Em um ano denúncias de racismo aumentaram 15% no Pará
Casos cresceram de 487 para 563 em 2024; especialistas destacam a importância da denúncia e do combate à discriminação

O Estado do Pará registrou um aumento significativo nos casos de racismo entre 2023 e 2024. De acordo com a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup), foram contabilizados 563 casos de racismo de janeiro a dezembro de 2024, enquanto no mesmo período de 2023 ocorreram 487 casos, representando um aumento de 15,6%. Além disso, nos primeiros meses de 2025, de 1º de janeiro a 19 de março, já foram registrados 120 casos desse crime no Estado. Esses dados ganham relevância especial nesta semana, em que se celebra o Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial, em 21 de março.
O Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial foi instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) em memória ao massacre de Sharpeville, ocorrido em 21 de março de 1960, na África do Sul. Naquela data, 20 mil negros protestavam pacificamente contra a “Lei do Passe”, que limitava os locais onde eles podiam circular. A manifestação foi reprimida violentamente pelas tropas do exército sul-africano, resultando em 69 mortos e 186 feridos.
Para compreender melhor o cenário atual e as formas de identificar o racismo no cotidiano, conversamos com Renata Neves, presidente da Comissão de Direito e Defesa da Liberdade Religiosa da OAB Pará. Ela destaca que o racismo pode se manifestar de diversas formas, desde insultos e violência a desigualdade no acesso a oportunidades. “É mais comum em insultos, violência, desigualdade e acesso a oportunidades. Mas a gente tem que ver alguns que estão no nosso dia a dia, mas que a população infelizmente não identifica com tanta facilidade, como, por exemplo, uma discriminação contra o cabelo crespo, o cabelo afro, a intolerância religiosa de religiões de matriz africana”, explica.
Renata também ressalta que manifestações sutis de racismo podem passar despercebidas, como negar a entrada de pessoas negras sem motivo aparente ou confundi-las com funcionários em determinados ambientes, presumindo uma posição inferior devido à cor da pele. Expressões como “mulato”, “dia de branco” e “coisa de preto” também são exemplos de racismo presentes no cotidiano. Além disso, a desigualdade no acesso à educação, saúde e oportunidades econômicas reflete a discriminação racial estrutural existente na sociedade.
A legislação brasileira possui instrumentos importantes no combate ao racismo. A Lei nº 7.716/1989 define os crimes resultantes de preconceito de raça ou cor, estabelecendo penas e multas para tais delitos. O Estatuto da Igualdade Racial, instituído pela Lei nº 12.288/2010, estabelece diretrizes para o enfrentamento à discriminação étnico-racial. Mais recentemente, a Lei nº 14.532/2023 equiparou a injúria racial ao crime de racismo, tornando-o inafiançável e imprescritível.
Renata Neves enfatiza a importância de fortalecer a legislação e promover uma educação antirracista para combater o racismo. Ela destaca a Lei nº 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas, mas que ainda enfrenta desafios em sua implementação, especialmente em áreas mais afastadas. “Acredito que fomentar uma educação antirracista, ter igualdade de oportunidades entre todas as pessoas, garantir leis de combate ao racismo e que elas sejam de fato aplicadas” são pontos essenciais para avançar nas políticas públicas de combate à discriminação racial, afirma.
Para denunciar casos de racismo no Pará, as vítimas podem procurar a Delegacia de Polícia Civil mais próxima. Na Região Metropolitana de Belém, há a Delegacia Especializada em Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos (DCCDH), que oferece atendimento especializado. Além disso, o Disque 100 é um canal nacional disponível para denúncias de violações de direitos humanos, incluindo casos de racismo e injúria racial. É fundamental que as vítimas registrem boletins de ocorrência para que as autoridades possam mapear e enfrentar efetivamente a discriminação racial.
Segundo Renata, a pena para o crime de racismo é de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa. O crime é inafiançável e imprescritível, o que significa que pode ser punido a qualquer tempo e não permite o pagamento de fiança para responder em liberdade. A injúria racial, que consiste em ofender a honra de alguém utilizando elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem, também é punida com reclusão de 2 a 5 anos e multa, equiparando-se ao crime de racismo após a Lei nº 14.532/2023. Há agravantes se o crime for cometido por um grupo, por um agente público, por meio de redes sociais ou em locais de atividade artística, cultural ou esportiva. Além da esfera penal, a vítima pode buscar indenização por danos morais na esfera cível.
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