da pandemia, nós recebíamos estudantes para estágios. Mas com a covid-19, ficamos com muito medo e redobramos os cuidados em relação ao contato com o público. O número de pessoas internas caiu bastante, tanto que a nossa capacidade é de 120 pessoas e hoje temos menos da metade. As famílias que puderam, levaram seus idosos, com receio da contaminação. Mas, felizmente, nosso índice de contágio foi zero, até o momento”, comemora.

Para a diretora, a pandemia aumentou o risco de violência contra os idosos, já que o confinamento deles com pessoas despreparadas pode terminar em maus tratos. “Acredito que é semelhante ao que temos visto sobre a violência contra a mulher. Ocorre em todas as classes. Para mim, é uma mistura de desrespeito, falta de amor ao próximo e despreparo. Recentemente um motorista de táxi relatou a mim que transportou uma idosa com sua cuidadora e que ficou espantado com o grau de violência com que a pessoa conduzia senhora. Ele denunciou o que viu, depois”, relata Maria Ruth Pena.

Atualmente, o Asilo Pão de Santo Antônio, como a entidade é conhecida, atua com 46 funcionários, entre assistente social, terapeuta ocupacional, nutricionista, fisioterapeuta, médicos, enfermeiras e cuidadores.

Queda de registros pode significar dificuldade de comunicação

No Pará, o Dia Mundial de Combate à Violência contra a Pessoa Idosa, na última terça-feira, 15, trouxe a notícia da redução em 21% dos registros de violência contra esse grupo, segundo os números dos cinco primeiros meses do ano. O levantamento realizado pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup), em 2020, no período de janeiro a maio, informa que foram registrados 6.821 casos de violência contra os idosos no estado. Em 2021, no mesmo período, foram computados 5.377 casos.

Para a presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, da Ordem dos Advogados do Brasil- seção Pará (OAB-PA), Letícia Bitar, embora pareçam positivos, os números podem ocultar dificuldades de comunicação encontradas pelos idosos, que passaram a ter que utilizar tecnologias digitais para acessar serviços públicos desde o início da pandemia. “A diminuição de registros pode significar a maior dificuldade que agora observamos que os idosos têm para acessar serviços de cidadania. Alguns órgãos só atendem agora via Whatsapp. Você já imaginou o quão difícil pode ser para uma pessoa idosa utilizar um ‘android’? O idoso, na maioria das vezes, não tem acesso a aparatos tecnológicos ou, por outro lado, prefere resolver seus problemas ‘olho a olho’. Ou, ainda, quando tem dificuldade de usar um celular, prefere não incomodar ninguém pedindo ajuda”, afirma a advogada.

Letícia Bitar acredita que todos os tipos de violências domésticas aumentaram durante a pandemia, entre as mulheres, crianças e adolescentes também, mas é preciso saber interpretar os dados para compreender a realidade do contexto atual. “Existe uma diferença grande entre número de denúncias e número de violações contra a pessoa idosa, por exemplo. Em uma só denúncia pode haver vários tipos de violência, como a violência patrimonial, a violência sexual e mesmo a violência institucional, que ocorre quando o cidadão é impedido de ter acesso a seus direitos. Nós acreditamos que essa é uma violência central que está acometendo os idosos, já que o poder público está ignorando a distância que existe entre esse público e o mundo digital”, reitera.

Entre os dias 22 e 23 de junho, a Comissão presidida pela advogada realiza o I Seminário de Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa da OAB-PA. “Vamos abordar todos os tipos de violência durante o evento. As atividades serão transmitidas pelo canal da Escola Superior de Advocacia (ESA) no You Tube”, anuncia Letícia Bitar.

Canais de denúncia

Com o intuito de debater as formas de proteção e de resguardar os direitos dos idosos, o Governo do Pará realizou entre os dias 14, 15 e 16, até ontem, a Semana de Combate à Violência Contra a Pessoa Idosa. Organizado pela Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SejuDH), o evento tratou, entre outros assuntos, sobre a rede de atenção aos idosos; dos canais de denúncia existentes e do aumento de riscos de violência durante a pandemia.

Vinculada à SejuDH, a Gerência de Proteção à Pessoa Idosa é um órgão especializado na temática. “Trabalha em prol dessa população buscando políticas públicas por meio de projetos e parcerias com entidades públicas e privadas a fim de fortalecer as políticas públicas e de proteção dos idosos. Tem ainda participação efetiva no Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Idosa (CEDPI-PA) que é o órgão de controle e fiscalização das políticas públicas voltadas à pessoa idosa”, informa a SejuDH.

Ainda em âmbito estadual, a Segup afirma que ampliou as formas de denúncia durante a pandemia, o que pode ter ocasionado a diminuição de registros de violência. “Através do número (91) 98115-9181, utilizado pela Iara - Inteligência Artificial Rápida e Anônima, é possível fazer a denúncia via WhatsApp com garantia do sigilo e anonimato do cidadão que contribuir para as investigações. Por meio do aplicativo de mensagens, qualquer pessoa pode enviar texto, áudio, fotos e vídeos, além de localização em tempo real. As informações enviadas podem ser também sobre crimes que já ocorreram para que possam ser solucionados. Ao fazer uma denúncia, a pessoa receberá um número de protocolo para acompanhar o andamento da demanda ou acrescentar informações”, explica a Secretaria,

TJPA

O Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) informa que as denúncias de casos de violência contra a população idosa podem ser encaminhadas à unidade policial especializada ou mais próxima, ao Ministério Público (PM) e à Polícia Militar (PM), além dos demais órgãos do sistema de Justiça. “Também podem ser feitas denúncias anônimas ao Disque 181, serviço de ligação gratuita de combate à criminalidade e à violência no Estado, com a garantia do sigilo”, conclui o órgão.

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