Alvos da Lava Jato são beneficiados após STF anular provas da Odebrecht
Dias Toffoli assumiu procedimentos herdados de Lewandowski e tem se posicionado de acordo com os pedidos da defesa do presidente Lula
Após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter anulado as principais provas apresentadas na leniência da Odebrecht, os casos restantes dos diversos braços da Lava Jato espalhados pelo país têm implodido e alguns alvos estão sendo beneficiados. Em diversas ações, a imprestabilidade de provas é um primeiro passo da Justiça para a anulação total do processo.
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As provas usadas nas ações são derivadas dos sistemas Drousys e MyWebDay da Odebrecht, respectivamente de comunicação interna e de contabilidade e controle de pagamentos de vantagens indevidas. O ministro Ricardo Lewandowski interrompeu, a pedido da defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), investigações contra o petista, sob o argumento de que a higidez das provas oriundas desses sistemas estava corrompida, sobretudo porque os arquivos foram transportados de forma inadequada. Na época, a defesa de Lula era comandada por Cristiano Zanin, que se tornará ministro do Supremo.
Procuradores disseram em mensagens trocadas sobre o tema, que foram acessadas por hackers e mais tarde obtidas na Operação Spoofing, que os arquivos foram manuseados em sacolas de supermercado, sem cuidados com a sua preservação. Foi justamente sob esse argumento que Lewandowski também trancou ações contra o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e contra o ex-presidente da Federação de Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf.
Já em março deste ano, o ministro agora aposentado suspendeu processos contra o ex-ministro Edison Lobão, contra o almirante Othon Pinheiro, ex-presidente da Eletronuclear, e contra o advogado Rodrigo Tacla Duran. Até então, já havia ao menos 60 pedidos de extensão da decisão concedida a Lula para outros mencionados na delação da Odebrecht.
Dias Toffoli
Como Lewandowski se aposentou em abril, os procedimentos foram herdados por Dias Toffoli, que também tem se posicionado de acordo com os pedidos da defesa. Responsável pelos processos, o ministro tem declarado as provas oriundas dos sistemas "imprestáveis” em diversas ações e impedido que elas possam ser usadas.
Por exemplo, em processo do ex-diretor da estatal paulista de rodovias Dersa, Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto, o ministro já fez isso. Souza foi o principal alvo da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, que apresentou cinco denúncias contra o ex-diretor de março de 2018 a setembro de 2020. O Ministério Público Federal (MPF) entende que ele praticou os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro em obras de São Paulo, durante a gestão de José Serra (PSDB). Sua defesa nega que ele tenha cometido irregularidades.
Também foi declarada a imprestabilidade das provas em um processo que envolve o ex-ministro Paulo Bernardo e em um relacionado ao ex-deputado Lúcio Vieira Lima (MDB-BA), irmão do ex-ministro Geddel Vieira Lima, que Geddel ficou marcado pela operação que encontrou R$ 51 milhões em um bunker em Salvador.
Para o ministro, a nulidade das provas já foi ratificada em decisão da Segunda Turma do STF transitada em julgado, ou seja, sem possibilidade de recurso, "em face da comprovada contaminação do material probatório arrecadado pela 13ª Vara Federal de Curitiba". "Nesse sentido, é possível verificar, conforme salientou o ora requerente, que os mencionados elementos de prova foram citados em diversas oportunidades", acrescentou.
Ainda foram beneficiados por decisões similares o deputado federal Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e hoje deputado federal, e Anthony Garotinho (União Brasil), ex-governador do Rio de Janeiro.
No fim de junho, Toffoli declarou imprestáveis as provas colhidas a partir dos sistemas na ação penal que tramita na 13ª Vara Federal de Curitiba e envolve Mário Ildeu de Miranda, ex-executivo da Petrobras, que foi denunciado pelo MPF após uma operação que apurava suposta lavagem de dinheiro, por meio da offshore Tech Trade Corporation, que teria o ex-funcionário da petroleira como beneficiado.
Ele foi condenado pela 13ª Vara e, posteriormente, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), colegiado responsável pela Lava Jato. O ministro utilizou como fundamentação argumentos apresentados pelo agora aposentado Lewandowski em outros casos parecidos.
Entenda o crime
Drousys e MyWebDay eram os dois sistemas usados pela Odebrecht para operar propina, e neles foram identificados pagamentos relativos a mais de cem obras públicas em mais de dez países, além do Brasil. Os repasses estão registrados em 1,9 milhão de arquivos com um total de 54 terabytes. Os nove anos de funcionamento do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht contaram com sistemas de controle financeiro e de comunicação secretos, quatro níveis de contas e até uma estratégia para evitar bebedeiras de carregadores de dinheiro.
A divisão da empresa era especializada no pagamento de propinas, repasses de caixa dois e remuneração camuflada de seus executivos, e foi criada em 2006 para organizar o crescente fluxo de dinheiro sujo na companhia. Em nota enviada ao jornal Folha de São Paulo, a Novonor (antiga Odebrecht) disse que a empresa "não é parte nos processos em questão, sobre os quais não interfere ou tem qualquer tipo de participação". "Entende que cumpriu e segue cumprindo seu papel, colaborando com as autoridades", diz a nota.