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Ninhos azuis? Estudo de pesquisadora do Pará descobre plástico em ninhos de aves amazônicas

A presença desses resíduos representa a interação entre aves e a poluição plástica na costa amazônica

Lucas Quirino

No último dia 3 de julho, um estudo publicado na revista científica Science Direct apontou a presença de plástico em ninhos de pássaros na região costeira amazônica, nos municípios de Salinópolis e Maracanã, nordeste paraense. O que representa o resultado da interação entre aves e poluição plástica na natureza. Por conta disso, esses ninhos apresentavam uma coloração azul, por conta desses resíduos plásticos. Essa é uma pesquisa de mestrado em Oceanografia da Universidade Federal do Pará (UFPA), feita por Adrielle Lopes, que explicou em entrevista ao Grupo Liberal, que a ideia de estudar o assunto surgiu após encontrar ninhos contaminados por plástico no final de 2021, em Salinópolis.

“Os resultados da pesquisa revelaram uma descoberta preocupante sobre a interação entre aves e poluição plástica na costa amazônica. Verificamos que 67% dos ninhos de Psarocolius decumanus, também conhecidos como Japu ou Japu-preto [espécie de pássaros], continham plástico, com todos os ninhos do manguezal contendo plástico e percentuais variados em outras áreas, como clareira (35,3%) e vila de pescadores (90%)”, relatou a pesquisadora.

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Quais os riscos da presença de plástico em ninhos?

De acordo com a pesquisadora, esses pigmentos plásticos são compostos por 97,5% de polietileno. São materiais que continham 83,5% ftalocianina e 6 corantes. Os aditivos detectados são utilizados em aplicações industriais e todos eles são corantes para plásticos, nylon, algodão e outros  materiais. Cinco desses aditivos são conhecidos por serem tóxicos para a biota [conjunto de todos seres vivos de um determinado ambiente], pelo menos em um nível de toxicidade baixo.

A pesquisadora alerta que as preocupações com a exposição das aves e seus filhotes aos contaminantes presentes nos plásticos são graves, afetando-as por meio da ingestão involuntária ou exposição dérmica, especialmente durante a incubação e alimentação dos filhotes. 

“Esses aditivos têm potencial para penetrar na casca dos ovos, o que pode acarretar diversos problemas, incluindo comprometimento da saúde reprodutiva, distúrbios hormonais, efeito carcinogênico, impactos no sistema imunológico e redução da taxa de sobrevivência das crias. Os contaminantes presentes nos plásticos podem bioacumular-se ao longo da cadeia alimentar, afetando outras espécies que dependem do mesmo ambiente”, destaca. 

Tais pigmentos podem persistir no ambiente por períodos prolongados, sendo tóxicos para organismos aquáticos e terrestres, dependendo de sua composição química específica. Alguns pigmentos orgânicos podem ter propriedades carcinogênicas [qualquer agente químico, físico ou biológico que possa causar câncer] ou serem disruptores endócrinos [substâncias causam alterações na função fisiológica das hormonas endógenas], afetando negativamente a saúde e a reprodução de animais expostos.

A poluição plástica representa uma ameaça direta a essa biodiversidade, afetando desde pequenos organismos até predadores de topo da cadeia alimentar, com potencial para bioacumular toxinas e perturbar os processos ecológicos. “Além disso, há preocupações com a saúde pública, dado que comunidades indígenas e ribeirinhas dependem dos recursos naturais da Amazônia para sua subsistência”, alerta Adrielle.

Importância dessa descoberta e próximos passos

A pesquisadora afirma ser fundamental entender e mitigar os impactos da poluição plástica na vida selvagem da Amazônia devido à sua importância global como um dos maiores biomas mundiais. “A preservação desses ecossistemas não apenas sustenta uma vasta gama de espécies únicas, muitas das quais são endêmicas e vulneráveis, mas também é crucial para manter os serviços ecossistêmicos vitais que beneficiam não apenas as comunidades locais, mas também o planeta como um todo”, alega.

Com isso, para reduzir esse cenário, a pesquisadora sugere algumas medidas: educação ambiental para todos, incluindo as comunidades locais e pescadores; melhor gestão de resíduos plásticos; restrições ao uso de plásticos descartáveis; monitoramento contínuo da presença de plásticos nos ninhos; campanhas de limpeza periódicas; e incentivos à pesca sustentável para reduzir equipamentos plásticos abandonados.

Adrielle Lopes conclui que os próximos passos da pesquisa nesse campo provavelmente incluirão avaliações de longo prazo para monitorar o impacto da presença de plásticos e pigmentos orgânicos na população dessa ave e do ambiente adjacente.

“Possivelmente serão feitas investigações mais detalhadas sobre os efeitos dos  contaminantes encontrados nos ninhos das aves, com estudos para entender melhor como esses contaminantes afetam a saúde reprodutiva das aves e desenvolvimento das crias. Minhas expectativas são que futuras pesquisas possam fornecer outras descobertas sobre como as aves são afetadas pela poluição plástica na Amazônia”, finaliza.

Lucas Quirino (Estagiário sob supervisão de João Thiago Dias, coordenador do núcleo de Atualidade)

Pará