Livros impressos em braille oportunizam inclusão social

Com projeto idealizado em 2012, Associação de Deficientes Visuais do Baixo Amazonas fomenta a difusão do conhecimento

Ândria Almeida

A dificuldade de ter acesso a livros impressos em braille, sistema de leitura e escrita para deficientes visuais, torna ainda mais difícil o desenvolvimento de pessoas com baixa visão ou cegos. Pensando em oportunizar acessibilidade e inclusão social na difusão do conhecimento, a Associação de Deficientes Visuais do Baixo Amazonas (Adevibam) montou uma biblioteca com livros em braille no município de Santarém, no oeste do Pará.

A associação montou o espaço da biblioteca em 2012, quando Adevibam foi inaugurada. O local tem bastante procura do público que usa o braille como ferramenta de aprendizagem e possui um acervo de livros para todos os gostos.

Gean Aquino dos Santos é um dos associados. Ele relata que aprendeu braille há cerca de quatro anos e atualmente ministra curso de leitura e escrita em braille na associação. “Estou com uma turma de cerca de dez alunos. Esse espaço é fundamental para conhecer as pessoas e orienta-los, com foco em oportunizar acesso à ferramenta. Para muitos deles, isso é uma grande novidade”, contou.

Aventuras e resgates da infância em um mesmo lugar

O facilitador relata também que ama a leitura, e hoje, graças à biblioteca, está tendo a oportunidade de resgatar uma parte da infância que não foi vivida, pelo distanciamento dos livros infantis. “Gosto muito de leitura sobre ficção, mas hoje estou lendo os livros infantis. Na verdade, sempre tive essa vontade”, contou.

image Biblioteca tem diversos recursos de acessibilidade (Ândria Almeida / O Liberal)

Já para Mariane Pereira, os livros são como um mundo desconhecido, esperando para ser desbravado. Os dedos da jovem são rápidos e aos poucos ela vai tateando as páginas e ‘devorando’ histórias. “É maravilhoso porque através desta biblioteca a gente consegue acessar leituras atualizadas do que acontece no dia-a-dia. Esse local vai nos proporcionar muito mais conhecimento. Antes era mais difícil porque a gente não tinha uma biblioteca especializada”, comemorou.

A associação oferece ainda curso de braille para os associados, com o objetivo de levar socialização e trocas de experiências. As aulas ocorrem todas as terças-feiras.

‘Lupa eletrônica’

A Adevibam também apoia o projeto de leitura através da lupa eletrônica, instalado recentemente no Instituto Federal do Pará (IFPA) em Santarém. A Associação cede a lupa - que estava sem uso na entidade, por falta de televisão adequada para reprodução- ao Instituto. Nesta parceria, o IFPA oferece o local com toda a estrutura e o atendimento especializado para os usuários.

A revisora de texto em braille do IFPA, Juliana Bentes, conta que são recebidas pessoas com baixa visão na biblioteca da instituição para fazer uso da lupa eletrônica. A primeira pessoa a utilizar o equipamento foi Ana Clara, de 13 anos, que cursa a oitava série em uma escola pública de Santarém. Ela tem baixa visão de um lado do olho e zero no outro. O diagnóstico foi descoberto há quatro anos e apesar da pouca idade, a pequena tem grandes sonhos. Ela quer ser juíza ou oftalmologista, ambas motivada pela possibilidade de ajudar o próximo.

image Pessoas com baixa ou nenhuma visão são o público-alvo de biblioteca (Ândria Almeida / O Liberal)

“Se eu for para essa área da oftalmologia, quero ajudar as pessoas que passam pela mesma situação que eu. Mas quero falar a verdade, porque tem várias pessoas que mentem sobre a real situação da pessoa”, enfatizou. Ana é uma garota alegre e vaidosa. Ela conta que adora estudar, embora seu maior desafio seja a leitura. “Eu gosto muito de ler, mas os livros e apostilas não são muito adequados, tem letras pequenas. É um recurso que eu pretendo usar para a vida inteira. queria ler livros de histórias, romances e ficções, mas as letras são tão miúdas que eu não consigo”, conta.

Ana diz que apesar das dificuldades, ela imagina um futuro de realizações. “Acho que é preciso ter um outro tipo de olhar para as pessoas que são deficientes visuais, auditivas e outras, porque elas pensam que, o fato de termos deficiências visuais nos faz ter problemas mentais, e isso não é bem assim. Me vejo futuramente sendo uma pessoa realizada, feliz, vivendo meu trabalho, de cabeça erguida, e todo mundo me respeitando do jeito que eu sou e não como alguém com dependência”, disse emocionada.

Luciane Gomes Vieira, mãe de Ana Clara, afirma que a filha enfrenta desafios diários, mas que a força e a determinação mantém a adolescente sempre focada. “Tivemos a grata surpresa de hoje, que foi ela concretizar, com a ajuda da professora Juliana, uma leitura com os caracteres maiores, através da lupa, para ela poder melhorar nesse aprendizado. Falta muito? Falta. Falta muito respeito, empatia de parte da sociedade de entender e procurar ajudar as crianças com deficiência que necessitam de apoio e compreensão”, refletiu.

A professora Juliana Bentes explica que as pessoas com  deficiência visual interessadas em utilizar a lupa eletrônica devem procurar a biblioteca do IFPA e realizar o cadastro. Os atendimentos são feitos no horário das 9h às 19h, preferencialmente com agendamento prévio para que o uso seja assistido por ela, que é quem faz o atendimento especializado para as leituras na lupa. O equipamento reproduz as imagens que são captadas na TV de forma ampliada.

A biblioteca conta com um acervo de livros em braille de obras recentes, que vão desde livros de estudos à culinária, passando pela ficção, entre outros gêneros, além de audiolivros.

Ministério Público doa obras à entidade

O Ministério Público do Pará, por meio da 12ª Promotoria de Justiça Cível de Santarém, entregou livros escritos em braille doados pela Fundação Cultural do Estado do Pará - Espaço Braille da Biblioteca Pública Arthur Viana à biblioteca da Adevibam. Na ocasião, foram doadas 33 obras. Entre os livros entregues estão clássicos da literatura, romances, publicações técnicas, didáticas e infanto-juvenis.

“Esse trabalho diz respeito ao velamento das entidades do terceiro setor. A gente sabe que essas entidades prestam um serviço essencial, um serviço de interesse público que está sendo cada vez mais demandado na estrutura de Estado”, disse o promotor de Justiça Túlio Novaes, durante a entrega dos livros no dia 7 de outubro.

Parceiria é fundamental

A biblioteca conta com a parceria do IFPA, conforme explicou a revisora de texto de braille do IFPA, Juliana Bentes. “A Adevibam tem a demanda e alguns recursos de tecnologia assistiva, além de livros em braille. Mas eles também precisavam de um profissional que pudesse promover não só a formação das pessoas com deficiência visual para leitura, escrita, informação, mas ser multiplicador da causa”, relatou.

Juliana conta que ministra cursos e oficinas, além de capacitação na Adevibam. “Em contrapartida, eles promovem ajustes de acessibilidade no nosso campus. Estamos cumprindo o grande lema “nada por nós sem nós”. Tudo o que fazemos para as pessoas com deficiência visual, a gente gosta e quer que elas aprovem e façam os ajustes para que seja realmente útil para eles”, relatou.

A Adevibam foi fundada em 2012, no município de Santarém, e atualmente conta com cerca de 600 associados na região do Baixo e Médio Amazonas. “A Associação é uma entidade de referência e a única na região que promove essa qualidade para ensino e aprendizagem dos associados”, enfatizou a coordenadora Maria do Céu Assis da Silva.

O local necessita de narradores de histórias infantis para realizar a leitura inclusiva e de audiodescrição. Os interessados em ajudar receberão cursos preparatórios de maneira gratuita e com certificado. Para ser um voluntário basta entrar em contato com a professora Juliana pelo e-mail: juliana.bentes@ifpa.edu.br.

“Ofertamos os cursos porque os voluntários precisam ter técnicas específicas para deficiência visual, como áudio descrição, controle de velocidade e pausa”, explicou Juliana.

A população pode ajudar ainda doando livros em braille e audiolivros, ou até mesmo através de serviço como manutenção dos computadores destinados às pesquisas dos associados. A Adevibam fica localizada na Av. Curuá-Una, 842 - Santíssimo, em Santarém.

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