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É plágio usar IA na escrita de artigos científicos? 4 perguntas para entender a legislação

Especialista em direito orienta sobre aspectos legais na utilização de ferramentas como ChatGPT

O uso de inteligência artificial (IA) e ferramentas como o ChatGPT está transformando o cenário da escrita, inclusive a científica. Universidades e pesquisadores em todo o mundo estão usando tecnologias para otimizar a produção acadêmica. Contudo, a incorporação de IA na escrita também levanta questões éticas. Há preocupações sobre a originalidade e a autenticidade das pesquisas.

Para entender mais sobre o tema, entrevistamos o especialista Márcio Augusto Marques de Azevedo, Advogado graduado em Direito pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Mestre em Direito pela Universidade do Porto (FDUP) e membro do escritório Pinheiro & Mendes Advogados.

1) Do ponto de vista legal, o uso de IA, como o ChatGPT é ilegal? Existe algum tipo de crime relacionado a utilização da ferramenta?

“O uso de inteligência artificial (IA), como o ChatGPT, não é ilegal por si só, mas existem várias considerações legais que podem afetar o uso da ferramenta. Conceitualmente, o ChatGPT é um modelo de linguagem que, a partir do armazenamento e processamento de sua base de dados, apresenta uma resposta coesa para o usuário. Dessa forma, a sua utilização acaba por refletir em diversos interesses juridicamente protegidos”, analisa Márcio Azevedo.

O advogado destaca ainda que “a atividade de armazenamento e tratamento de dados deve respeitar as disposições da Lei Geral de Proteção de Dados. Já a produção de conteúdo deve atentar-se às leis de n.º 9.279/ 1996 e n.º 9.610/1998 que versam, respectivamente, acerca da proteção da propriedade intelectual e direitos autorais. No que tange especificamente aos trabalhos científicos cabe aos usuários atentar-se à conformidade das notas técnicas existentes”.

A falta de uma legislação especifica sobre o tema, também é ponderada por Márcio: “Como não há regulamentação específica acerca da utilização das IA não é possível pressupor por ilegal a utilização da ferramenta. Porém, é importante destacar-se que o uso abusivo da ferramenta e para finalidades ilícitas tem repercussões na esfera cível, criminal e administrativa”.

Apesar do uso do ChatGPT por si só não ser considerado crime, na avaliação de Azevedo é preciso ter atenção ao utilizar a tecnologia “A ferramenta pode ser utilizada como meio para prática de tipos penais, como a violação de direitos autorais (o plágio, art. 184 do CP) e de Estelionato (art. 171 do CP), este último com a pena máxima aumentada para 8 (oito) anos no caso de fraude eletrônica e agravada de uma a dois terços, se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional”.

2) Quando falamos de produção de conteúdo com IA, onde inicia o plágio e o que estaria liberado?

“A produção de conteúdo por IA, como o ChatGPT, levanta questões complexas sobre plágio e direitos autorais. Primeiramente, deve-se compreender que o plágio é a utilização de trechos, trabalhos completos, ou até ideias de outra pessoa e apresentá-los como seus, sem dar o devido crédito ao verdadeiro autor”, afirma o advogado. O especialista ainda ressalta que “é necessário atentar-se que a própria Lei de n.º 9.610/1998 estabelece,em seu art. 46, as hipóteses em que a reprodução, citação e utilização de obras, quando devidamente indicada o nome do autor, não constituem violação aos direitos autorais. As exceções ao direito autoral estão, normalmente, relacionadas às atividades acadêmicas, de imprensa, ou de uso individual”.

Levando em conta que a originalidade é fator determinante para a caracterização do plágio, Azevedo reforça uma informação importante: “os limites da produção de conteúdo pelas ferramentas de IA é a reprodução direta de trechos de obras existentes, sem a devida referência da real autoria. Se o ChatGPT gerar um conteúdo original, mesmo que inspirado por temas ou ideias comuns, mas sem copiar diretamente o texto existente, não necessariamente estaríamos diante de violação a direitos autorais”.

3) A legislação atual precisa avançar em quais aspectos?

Questionado sobre qual caminho as leis devem seguir para alcançar as lacunas existentes, Márcio considera que ”A princípio, a regulamentação deve voltar-se para as próprias plataformas que desenvolvem as ferramentas de IA. É necessário que se estabeleçam diretrizes a serem observadas pelas empresas a fim de garantir a conformidade à legislação nacional, bem como desestimular o uso da ferramenta para atividades ilícitas”. 

Azevedo destaca ainda o próximo passo no avanço do arcabouço legal: “Uma vez regulamentada a atividade, pode-se pensar em normas dirigidas aos usuários das plataformas, de modo a coibir a utilização ilícita da IA, seja qualificando os crimes já existentes, com o agravamento das penas, seja pela criação de tipos penais específicos, bem como outros mecanismos de desestímulo à abusos”.

4) Existe alguma linha que não deve ser ultrapassada?

Dentro do meio acadêmico, Azevedo lembra que existem programas de identificação de trechos reproduzidos sem a devida indicação da autoria, e que a utilização do ChatGPT pode ocasionar em penalidades administrativas: “o usuário pode incorrer no crime de violação de direito autoral, com pena de 3 meses a 1 ano, ou multa. No entanto, reitera-se que o uso da IA não é negativo por si só. Não se pode negar que a ferramenta é muito útil para diversas atividades, como revisão ortográfica, gramatical, organização de listagens, criação de gráficos, modelos de slides, indicação de normas técnicas, mas sempre acompanhado da devida filtragem do usuário”.

Ao finalizar, Márcio conclui que não se deve vedar a utilização da IA, mas ressalta o uso adequado em sociedade. “No meio acadêmico, deve-se sempre levar em consideração a ética e metodologia científica a fim de garantir a originalidade e a qualidade da produção do conteúdo. O usuário deve sempre ter em mente que eventuais abusos podem acarretar consequências legais indesejáveis à vida profissional e acadêmica”, pontua o advogado.

 

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