Bibliotecas comunitárias estimulam a leitura entre crianças e adolescentes de Belém
A iniciativa vai ao encontro do déficit de conhecimento nessa área, inclusive, ampliada com a pandemia.
Iniciativas de base comunitária têm contribuído para estimular a leitura entre crianças e jovens. Em Belém, a doação de livros e a disposição voluntária para a leitura e a realização de atividades lúdicas têm ajudado a fazer a diferença em bairros periféricos, como o caso do projeto Barca Literária, da Vila da Barca, no bairro do Telégrafo, e da Rede Gelotecas Comunitárias O Pará que Lê, que possui 36 frentes em bairros da capital e de outros municípios do estado.
Essas iniciativas ganham importância diante do desempenho do Brasil no exame Progress in International Reading Literacy Study (Pirls), que avaliou a capacidade de leitura de alunos do 4º ano do ensino fundamental (de 9 a 10 anos). O Brasil ficou na 39ª posição entre 43 países avaliados. O levantamento usou dados de 2021 e foi divulgado há um mês.
A pequena Vitória Carmo, de 10 anos, conta com entusiasmo sobre o livro que está lendo atualmente, as atividades que participa e o que vem aprendendo: “Aprendi o que é ancestralidade”. Ela é uma das 80 crianças e adolescentes atendidos pela Barca Literária, fundada pela ong Comissão Solidária Vila da Barca em uma das áreas zonas de maior pobreza da capital paraense onde residem cerca de 2 mil famílias.
Veja mais:
A biblioteca comunitária itinerante funciona em uma sede alugada de madeira, medindo cerca de 7mX2m, que fica no coração das palafitas do lugar. Em meio aos livros, a Barca Literária guarda também afeto e participação ativa da comunidade em atividades que extrapolam a pequena sede, símbolo de solidariedade e responsabilidade social.
Barca do afeto
“As pessoas foram tocadas pelo afeto e pelos livros”, descreve a assistente social Gisele Mendes, presidenta da ong. A entidade surgiu na pandemia para arrecadar e distribuir cestas básicas na Vila da Barca. “Somos uma construção coletiva. A gente ocupa essa periferia com literatura, educação, arte e cultura”.
Conheça aqui.
Entre as atividades realizadas estão grupos de leitura criativa, empréstimo de livros, atividades culturais e de reflexão crítica, oficinas de formação de liderança aos adolescentes e o acompanhamento junto às famílias.
Brenda Samily Souza, de 15 anos, é uma das adolescentes do projeto. Ela recebe bolsa simbólica de R$ 50 reais para atuar junto às crianças. “É muito bom quando a gente percebe que a criança melhorou a leitura”, descreve, com um sorriso de satisfação.
A moradora Cleia Carmo, integrante da ong, destaca a necessidade de leitura entre os moradores da Vila da Barca. “Antes da pandemia, a gente já tinha um déficit. Quando surgiu o projeto, eles se agarraram. A maioria das crianças e jovens daqui são de escolas públicas, que não souberam de que forma levar as atividades aos alunos (na pandemia). A dinâmica de aula virtual não fazia parte da dinâmica deles”.
Gelotecas
A Rede de Gelotecas Comunitárias começou há três anos com a ong Instituto Popular Eduardo Lauande (IPEL) e já conta com muitos parceiros. As gelotecas são bibliotecas comunitárias representadas por carcaças de geladeiras decoradas e transformadas em armários de livros. Hoje, o projeto possui 36 gelotecas espalhadas em escolas públicas estaduais e municipais, centros comunitários e residências de colaboradores de Belém e de outros municípios paraenses.
Conheça aqui.
As gelotecas realizam sessão de cinema sobre direitos humanos, oficinas de combate ao racismo, contação de histórias, aulas de leitura com a colaboração de professores, palestras com psicólogo e programações em datas festivas. “Quem cuida das gelotecas são os chamados guardiões. Tem escola que, se não fosse a geloteca, não teria biblioteca”, declara o historiador e dirigente do IPEL, Flávio Lauande.
“O analfabetismo é muito forte. A gente tenta lutar para alfabetizar. Tem criança de dez a 14 anos que não sabe ler, muito por causa da pandemia. Montamos uma estratégia para fazer esse atendimento”.
Como incentivar
A pedagoga Lucilene Oliveira, especializada em informática educativa, que desenvolve materiais voltados à práticas de leitura e letramento, dá dicas de como estimular a leitura entre as crianças. O exemplo de pais leitores, a disposição de livros físicos nos ambientes, contar histórias durante a rotina, apresentar os clássicos infantis e integrar a literatura a recursos como fantoches, teatro, fotografia, desenho e audiovisual são algumas das recomendações.
A leitura também pode ser estimulada de acordo com o gosto da criança. “É preciso observar o que está sendo despertado no momento. A partir do mundo imaginário é importante trazer o livro sobre o tema favorito, como animais, robôs, espaçonaves e outros. Quando a gente percebe o que ela gosta é mais fácil de efetivar o gosto pela leitura”.
“A criança lê a partir do visual. Também é interessante ter um livrinho só com as imagens em que ela vá criando a própria historinha”. Os passos seguintes são acrescentar livros específicos e deixar a criança buscar novas leituras. A relação com o uso de tablets, celular, e computadores é possível. “Quando trago as personagens das telas, a criança quer assistir o vídeo no celular. Quando trago o livro, mostro a tela para que ela possa confrontar no mundo dela”, recomenda.
As férias são uma boa oportunidade de pegar livrinhos para pais e filhos lerem juntos. Na opinião da pedagoga, as bibliotecas comunitárias têm um papel importante nesse processo. “Todo mundo gosta de uma história. Um projeto bem elaborado todo mundo quer participar”. “Após a pandemia esse público, sobretudo a educação infantil, ficou prejudicada com a leitura. Os pais deixam mais para a escola o papel desse incentivo ou eles não têm o hábito de ler. Está sendo bem difícil para que as crianças aprendam a ler”.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA