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Jurista critica leque para impeachment de ministros do STF: 'Não se deve legislar com o fígado'

Ophir Cavalcante Jr. avalia que a mudança fere a independência do Judiciário

Amanda Engelke

O jurista Ophir Cavalcante Júnior avalia com preocupação e critica a recente aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, de uma proposta que amplia as hipóteses para o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Para ele, a mudança “fere a autonomia e independência do Poder Judiciário”. 

“Nunca é bom legislar com o fígado, ou para atender um descontentamento momentâneo. Amanhã quem quer diminuir a independência e autonomia do Poder Judiciário pode dele precisar e aí vai sentir os efeitos de que é um Judiciário medroso, sem autonomia. É só quando pisam no nosso calo que compreendemos que o pisão que demos no calo do vizinho pode ter sido dolorido”, acrescenta Ophir.

A proposta aprovada na última quarta-feira (9), por 36 votos a 14, altera a Lei 1.079/50, e trata como crime de responsabilidade, por exemplo, se “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais ou sobre as atividades dos outros poderes da República”.

Além disso, o texto estabelece que, caso uma denúncia de crime de responsabilidade seja rejeitada, poderá ser interposto recurso ao Plenário do Senado, desde que oferecido por, no mínimo, um terço de seus membros. Se o recurso não for apreciado em 30 dias, as demais deliberações legislativas ficarão suspensas, exceto aquelas com prazo constitucional determinado.

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Judicialização da política

O texto é de autoria do deputado Gilson Marques (Novo-SC), que aponta que os crimes de responsabilidade dos ministros do STF que não são revisados há mais de 20 anos. Além disso, ele cita o aumento do ativismo judicial e a invasão de competências dos outros poderes, afirmando que “a usurpação de competências e a judicialização da política tornaram-se práticas cotidianas”.

Ophir Cavalcante Jr. avalia que a judicialização da política acontece quando o Judiciário é chamado a intervir em questões legislativas, especialmente em casos em que minorias parlamentares se sentem prejudicadas pelas decisões da maioria. Ele argumenta que, nessas situações, “a Justiça é acionada para garantir que a Constituição seja respeitada”, o que, segundo ele, não configura ativismo judicial.

Ativismo judicial

O jurista reconhece situações de ativismo judicial, e diz que elas decorrem de uma interpretação mais ampla da Constituição, que muitas vezes leva o STF a criar soluções que o Legislativo não debateu. Ele atribui parte dessa responsabilidade ao próprio Legislativo, que, por questões políticas, deixa de legislar sobre certos temas, como no caso do aborto de fetos anencéfalos, forçando o STF a intervir e "legislar" temporariamente.

Ophir também critica o STF, que, segundo ele, “às vezes avança a linha que deveria pautar as suas decisões para criar situações e direitos novos”. Ele cita como exemplo o piso nacional da enfermagem, que criou uma espécie de “regionalização dos valores” que não foi concebida pela lei. “Penso que cada um dos envolvidos deve ter o bom senso da extensão de suas decisões, deixando de lado as vaidades e cada qual fazendo a sua parte”, opina.

Decisões monocráticas

Além da ampliação das hipóteses de impeachment, a CCJ aprovou, na quinta-feira (10), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/21, que limita as decisões monocráticas dos ministros do STF. Atualmente, um único ministro pode suspender a eficácia de leis ou atos do Executivo e Legislativo, mas a PEC restringe essas decisões a casos de urgência e durante o recesso do Judiciário, com prazo de 30 dias para julgamento pelo colegiado.

Neste caso, Ophir Cavalcante considera a proposta “uma correção necessária”. Para ele, o retorno ao colegiado equilibra o poder e fortalece o controle judicial sobre as leis. “De uns tempos para cá as decisões monocráticas, no STF e em outros Tribunais, deixaram de ser exceções, tornando-se corriqueiras, o que retirou a força da colegialidade dos Tribunais”, avalia.

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