Artilheiro do Paysandu, Nicolas fala da importância do futebol em questões sociais: ‘muito válido’

Sem filtros, o jogador abordou temas como xenofobia e mudanças climáticas, em entrevista exclusiva que falou de aspectos fora do mundo da bola

Caio Maia
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"É bom falar de coisas de fora do futebol. É importante a gente saber que existe um mundo do outro lado". Foi dessa forma que o atacante Nicolas, de 34 anos, artilheiro do Paysandu na temporada de 2024, recebeu a equipe de O Liberal na última quinta-feira (11). Após uma exaustiva entrevista coletiva - a mais longa já concedida por algum jogador do clube na temporada - o camisa 11 encontrou um tempo antes do treino da equipe para conversar com exclusividade com a reportagem de O Liberal. O tema da entrevista era bem ao gosto do jogador: posicionamento quanto a questões políticas e sociais.

Em uma conversa longa e reveladora, Nicolas desabafou e destacou a importância que o futebol tem na construção da sociedade. 'Sincerão', o camisa 11 da Curuzu fez questão de expor opiniões sobre vários assuntos recorrentes no mundo atual, como mudanças climáticas, xenofobia e feminicídio. Afinal, esse deve ser o papel de um atleta, segundo ele.

No entanto, o futebol não saiu de pauta. O jogador falou sobre a volta aos gols pelo Paysandu, obtida na partida contra o Coritiba-PR, e da relação com Vinícius Leite. O companheiro de clube e amigo deixou o Papão no início da semana.

Confira a entrevista na íntegra:

O Liberal: Você voltou a marcar pelo Paysandu depois de um longo jejum de jogos pela Série B. Como você se sente após se livrar desse peso? Quais são seus próximos objetivos em Belém, tanto individuais quanto coletivos?

Nicolas: Fico muito feliz de estar fazendo esses gols. Ninguém esperava que logo na primeira temporada eu chegasse a esses números. Eu mesmo, na entrevista de apresentação, dizia que não seria igual à primeira vez. E estava certo, porque agora está sendo melhor. Apesar disso, minha sede de conquistas não para. Ainda tenho muita vontade de vencer e ganhar. Podemos sonhar com o acesso, já que estamos antes da metade do campeonato. Temos que ir somando pontos e ver quando vamos conseguir brigar por coisas maiores na tabela. Por enquanto, nossa meta é atingir os 45 pontos e, depois, vamos buscar outras coisas. Enquanto estiver aqui, vou brigar por glórias e conquistas.

OL: Vinícius Leite, seu amigo e companheiro de time desde a primeira passagem pelo clube, deixou o Paysandu nesta semana. Na última entrevista em Belém, o jogador disse que passava por problemas pessoais. Você acompanhou os dramas vividos por ele? De que forma você participou desse processo e como enxerga a mudança de ares?

N: Fico triste pelo Vinícius, porque é uma pessoa por quem tenho muito carinho. Ele me ajudou muito. Nessa saída, muitas pessoas esquecem de focar na parte boa. É importante lembrar que ele ajudou muito o clube. Ele foi extremamente importante no acesso do ano passado e no título de 2020. Ele é uma pessoa que deixou seu nome na história e isso ninguém vai apagar. Só que as coisas aconteceram, ele entrou em consenso com o clube e quis buscar outros caminhos, o que é natural no futebol. Os atletas vêm e vão, mas o que continua é o Paysandu. Desejo toda a sorte do mundo para ele. Fico triste pela ausência dele aqui, mas feliz porque ele queria novos ares e conseguiu. Torço para que ele seja feliz no novo clube.

image Gaúcho, Nicolas fala com tristeza sobre a tragédia sofrida pelo Rio Grande do Sul (Thiago Gomes/ O Liberal)

OL: O Rio Grande do Sul ainda se reconstrói de uma grave catástrofe climática. Você, enquanto gaúcho, foi rosto de várias campanhas que o Paysandu fez para ajudar os desabrigados pelas enchentes. Como você viu a tragédia de longe? Familiares seus foram atingidos? Como pode ajudar à distância?

N: Triste pela situação. Inclusive, hoje estava falando sobre isso com um amigo meu que mora no Rio Grande do Sul e avaliamos o quanto será difícil para o estado se estruturar ao nível financeiro e emocional, já que muitas pessoas perderam tudo. Nós gaúchos que estamos longe sempre tentamos contribuir, mesmo que seja de uma forma pequena. Meus familiares não foram afetados, mas tenho amigos, conhecidos, que perderam tudo. A gente tenta ajudar de alguma maneira. Desejo força para eles e que as coisas possam se normalizar, mas sabendo que deve haver uma precaução maior por parte do poder público, para que esse tipo de situação não aconteça mais e, se acontecer, a gente esteja mais preparado. Essa tragédia é imensurável, por tudo o que tirou das pessoas.

OL: Você é um jogador que costuma se posicionar bastante sobre questões políticas e sociais. Recentemente, jogadores da seleção da França se mobilizaram pelo processo eleitoral no país. Você concorda com essa postura mais ativista de jogadores de futebol? Como você enxerga essa relação entre esporte e política?

N: A gente tem uma responsabilidade social muito grande. Toda vez que você vai abrir a boca, que vai se posicionar, tem que haver muita cautela, porque existem pessoas que se espelham em você. Já que escolhi essa profissão e estou nela desde cedo, tenho que saber das consequências dos meus posicionamentos. Acho que é muito válido e está cada vez mais comum o fato de jogadores se posicionarem. Quando você se posiciona politicamente, às vezes há um pouco de represália, mas cada escolha que você faz é uma renúncia. Se você segue um lado, desagrada o outro. Isso vai além da política partidária e se estende às causas sociais, de atenção ao próximo. Acho que somos muito importantes na sociedade, já que quando nos posicionamos influenciamos várias pessoas.

image Nicolas defende o posicionamento de jogadores sobre assuntos polêmicos (Thiago Gomes/ O Liberal)

OL: Hoje, os jogadores costumam dar respostas padronizadas em entrevistas, muito fruto do 'media training'. Você, no entanto, parece seguir o caminho inverso, sempre falando de temas polêmicos e expondo sua opinião. A que se deve isso? Por que você adota esta postura?

N: Acredito que a chave para tudo é ser uma pessoa de bem, de caráter, que preza pelo certo. Coincidentemente, o caso de xenofobia foi no Rio Grande do Sul, minha terra. Aquilo foi algo que me incomodou profundamente. Além de estarem ofendendo uma região que adoro, que é o Norte, parecia que os xingamentos ocorreram no 'quintal' da minha casa. Nesse momento entrou minha responsabilidade social. Não é nada forçado, tudo é espontâneo. Meu posicionamento é baseado no que vejo, assisto e leio. Particularmente, as pessoas sabem que no meu café da manhã assisto a um canal de notícias e não de esporte. É importante saber que existe um mundo fora do futebol e estar preparado para isso. O que acontece no futebol eu sei, não preciso ir atrás. Mas fora dele eu preciso me situar no que ocorre. Infelizmente, nossa classe sofre com isso, com a falta de posicionamento e esclarecimento. Muitas pessoas não sabem o que está acontecendo e pecam na hora de se posicionar. Eu, então, tento fazer o caminho inverso, para contribuir com a sociedade.

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