Dia Internacional da Visibilidade de Pessoas Trans: cenário de violência acende alerta
Levantamento aponta 151 assassinatos de pessoas transexuais por ano e 13 casos por mês
Neste 31 de março é celebrado o Dia Internacional da Visibilidade de Pessoas Trans e Travestis. A data, relevante por evidenciar as causas do movimento transexual, também expõe um lado obscuro vivido diariamente pelos corpos trans: a alta taxa de violência e assassinatos. Apesar de a transfobia ser crime no Brasil desde 2019, o país é ainda o que mais mata transexuais. Quando se trata do Pará, esse dado é ainda mais alarmante, pois o estado está entre os dez que mais assassinaram pessoas trans entre 2017 e 2023, segundo a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais).
Em todo o mundo, pessoas trans são alvos de violência de ódio, que inclui humilhação, agressão física, agressão sexual e assassinato. As transexuais femininas são as mais atingidas por esse crime. Apesar dos avanços e conquistas significativos para as mulheres nos últimos anos, ainda ocorre a falta de medidas e políticas para travestis e mulheres trans, especialmente em um país com altos índices de violência e violações dos direitos humanos. Conforme o Antra, as ações governamentais têm sido inexistentes na proteção e garantia de direitos para essa comunidade.
Dados sobre assassinatos
Segundo o levantamento realizado pela Antra sobre mortes do público LGBTQIA +, entre os anos de 2017 e 2023, foi mapeado um total de 1057 assassinatos de pessoas trans, travestis e pessoas não binárias brasileiras. Sendo 145 assassinatos em 2023; 131 casos em 2022; 140 registros em 2021; 175 casos em 2020; 124 casos em 2019; 163 casos em 2018; e 179 casos em 2017 (o ano com o maior número de assassinatos de pessoas trans). No total, isso representa uma média de 151 assassinatos por ano e 13 casos por mês.
Ao comparar os anos de 2022 e 2023, foi percebido aumento de 10,7% no número de assassinatos contra pessoas trans, passando de 131 em 2022 para 145 em 2023. Neste mesmo período, o Brasil observou queda de 5,7% por 100 pessoas nos assassinatos gerais da população. O estudo mostra que a maior concentração dos assassinatos no ano passado foi observada na Região Sudeste, com 52 assassinatos (37% dos casos); em seguida, está a Região Nordeste com 50 casos (36%) casos; o Sul com 14 (10%) assassinatos; o Norte, com 13 (9%) casos; e a região Centro-Oeste com 10 (7%) assassinatos.
O Pará ocupa a 8º posição, com 41 assassinatos, entre os dez estados que mais mataram pessoas trans entre 2017 e 2023. A lista também é composta pelo estado de São Paulo, que está em primeiro lugar com 135 casos; em segundo está o Ceará com 96 casos; Bahia em terceiro com 89 assassinatos; Rio de Janeiro com 83 está na quarta posição e Minas Gerais com 80 em quinto; Pernambuco em sexto com 68 casos; Paraná com 54 em sétimo; em nono o Amazonas e Paraíba com 38 mortes; e Goiás com 36 em décimo.
Desafios a serem superados
A ausência de medidas para combater crimes contra pessoas trans é destacada por pessoas transexuais, que se sentem invisíveis para as políticas públicas de segurança, saúde, trabalho, educação, mas visíveis para a violência manifestada na sociedade que mais mata transexuais no mundo. A estudante Regina Alice Franco, representante do Movimento Trans na Universidade Federal do Pará (UFPA), cita o medo da violência.
“Esse medo acontece com toda a pessoa trans, toda pessoa travesti. Eu, que sou uma travesti preta, desde quando saio na rua ou pego ônibus, convivo com esse medo constantemente. Todas nós conhecemos alguma travesti que já sofreu algum tipo de violência e convivemos com isso diariamente”, afirma.
De acordo com Regina Alice, a questão da violência vai além das agressões físicas. Cotidianamente, as trans são expulsas de banheiros, não têm o nome social e pronomes de tratamento respeitados, são estereotipadas, tratadas como pessoas diferentes.
“Muitos espaços, como a própria universidade, não foram pensados para que os nossos corpos, que fogem de um padrão heteronormativo, caibam nele. As violências são múltiplas e não vêm necessariamente do que consideramos violência física. Eu já fui xingada e vivenciei esse tipo de situação. Por isso, é preciso pensar em políticas públicas e medidas voltadas ao nosso público para a entrada nas universidades e também a empregabilidade, acesso à renda e outros programas oferecidos pelas instituições governamentais”, declara.
‘Perfil’ das vítimas
A ampla pesquisa feita pela Antra mostra que, no ano passado, nove homens trans e pessoas transmasculinas foram assassinadas, o segundo maior marcador da pesquisa. Um alarmante aumento quando comparado com os anos anteriores. Entre os anos de 2017 e 2023, foram identificados um total de 32 casos de assassinatos de homens trans e pessoas transmasculinas, que representam 3% da amostra total. Enquanto travestis e mulheres trans somam 1.025 casos, ou seja, 97% da soma.
Por meio dos dados, a pesquisa aponta que uma pessoa transfeminina (travesti ou mulher trans) tem até 32 vezes mais chances de ser assassinada, sobretudo no espaço público, que uma pessoa transmasculina ou não binária. Concluindo, assim, que a identidade de gênero e os estigmas em torno das travestilidades representam fatores de alto risco.
No entanto, também há um perfil elaborado com as demais características coletadas a respeito das vítimas de assassinato. Tais elementos são considerados de risco e responsáveis pelo processo de precarização e vulnerabilização das pessoas trans. São eles: idade; classe e contexto social; raça; e gênero. Já entre os elementos mais comuns nos casos levantados pela pesquisa, que analisou o perfil das vítimas, os dados que se assemelham são:
- A maioria das vítimas é jovem, entre 13 e 29 anos;
- 79% das vítimas tinham menos de 35 anos;
- A maioria é negra, empobrecida e reivindica ou expressa publicamente o gênero feminino;
- Houve uma pequena mudança no perfil racial com o aumento no número de assassinato de pessoas trans brancas;
- Homens trans e pessoas transmasculinas são minorias em crimes de assassinatos/homicídios violentos;
- Travestis e mulheres trans têm até 32 vezes mais chances de serem assassinadas que homens trans, pessoas transmasculinas e pessoas não binárias.
Como denunciar?
Em Belém, os casos de LGBTIfobia devem ser registrados e denunciados às autoridades públicas por meio do Disque-Denúncia 181 ou pelo WhatsApp (91) 98115-9181.
A Delegacia Virtual da Polícia Civil também recebe ocorrências específicas sobre o tema pelo site www.delegaciavirtual.pa.gov.br. A vítima pode, ainda, se dirigir à Delegacia de Combate aos Crimes Discriminatórios e Homofóbicos (DCCDH), no prédio da Divisão de Investigações e Operações Especiais (DIOE), na rua Avertano Rocha, 417, entre Travessas São Pedro e Padre Eutíquio, no bairro da Campina, em Belém.
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