Nomes de ruas em Belém continuam a homenagear apenas homens

Pesquisadora afirma que há mulheres importantes, como Maria Sylvia Nunes e Eneida de Moraes que poderiam ser nomes de ruas

Eduardo Laviano / O Liberal
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Pense rápido: você consegue citar três ruas de Belém que tenham nome de mulher? Não precisa ficar preocupado com a memória - de fato, quase todas as ruas da capital paraense homenageiam homens. Não há estudos que comprovem a disparidade, mas uma rápida caminhada pela cidade já permite uma constatação imediata. 

Recentemente, os vereadores de Belém aprovaram a mudança de nome de duas ruas de Belém. E escolheram homenagear apenas homens.

Para Natasha Vasconcelos, advogada fundadora do Política para Mulheres, o fato de grandes mulheres da história paraense não serem homenageadas como deveriam é um reflexo direto da sub-representação feminina na democracia brasileira.

"Esses estudos sobre história, linguagem e voz contam a nossa história, assim como as ruas de uma cidade. Se analisarmos quem são os sujeitos da história, quem são os heróis, quem teve oportunidade de escrever essas histórias e de ter a memória preservada, vemos que foram homens brancos. Do ponto de vista decolonial, é bom lembrar que muitos deles eram colonizadores, já que algumas ruas possuem nomes de pessoas que sequer fizeram história aqui no nosso território", avalia. 

Herança é portuguesa

Ela lembra que uma única mulher vem à cabeça quando o assunto vem à tona: Nossa Senhora de Nazaré, a padroeira dos católicos paraenses. A herança é portuguesa: no país ibérico, somente 15% das ruas tem nomes de mulheres. Destas, 9 em cada 10 são de santas ou de membros da monarquia europeia. Vasconcelos enxerga, ainda, um traço de machismo no fato dela ser uma das poucas vias da cidade com nome de mulher.

"Há um estigma. Grande parte das mulheres, historicamente, foram empurradas para o espaço doméstico. Já os homens tem títulos, como comandante, coronel, são autoridades, com poderio. Maria reflete isso. A ideia da Nossa Senhora, uma mulher inalcançável, a ideia de santíssima, virginal, a mãe. Como se só esse tipo de mulher tivesse valor na nossa sociedade. A outra opção é ser da aristocracia. Se pegarmos os dados de Portugal e São Paulo, o percentual da representação desse número de mulheres bate com a sub-representação política, que oscila entre 12% e 15%. O espaço da política é onde construímos nossa história também e reflete esse monopólio masculino. Na democracia, quanto mais pluralidade tivermos, melhor contaremos a história", afirma. 

A psicóloga Camila Malcher realizou um mestrado sobre casamento infantil no Pará e, desde então, não parou mais de estudar sobre gênero. Desde que começou a trabalhar na Secretaria Municipal de Educação, ela notou que diversas mulheres dão nome a escolas na cidade de Belém - a maioria delas desconhecidas. Malcher mergulhou na histórias dessas cinquenta mulheres, levantou dados, informações e imagens e pretende reuni-las em uma material educativo. 

Misoginia 

"A misoginia se apresenta de várias formas, inclusive no apagamento das mulheres. Quando percebi que alguns servidores conviveram com mulheres que nomeiam escolas, achei fantástico. 50 unidades educacionais em Belém levam nome de mulheres, sendo que a nossa educação é prioritariamente feminina. De seis mil servidores acho que quatro mil são mulheres. Elas foram homenageadas por terem histórias incríveis. Se não conhecem ela e não falam sobre elas, elas não existem. Me pergunto como as pessoas não conhecem a Alana Barboza, que fez tanto pela educação das populações ribeirinhas. É muito triste", entende.

Segundo Malcher, não faltam opções de mulheres importantes que poderiam para se tornarem nome de rua na cidade. Ela enumera algumas: "Yolanda Martins e Silva, Cleonice Vieira, Dorothy Stang, Maria Sylvia Nunes, Carolina de Jesus, Eneida de Moraes".

Projeto

Na opinião do presidente da Câmara de Vereadores de Belém, Zeca Pirão (MDB), o ideal seria que não houvesse diferença entre homens e mulheres. Ele lembrou, inclusive, que um projeto aprovado na casa já busca amenizar a ausência de mulheres homenageadas na capital paraense.

"Acho que fica a cargo de cada vereador decidir quem deve homenagear, claro. Sugeri recentemente o nome do Zeno [Veloso] por ser um dos juristas mais respeitados do mundo e do ex-prefeito Augusto Rezende por conta da importância histórica. Temos um projeto do vereador Emerson Sampaio (PP) que prevê que a cada duas ruas com nomes masculinos, tenhamos uma com nome feminino. Não tenho nada contra, acho importante", afirma. 

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