Para jurista, ‘precedente não é favorável a Alexandre de Moraes’
Ives Gandra e Lucas Sá analisam o cenário após denúncia contra ministro
A recente reportagem do jornal Folha de S.Paulo, que levanta indícios de que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), teria solicitado relatórios de "formas não oficiais" ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), abre brecha para um “precedente que não favorável a Moraes”. A avaliação é do jurista Ives Gandra Martins, que afirma que, apesar de não haver ilegalidade na conduta do ministro, o STF já julgou situação parecida.
Martins explica que, em 2021, o STF anulou o processo contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por não aceitar a conduta do juiz Sérgio Moro, da Lava Jato e atualmente senador pelo União Brasil, que mantinha conversas com membros do Ministério Público. “As decisões de Moro foram anuladas por causa do envolvimento dos procuradores. Se o STF usar a mesma lógica, como será o tratamento de Moraes?” questiona o jurista.
O precedente, segundo o jurista, é um fator que deve ser levado em conta e que, mesmo se for refutado, causará danos. “Estamos perante uma decisão em que o Supremo terá duas opções: manter o precedente ou alterá-lo. Neste segundo caso, não haverá qualquer consequência contra Moraes.” Ele acrescenta: “Não vejo como não aplicar a mesma decisão”, pontua Ives Gandra Martins.
Apesar do cenário, o jurista considera que não há anormalidade em um juiz buscar apoio de seus auxiliares, conforme revelado pela reportagem da Folha. No entanto, a situação exposta pode desgastar ainda mais a imagem de Moraes e da Corte. "Não é bom para o Alexandre o que aconteceu", afirma ele, destacando que a consistência na aplicação das regras é fundamental para a credibilidade do STF.
Nesta quarta-feira (14/08), Moraes afirmou que seria "esquizofrênico" se auto-oficiar, referindo-se ao período apontado pela Folha em que era presidente do TSE. “Como presidente, tenho poder de polícia e posso, pela lei, determinar a feitura dos relatórios”, acrescentando que hoje oficiaria a ministra Cármen Lúcia, pois ela é a atual presidente do TSE. “Como presidente, determinava a assessoria para que realizasse o relatório”.
‘Não é aceitável que uma mesma pessoa investigue e julgue’, opina advogado
O advogado paraense Lucas Sá, criminalista, mestre em Direito e professor universitário, opina que o problema não está na atuação do ministro Alexandre de Moraes no TSE, mas no fato de que sua atuação no tribunal pode ter fundamentado suas próprias decisões no STF. "A Constituição permite que um ministro integre o STF e o TSE ao mesmo tempo, mas não é aceitável que uma mesma pessoa investigue e julgue", observa Sá.
Assim como Ives Gandra, Sá compara a situação atual com o caso da Lava Jato, onde a colaboração entre o juiz e os procuradores levou à anulação das decisões. "Aqui, o ministro investigou e decidiu com base nas próprias investigações, o que pode comprometer a integridade das decisões", explica. Ele sugere que o STF deve agir com autocontenção para evitar que práticas semelhantes se espalhem para outros tribunais.
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Quanto a um possível impeachment de Moraes, Sá não vê base jurídica ou política para tal medida. "O que vejo é o uso do impeachment como uma forma de frear as decisões do ministro", afirma. Sá acredita que Moraes deveria ter escolhido entre investigar no TSE ou julgar no STF, não podendo exercer ambas as funções simultaneamente. "Não parece ser essa a orientação constitucional sobre a imparcialidade dos juízes", conclui.