No Mês da Consciência Negra, histórias de luta e resistência feminina reforçam o papel essencial das mulheres negras na construção de um país mais justo e igualitário. Em Belém, o Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (Cedenpa) se destaca como um espaço de compartilhamento de experiências, resgate cultural e fortalecimento do ativismo voltado para a transformação social.
Celebrado em novembro, o Mês da Consciência Negra representa não apenas um momento de reafirmação cultural e orgulho para a população negra, mas também um período essencial para amplificar as vozes daqueles que enfrentam o racismo e as desigualdades no Brasil diariamente. Nesse contexto, o ativismo feminino ganha destaque, reforçando a importância de um protagonismo forte e presente das mulheres negras, que historicamente têm enfrentado não só o racismo, mas também o machismo de uma sociedade marcada pela exclusão.
Para Jucilene de Souza Carvalho, ativista do Cedenpa, o Mês da Consciência Negra simboliza tanto a luta como as conquistas já alcançadas. Ela reflete sobre o impacto do racismo e do machismo no dia a dia da mulher negra. “O reflexo do machismo e do patriarcado impede a mulher negra de crescer; fomos jogados pela Lei Áurea das senzalas para as baixadas e periferias. Já faz muito tempo desde a época da escravidão, e ainda vivemos às margens da sociedade”, afirma.
Valorização da cultura negra
A valorização da cultura negra é parte fundamental do movimento, que busca romper estereótipos e ressignificar a identidade negra. Esse esforço cultural e histórico é essencial, segundo Jucilene, para que as futuras gerações de mulheres negras possam se ver representadas em figuras de força e dignidade. “Queremos que nossas meninas cresçam sabendo que podem usar o cabelo solto na rua e vestir a roupa que quiserem”, declara.
As conquistas do movimento negro, e especificamente do ativismo feminino, são evidentes, mas a luta está longe de ser concluída. A realidade social das mulheres negras no Brasil ainda apresenta um quadro de desigualdade em vários aspectos: no acesso ao trabalho, na representatividade política e no atendimento à saúde, para citar apenas alguns. Ainda assim, iniciativas como as promovidas pelo Cedenpa contribuem para romper essas barreiras.
A ativista Angélica Albuquerque, também integrante do Cedenpa, comenta sobre os avanços de políticas públicas e sociais para a população negra: “Nós avançamos bastante, mas ainda não é o suficiente. Precisamos de políticas que sejam efetivadas por um longo período, para que possamos, de fato, estar dentro de espaços que deveríamos ocupar há muito tempo”.
Angélica também enfatiza o direito da população negra. “Até pouco tempo atrás, pessoas negras não tinham o direito à alfabetização; isso aconteceu por séculos, e para que essa reparação histórica faça realmente diferença na sociedade, precisamos ter um número muito maior de negros nos espaços de poder e menos em locais de fome e em penitenciárias.”
Trabalho educativo
Uma das frentes de atuação mais importantes para o Cedenpa e outras organizações de defesa da população negra é o trabalho educativo, que visa conscientizar tanto a comunidade negra quanto a sociedade em geral sobre as raízes históricas do racismo e a necessidade de combatê-lo.
A ativista e educadora social Fátima Matos fala sobre o papel do movimento negro no Brasil. “A população negra é responsável por desconstruir o racismo, enquanto a população branca ainda racista tem a obrigação de desconstruir dentro de si o seu racismo.” Ela ressalta também o trabalho social do Cedenpa: “É fundamental o que o Cedenpa faz, desconstruindo o olhar social que impacta psicologicamente a população negra e iniciando uma nova trajetória na vida dessas pessoas que são impactadas pelo trabalho”, conclui.
A militante e ativista May Sodré é uma das jovens negras que foram impactadas pelo trabalho do Cedenpa. Ela conta que chegou ao espaço após conhecer pessoas que já atuavam na causa. “É muito bom quando você encontra um lugar onde se sente acolhida, respeitada, representada e protagonista da sua história. Eu me sinto em família aqui; todas as vezes que converso com alguém, vejo que elas já passaram por muitas coisas pelas quais também já passei por ser negra”, relata.
May Sodré fala também sobre o impacto de seu trabalho com o hip hop e como ele ajuda outras mulheres. “É muito gratificante quando uma mulher negra tem o poder de pegar no microfone, de se tornar alguém forte. Levo comigo esse empoderamento feminino e passo isso para elas aqui no Cedenpa; é muito recompensador”, finaliza.
Para essas mulheres, a luta pela igualdade é, antes de tudo, uma luta pela dignidade e pela valorização da vida humana. Elas acreditam que, com o apoio de toda a sociedade, será possível construir um Brasil onde as diferenças sejam respeitadas e as oportunidades sejam equitativas. O ativismo dessas mulheres negras, especialmente durante o Mês da Consciência Negra, é um lembrete de que a igualdade racial é um direito de todos e um compromisso que precisa ser assumido por cada cidadão.