Amazônia atlântica revela cenários e novos potenciais turísticos

Chegada do período do “verão amazônico” impulsiona economia da região, que tem Salinas e Bragança como polos de atrativos naturais e culturais

Caio Oliveira / O Liberal

A região oriental da Amazônia sempre foi reconhecida por estar localizada em um ponto estratégico. É nela que o rio encontra o mar e o Norte começa a se dividir com o Nordeste, transformando a área em uma zona de transição importante chamada de Amazônia Atlântica. Ao todo, 49 municípios paraenses compõem essa zona, sendo que Salinópolis e Bragança são duas cidades das mais importantes, funcionando como polos econômicos, culturais e turísticos para o Nordeste Paraense e alavancando o turismo de todo o Estado.

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A partir do Oceano Atlântico, foi através dos rios e entrando na floresta amazônica que os primeiros europeus que aqui chegaram no século XVI puderam observar com fascínio a transformação gradual do ecossistema, que vai mudando conforme as influências na natureza, passando da água salgada do mar para a água doce dos rios, evidenciando a riqueza inestimável da região. Não à toa, é justamente ali que fica a maior linha contínua de manguezais do mundo, começando no nordeste paraense e indo até São Luís, no Maranhão.

 

O Rio Caeté é um dos vários corpos d’água que abriga esses mangues, levando vida e riqueza para os municípios que banha, principalmente, Bragança, cidade que nasceu do rio e cujos habitantes contemplam diariamente suas águas escuras. O município, fundado pelos franceses em 1613, tem uma cultura fervilhante, nas quais se destacam a gastronomia, o histórico complexo arquitetônico do centro, e a música, que mistura o sagrado com o popular em eventos marcados pelo sincretismo religioso.

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“Bragança é conhecida como esse berço cultural, devido às nossas origens africanas, europeias e indígenas”, se orgulha Vinicius Oliveira, secretário de Cultura, Desporto e Turismo do município. Para ele, é impossível falar da cidade sem mencionar a farinha de Bragança e Marujada, exemplos mais marcantes do potencial cultural da região.

Bragança transborda cultura

Criada por um grupo de africanos escravizados do então governo-geral do Grão-Pará e Maranhão, a “Marujada” tem seu primeiro registro no ano de 1789, no período colonial, quando nasce a Irmandade de São Benedito, que tinha o propósito de realizar uma festa em louvor ao “santo preto”, com música e dança nas casas da região. 

"Em julho, por exemplo, a taxa de ocupação de hotéis e pousadas aumenta 45% em relação a baixa temporada, e cerca 500 empregos temporários gerados no município" - Vinicius Oliveira, secretário de Cultura, Desporto e Turismo de Bragança.

Depois de quase 220 edições da Marujada, em 2009, a festa foi declarada patrimônio cultural e artístico do Pará. “Essa riqueza cultural do município é um grande atrativo turístico. Aqui é um berço de música, artes plásticas, culinária, que atrai os turistas para a região, além, claro, da riqueza da nossa natureza. Podemos destacar também a nossa farinha, que talvez seja a nossa maior cultura gastronômica”, menciona o secretário.

Neste ano, a farinha de Bragança recebeu o selo de indicação geográfica do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). De acordo com documentação apresentada para obtenção do registro, Bragança produz entre 800 e 850 toneladas de farinha de mandioca por mês e possui cerca de nove mil produtores locais. Para Vinícius Oliveira, divulgar e explorar essas particularidades do município é o caminho para o desenvolvimento econômico de Bragança, pois há motivos de sobra para que os turistas venham ao município.

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"Estamos trabalhando na criação de roteiros turísticos. Estamos incluindo, por exemplo, a visitação às casas de farinha, que entra já no turismo de experiência”, comenta o secretário, reforçando a busca por esse público que quer experimentar a região com um turismo de imersão. Em maio, o Governo Federal confirmou a inclusão da rota Amazônia Atlântica no Projeto Experiências do Brasil Rural, iniciativa dos ministérios do Turismo e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). De acordo com o governo, a rota foi escolhida em razão das vivências rurais por meio da pesca artesanal, degustação de queijos artesanais, farinhas de mandioca e de frutas encontradas no estado.

“O município vive hoje da agricultura, da pesca e do turismo. Essa parcela da renda turística se dá em toda cadeia, como hotéis, restaurantes, lojas e bares. Em julho, por exemplo, a taxa de ocupação de hotéis e pousadas aumenta 45% em relação a baixa temporada, e cerca 500 empregos temporários gerados no município”, explica. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2020, Bragança tinha uma população estimada em 128 mil habitantes.

Hoje, a maior parte do turismo em Bragança é regional, com pessoas vindo do Estado do Pará. “É gente vinda de Belém, Castanhal, Paragominas, além de gente da Região Sudeste. Mas, a partir do momento que Bragança começou a aparecer mais, até por conta da farinha, a gente começou a sentir esse fluxo maior de pessoas vindo de outros estados, e até, de fora do país. Além disso, a rota turística Amazônia Atlântica, já é uma realidade, atraindo muita gente de fora para a região. A gente tem um público bem diversificado, mas claro que ainda predomina o público regional, e nossa intenção é expandir isso”, explica Vinícius Oliveira.

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Ainda dentro do turismo de experiência, outro ponto que fascina os visitantes que chegam a Bragança são as características que a cidade ainda preserva no próprio modo de viver dos habitantes, sobretudo, nas áreas mais afastadas do centro do município. Na região, a atividade pesqueira persiste do modo tradicional, presente na vida dos moradores das regiões perto do mar, dos rios e dos mangues. 

A arraia e o pargo são os principais frutos do mar pescados em águas mais profundas de Bragança. No caminho para Ajuruteua, uma pequena vila de pescadores ainda preserva o modelo ancestral de pesca, usando os barcos a motor e à vela que partem na vazante para o mar e voltam para a costa durante a enchente, depois de esquadrinhar as águas com a rede para pescar tudo que for possível. Além de vender o que é apanhado tanto na beira da estrada quanto na feira do município, os pescadores locais ainda praticam o escambo, trocando o pescado apanhado no dia com os demais moradores da comunidade, dando peixes e pedaços de arraias e recebendo limões e laranjas, em um modelo que, mais do que gerar renda, estreita as relações entre os moradores da vila.

Segundo a administração da cidade, os meses de maior visitação são julho, por conta das férias escolares; dezembro, por causa da Festividade de São Benedito e Marujada; e o carnaval, no começo do ano. Além dos atrativos já citados, a cidade banhada pelo Atlântico e pelo Caeté oferece opções de praias e igarapés, passeios que evidenciam o potencial de vários segmentos da região bragantina.  “No turismo, eu destaco a praia de Ajuruteua, que terá verba para a construção da orla da praia. Hoje, já temos 1.800 metros de cais de arrimo pronto, além de um trabalho de urbanização da orla tanto de Ajuruteua quanto do centro de Bragança”, conta o prefeito Raimundo Nonato de Oliveira, o “Raimundão”.

‘Salinas’ é destino para quem quer agito ou tranquilidade

Seguindo viagem pelo litoral paraense, está Salinópolis, cidade que é chamada de Salinas pelos banhistas que invadem suas areias nas férias de julho. A história da cidade começa no fim da primeira metade do século XVII, quando os jesuítas ensaiaram um princípio de vilarejo, mas somente em 1781 houve a fundação oficial. O nome Salinas veio devido à existência de uma pequena salina, fábrica de extração de sal da água do mar, durante o período colonial, administrada pelos jesuítas que utilizavam principalmente a mão-de-obra indígena. O sal era muito usado para conservação do peixe com os quais se abasteciam durante a piracema e, até hoje, o pescado segue sendo uma das principais fontes de renda, seguido do setor turístico.

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“Turismo tem muita força não apenas do município, mas de toda região. Estamos no pólo Amazônia Atlântica, dentro da Região do Caeté, e Salinas está na ponta, e favorece todos esses municípios”, explica o secretário municipal de Turismo, Cultura, Esporte e Lazer, Júlio César Vieira. “Salinas é considerada a cidade que fomenta o turismo, potencializando para que os outros municípios venham a se desenvolver economicamente. Esse é nosso papel: trabalhar não apenas o município, mas com a regionalização”, destaca, explicando sobre a transformação pela qual o município passa a partir de junho, quando começa a alta temporada, que vai até dezembro.

“Costumamos dizer que perdemos as contas no mês de julho. Temos uma população de cerca de 49 mil habitantes, em um fim de semana, vai para cinco vezes mais. Nesse período, Salinas não dá conta da demanda, pois o consumo é muito alto. E por isso a gente precisa dos parceiros da região, para fornecer as hortaliças, o caranguejo, o pescado, que vem de outros municípios. Todo mundo se ajuda e todo mundo cresce”, reforça o secretário de Turismo, que fala ainda sobre como é importante preservar a beleza natural das praias e mangues, e por isso, o trabalho de conscientização ambiental é fundamental, com apoio da Secretaria de Meio Ambiente.

“Tentamos ao máximo manter esse aspecto natural da praia, tendo cuidado com as construções no Maçarico, Atalaia e outras áreas de mangue, além da questão do lixo. Estamos com enfoque forte nos projetos de educação ambiental nos bairros, conversando com a comunidade local sobre a importância da preservação do temos. Falamos sobre poluição, sobre o respeito ao período do defeso do caranguejo”, informa Silvan Cardoso, Secretário Municipal de Meio Ambiente de Salinópolis. “Hoje, a população gera 500 toneladas de lixo por dia. Nesse período de pico, vai para 5 mil. Multiplica muito, e exige mais esforço das secretarias em conjunto. Então, estamos focando na educação, pois não é só a prefeitura fazer sua parte. A população também tem deveres a cumprir nessa parte”, diz o secretário, reforçando a preocupação com o que deixado para trás pela alta taxa de visitação nas férias.

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Tanto Silvan quanto Júlio César concordam que o equilíbrio é essencial para que o município se desenvolva economicamente, abrigando cada vez mais turistas, mas que também, se preocupem mais com a natureza, para que as belas praias de areia branca sigam encantando os visitantes. Para a administração municipal, é preciso estar preparado para receber essa demanda, e o objetivo hoje é melhorar a estrutura que Salinópolis já tem.  “O aeroporto local é um sonho para todo mundo, até mesmo para a chegada de um turista de maior poder aquisitivo. A previsão de inauguração é ainda para o mês de julho, pois houve uma ampliação da estrutura, aumentando a pista de pouso para receber aviões de maior porte. Salinas é uma criança em fase de crescimento”, encerra Julio Cesar Vieira.

Um turismo em sinergia com a natureza

As imagens conhecidas para quem frequenta Salinas em julho são das praias cheias no mês de julho, com as areias do Atalaia tomadas pelos carros e com aparelhos de som ligados em alto volume, combinando com o clima quente que os banhistas procuram. Contudo, para os empreendedores locais, o município tem muito mais a oferecer, e projetos da rede hoteleira já investem em destinos diferentes dos habituais, com foco na natureza inigualável com a qual a região foi abençoada.

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“Os principais destinos hoje, no Brasil, são os de contemplação. Estamos passando por uma pandemia e vendo a importância do cuidado com a saúde, a experiência em locais abertos e com contato com a natureza, e Salinas tem tudo a ver com isso”, comemora Gerlado Ramos Barros, jovem empresário que administra o Hotel Solar, legado de sua família que passou por várias modernizações em sua gestão. Hoje, Geraldo investe muito em passeios pela zona mista entre e rio e mar que banha seu empreendimento, onde os visitantes podem navegar e admirar os guarás, garças, peixes e arraias que ali habitam.

“O principal atrativo daqui é a beleza natural com os mangues, com as praias, com o local aberto. Então, a gente tem de entender que estamos na Amazônia em contato com o Oceano Atlântico, e não há um apelo maior que esse. Claro que o turismo de negócios é muito importante, mas o turismo de contemplação da natureza, com a gente sabendo aproveitá-lo para o ecoturismo, é o grande negócio que Salinas tem em mãos, e tem de saber como explorar isso, com o público certo. O público que compra o ecoturismo é família, gosta de tranquilidade, e é rentável”, explica.

image (Thiago Gomes / O Liberal)

Preocupado com a natureza que o fez se apaixonar por Salinas, Geraldo providenciou estudos que pudessem lhe indicar a melhor forma de explorar o potencial turístico da região causando danos mínimos ao mangue e à floresta. Morador do município, onde reside com a esposa e os filhos, o jovem empresário não se vê mais voltando para Belém e diz que, hoje, Salinas tem estrutura necessária para receber gente do mundo todo. “Eu com 21 anos assumi o hotel, e até hoje, estamos conseguindo vencer os obstáculos. Salinas consegue ter uma maturidade empresarial, mostrando o quanto é importante trabalhar a questão ambiental para ajudar no desenvolvimento do município”, reforça.

Um dos parceiros que compartilha o mesmo amor pelo “Sal”, como carinhosamente é chamado o município, e enxerga o potencial quase ilimitado da região é Max Morais, diretor da escola de idiomas CCAA e que também reside no litoral. Recentemente, ele tem colocado em prática a um sonho antigo chamado “AnauêA”, que é uma operadora de ecoeducação e turismo, que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural, econômico e cultural, com incentivo de sua conservação e busca a formação de uma consciência e habilidades ambientalistas através de projetos pedagógico multidisciplinares. O “Welcome to Salinópolis” é um desses, iniciativa que promove intercâmbio linguístico com o uso da técnica “aprender-fazendo", apresentando soluções para o bem-estar das populações e comunidades envolvidas, na formação de multiplicadores ambientais.

Além do destaque da educação ambiental, formando agentes multiplicadores, o projeto ainda que formar mão de obra local e qualificada, que possa atuar no setor turístico da região. “Essa agência também incluirá desde as crianças, para formar, no mínimo, formadores de opinião, conscientes de seu papel. A longo prazo, podemos formar condutores e guias turísticos. No mundo inteiro, as escolas que trabalham com o modelo Environmental Education (Eco-educação), perceberam que a experiência, relacionada ao conteúdo curricular e vivência junto a natureza, edifica o conhecimento do ensino tradicional de sala de aula. Estamos desenvolvendo um modelo de intercâmbio cultural, com a participação da comunidade regional e internacional, e incluir a comunidade carente. Em setembro, devemos inserir alunos de escolas locais”, comemora Max Marais.

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