Pesquisa da UFPA encontra plástico dentro de peixes
O levantamento também chama atenção para a necessidade de manejo adequado dos resíduos sólidos e o cuidado com a poluição por plásticos de rios e mares
O levantamento também chama atenção para a necessidade de manejo adequado dos resíduos sólidos e o cuidado com a poluição por plásticos de rios e mares
Encontrar plástico dentro de um peixe e ser contaminado pelas toxinas (polímero) ao consumir o pescado. Pode parecer uma hipótese absurda, mas um estudo da Universidade Federal do Pará (UFPA) revelou ser algo possível de ocorrer. A pesquisa realizada pelo Programa de Pós Graduação em Ecologia Aquática e Pesca (PPGEAP), do Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia (NEAP/UFPA), aponta que a maioria das espécies de peixes comercializados no Pará carregam plástico em seu organismo, dentre elas a Pescada Amarela, Pratiqueira e Pescada Gó.
O levantamento também chama atenção para a necessidade de manejo adequado dos resíduos sólidos domésticos e o cuidado com a poluição por plásticos de rios e mares. Da Europa, outro alerta: estudo divulgado nesta semana mostra que, pela primeira vez, plástico está sendo encontrado no sangue humano.
Cientistas da Holanda reuniram amostras de sangue de pessoas saudáveis para investigar a existência de microplástico, vestígios de plástico que chegam a medir 0,00002 polegadas, no organismo humano e o resultado da pesquisa foi surpreendente.
Das 22 amostras coletadas, 17 possuíam microplástico no sangue, número equivalente a 77,2% do total de participantes. Está é a primeira vez que partículas de plástico são identificadas no sangue humano. Em pesquisas anteriores, o material já havia sido encontrado no cérebro, intestino, placenta de bebês ainda não nascidos e fezes de adultos e crianças.
O estudo foi publicado na revista Environment Inernatonal e estou cinco tipos de plástico: polimetilmetacrilato (PMMA), polipropileno (PP), poliestireno (PS), polietileno (PE) e polietileno tereftalato (PET).
Dentre as partículas de plástico encontradas, os pesquisadores holandeses descobriram que 50% das amostras continham tereftalato de polietileno, mais conhecido como "PET", material bastante utilizado pela indústria para embalagem de alimentos e bebidas; 36% eram de poliestireno, material usado em embalagens e armazenamento, e 23% continham polietileno, matéria-primadas das sacolas plásticas. Apenas 5% tinha polimetilmetacrilato e nenhuma amostra de sangue tinha polipropileno.
Já no Pará, pesquisadores do NEAP/UFPA descobriram que a maioria das espécies de peixes comercializadas no Estado podem conter partículas de plástico no organismo. Durante o estudo, foram coletados mais de 700 peixes, proveniente da maior faixa continua de manguezais do Brasil, uma área de 379 hectares que vai do litoral nordeste do Pará até o Maranhão, e analisado o conteúdo encontrado no estômago dos pescados.
A pesquisadora e mestra em Ecologia Aquática e Pesca, Gleyce Aquino, explica que o objetivo da pesquisa é verificar se os humanos estão ingerindo plástico a partir do consumo de peixes contaminados.
Segundo Aquino, todas as espécies coletadas possuíam plástico no estômago, independente de período e local da coleta. "Verificamos que a maioria desses plásticos eram de cores azuis e transparentes. Estamos tentando identificar esses plásticos através de uma parceria com a Universidade de Firenze, na Itália, para poder fazer essa verificação de qual é o polímero presente nele", pontuou.
O estudo também apontou que espécies com grande apelo comercial, como a pescada amarela, pratiqueira e pescada gó, foram as que mais ingeriram polímeros plásticos. A contaminação do pescado estaria ligada a fonte, ou seja, a pescaria e o descarte irregular de materiais de pesca, e a poluição presente nos rios e mares.
Os peixes, ao engolirem o polímero plástico, acabam sofrendo um bloqueio no trato gastrointestinal e o atrito das partículas plásticas no estômago acaba gerando um estresse hepático nos animais, que muitas vezes acabam morrendo em decorrência da ingestão do material.
Durante a análise do material coletado, os pesquisadores descobriram que o plástico é transferido através de níveis de cadeia trófica, que consiste em: o camarão ingere o plástico, o peixei come o camarão, que por sua vez é consumido pelo ser humano.
Se o ser humano ingerir um peixe contaminado ele também pode desenvolver problemas cardíacos, hormonais e endócrinos, doenças que podem ser causadas a partir das toxinas existentes no plástico.
"São essas toxinas que acabam entrando na corrente sanguínea do ser humano e acaba causando todos esses problemas", explicou Gleyce Aquino.
Para evitar a contaminação dos peixes e dos seres humanos, a pesquisa traz um alerta importante: é necessário repensar o consumo de plásticos e o descarte desordenado dos resíduos sólidos. Marcelo Andrade, professor do NEAP/UFPA, relembra que o plástico é um material que permanece no meio ambiente por décadas até se deteriorar.
"Os plásticos foram criados a cerca de 120 anos atrás. Então imagina, se um plástico leva 500 anos para se degradar, ainda hoje ele existe no ambiente, por isso é tão importante pensar na forma adequada de gerir nossos resíduos, essa é a principal mensagem que a gente traz, mostrando como o que os peixes consomem consequentemente prejudica a nós mesmos", ressalta o orientador da pesquisa.
De acordo com Andrade, a Amazônia é a região que mais consome peixe por pessoa no mundo, a frente até mesmo do mercado asiático. Nesse contexto, uma saída para reduzir a quantidade de plásticos lançados na natureza seria a reutilização de materiais no dia a dia.
"O consumo consciente é o mais importante. A pessoa pode adotar as sacolas retornáveis que já são adotadas em muitos supermercados, ou então a separação os resíduos recicláveis em casa e dar a destinação correta ao lixo", aconselhou.
A dona de casa Osmarina Damasceno, de 69 anos, é consumidora assídua de peixe e costuma visitar o Mercado de Peixe do Ver-o-Peso pelo menos uma vez por semana em busca de pescados, camarões e caranguejo. Ela vê com bastante preocupação a quantidade de resíduos sólidos que é lançada todos os dias pelas ruas de Belém.
"As pessoas jogam lixo na rua, esse lixo entope os bueiros, por isso que as ruas alagam quando chove, acaba poluindo os rios, a nossa água, matam os animais. Eu acho que isso precisa ser tomado uma providência a respeito do descarte do lixo", avaliou.
Osmarina relembra ter visto recentemente a imagem de uma tartaruga que foi encontrada engasgada com um pedaço de sacola plástica. "Assim como aconteceu com ela pode acontecer com os peixes também e com outros mariscos, o que com certeza prejudica a nossa saúde".
Como os peixes já chegam ao mercado sem o estômago, os peixeiros não costumam encontrar partículas de plástico na hora de limpar o produto. Contudo, o peixeiro Edson Mesquita, deixa algumas orientações para manter a qualidade do pescado.
"O consumidor tem que mandar logo filetar para então armazenar, se for pra fazer o cozido do pescado ele tem que mandar cortar em postas, lavar, guardar em saco transparente e armazenar. Se ele for armazenar o peixe inteiro não vai ficar com uma refrigeração boa pra o pescado ficar de qualidade. Na hora da compra, o cliente tem que ficar atento, se o pescado estiver com a barriga preta e a guelra não estiver vermelha ele pode descartar que vai estar com baixa qualidade", disse Edson.