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Último dia: um país pronto para cessar-fogo, mas não a qualquer custo

Gustavo Freitas, direto da Polônia / Especial para O Liberal

Neste momento, escrevo o último relato desta minissérie direto da fronteira da Polônia após uma semana vendo e documentando de perto a vida dos ucranianos.


Nunca é fácil falar sobre guerra porque ela sempre é muito maior que aqueles trinta segundos que assistimos nos telejornais antes de dormir. A vida corrida não nos dá tempo de saber de forma aprofundada o que acontece a milhares de quilômetros da nossa casa, então, alguns segundos na tv ou um corte injusto no celular é tudo o que temos. 

Quando criamos a minissérie Relatos de Guerra, pensamos em levar para o conforto de quem nos assiste um tema que já está tão intrínseco no nosso cotidiano que às vezes sequer notamos. 

Para chegar na Ucrânia não é fácil, os mísseis impedem os voos e a chegada até as fronteiras são longas e custosas. Mas há uma necessidade, cada vez maior, em não desumanizar o que acontece ao nosso redor. 


Eu carregava opiniões sobre o país baseadas exclusivamente em análises políticas e, agora, retorno para casa destinado a jamais deixar o cálculo humano de fora. Este é um país que foi obrigado a fazer amizade com o caos.

Um erro crasso cometido por todos nós, da imprensa em geral, é de associar o país ao Zelensky. É o presidente, claro, mas não representa as marcas deste país. Muitos o aprovam, outros o detestam e quase todos o veem como passageiro e não um líder inegociável. 

Se há uma instituição profundamente ligada ao povo, é o exército. Lá estão os filhos, pais, tios, primos, netos e, em alguns casos, filhas e netas também. É uma grande família que está sacrificando a vida pelo país todos os dias, ainda que não sejam os responsáveis diretos por decidir se a Ucrânia pode ou não resistir à guerra.

São milhares de ucranianos em combate todos os dias, mas o destino do país está nas mãos de duas pessoas. Uma tomará posse em Washington daqui a 8 dias e a outra está sentada no Kremlin. 

A grande maioria das mulheres não estão no front, mas estão integralmente ligadas à guerra. Estou na imigração da cidade fronteiriça de Przemysl, fazendo o trajeto inverso da semana passada e daqui vejo mais uma vez um mar de mães, avós, filhas e netas com malas vazias para fazer compras na Polônia e outras de malas abarrotadas para arriscar a vida de imigrante longe da guerra.

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Por ora,os cenários políticos apontam para uma vitória dos russos, ainda que a um custo muito alto. Antes da invasão em 2022, a língua russa era falada abertamente no sul do país e uma grande parcela de moradores do Donbass nutria simpatia pelos russos. O cenário mudou.

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Em conversas com moradores do Donbass, eles dizem que há muitos apoiadores mas também muitos passaram a nutrir ódio de Putin por toda destruição causada em Donetsk e Lugansk. Em Odessa e outras cidades no sul, a língua russa se tornou um palavrão ofensivo que muitos escolheram eliminar do vocabulário. Se a vitória política e territorial se confirmar, ela será sob um gosto amargo.

Nos últimos dias, se você acompanhou estes relatos de guerra, acredito que também passou a ver um país tão distante de nós, de forma mais humana. Somos diferentes na língua, nossos inimigos não estão nas fronteiras e não vivemos sob o medo da guerra, mas também somos parecidos.

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A Ucrânia é um país de mães que temem pelos filhos fora de casa, de pais que não dormem para  colocar comida na mesa, é um país em que os jovens saem aos sábados para aliviar o fardo da semana, assistem futebol, criticam o presidente, gostam de comida feita em casa e costumam rir dos próprios problemas. 

O país está pronto para um cessar-fogo, mas não a qualquer custo. Espero que achem um meio-termo em breve e voltem a ter uma boa semana de sono, sem os irritantes alertas aéreos pela madrugada. Já seria um bom começo. 

*Esse projeto tem patrocínio da Máxima Segurança

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