Remo e Paysandu são os principais candidatos no Pará a virarem SAFs, aponta especialista
Advogado Rodrigo Monteiro de Castro, autor intelectual da Lei de SAFs no Brasil, diz que estado tem potencial de atração de investimentos.
Até onde o futebol paraense pode chegar? Dependendo da resposta dessa pergunta, a solução pode ser simples: SAF. De acordo com especialistas, o futuro do futebol brasileiro pode estar na nova lei que regulamenta clubes-empresas no país. O novo código, além de estipular obrigações entre agremiação e investidores, oferece um ambiente propício para que clubes tradicionais possam se estruturar financeiramente e voltar a brigar no topo do futebol nacional.
Quem conversou com o Núcleo de Esportes de O Liberal sobre o assunto foi o advogado Rodrigo Monteiro de Castro, autor intelectual da Lei de SAFs no Brasil. Segundo ele, o Pará é um estado com ambiente propício para a criação de um clube-empresa. Nesse sentido, Remo e Paysandu, equipes com muita torcida e tradição, despontam como principais candidatos à transição.
O Liberal: O que a lei da SAF tem diferente da antiga lei de clubes-empresas no Brasil?
Rodrigo Monteiro de Castro: A primeira iniciativa que temos nesse sentido no Brasil é com a Lei Zico e depois com a Lei Pelé. O que a lei do clube-empresa dizia: um clube pode virar empresa. Tão somente isso. O que a SAF faz e muda em relação ao que já tinha? Virar empresa não é somente a solução, mas um empresário precisa encontrar um ambiente propício pra isso, como financiamento, governança, controle, tributação e organização do passivo. A lei da SAF diz que existe um tipo de empresa que tem uma regra própria. Ou seja, clube, torcedor e investidor vão saber como isso tudo funciona. Antes, na lei do clube-empresa não. Além disso, a lei da SAF oferece todos os instrumentos pra criação de um ambiente de viabilização. Imagina que um leãozinho nasce em cativeiro. Quando ele é solto na natureza ele não tem condições de sobreviver, porque ele não sabe. A lei do clube-empresa é quase isso, apenas diz que as agremiações podem virar empresa, mas não dá instrumentos pra que ela sobreviva nesse ambiente hostil, que é o mercado. Agora, com a lei da SAF, esse leãozinho vai para a natureza com um habitat de transição, com formas e meios para que ele se desenvolva e se torne um leão forte. Em outras palavras, a lei da SAF é um instrumento para que o clube entenda como ele vai sobreviver num ambiente hostil e ser sustentável num contexto competitivo.
OL: O Brasil usou como parâmetros outras legislações para criar a lei das SAFs ou elaborou um código próprio sobre o assunto?
RMC: Eu fui estudar o que tinha ocorrido no Brasil desde a constituição de mais 25 países. Todo país tem a solução para o seu problema e a sua realidade, então a lei brasileira é feita para o Brasil. Ela entende a dimensão do mercado do futebol, que é um dos maiores do planeta. Existem 150 milhões de pessoas que acompanham o futebol só no Brasil, existem mais de 20 times no país com 1 milhão de torcedores, temos o campeonato mais competitivo do mundo e a partir daí olhamos para o sistema do Brasil e opções foram dadas. Estudamos profundamente outras 25 legislações, mas adaptamos tudo a nossa realidade.
OL: O que torna o futebol brasileiro mais atrativo do que o resto do mundo para que um empresário invista numa SAF no país?
RMC: Futebol é a maior atividade de entretenimento do planeta. Mais de 5 bilhões de pessoas acompanham o esporte no mundo. Os times globais não se restringem aos seus países, mas o Brasil tem um mercado fechado, já que os times daqui não tem torcedores internacionais. Então, ainda estamos restritos a um mercado de 150 milhões de pessoas. Além disso, 11% de todas as negociações de jogadores no mundo envolvem brasileiro, isso é um número muito grande. A gente também tem um campeonato com muito mais competitividade, somos o maior ganhador de copas e um mercado inteiro a se formar. Nenhum país no mundo fez o que o Brasil está fazendo. A Espanha resolveu um problema, a Inglaterra outro, a França mais um, mas essa ideia de criar um ambiente em que torcedores, investidores e clubes saibam como vai funcionar, não existe. Oferecemos perspectiva, produtos e um mercado regulado. Aqui temos muitos times grandes. Além dos 13 tradicionais, podemos somar Fortaleza, Athletico, Bragantino e, porque não, Remo e Paysandu, que têm torcida e poder econômico da região. Teve ano que o Remo teve a maior média de público de todo o Brasileirão. Neste ano, mesmo na Série C, está entre as 20 maiores do Brasil. Portanto, o Pará, que cumpre um papel importante dentro da Federação, é visto como um Eldorado pro mercado. O resto do país vai acordar pra isso, pra torcidas fanáticas, possibilidade de desenvolvimento.
OL: O que um clube precisa ter para virar SAF? Apenas clubes falidos podem realizar esta transição?
RMC: A realidade dos clubes eficientes é exceção. Isso ocorre só quando existe uma pessoa que vira meio "dona" do clube, durante anos, e impõe sua maneira de gestão, como o Atlhetico-PR. A maioria dos clubes vivem em dificuldade e não conseguem competir no mercado. Qual clube pode virar SAF? Qualquer um. Claro que não vamos transformar um time de uma cidade pequena num Flamengo, mas você alçar ele até o ponto de potência regional. A transformação em SAF depende da ambição de cada time. Se querem viver nesse mundo de Série C e D, tudo bem. Agora se querem dar um passo maior, eles não vão avançar usando essa forma associativa. De todos os times importantes do planeta, só dois são clubes - Barcelona e Real Madrid.
OL: O que é necessário para que o Pará tenha uma SAF em breve? Remo e Paysandu despontam como principais candidatos à mudança?
RMC: Eu sou apaixonado pelo Pará. O estado tem um potencial em todos os segmentos e conseguiu se firmar como um lugar de torcidas apaixonadas e tradicionais. Ao contrário do que ocorre muito no Nordeste, quando uma pessoa torce pro time do estado e pra um de fora, aqui torcedores de Remo e Paysandu apoiam muito os clubes locais. Novamente olhando pro futebol do Nordeste, que tem meios de comparação com o do Norte, vemos que algumas equipes com pequenos arranjos conseguiram alcançar espaços que Remo e Paysandu ainda não chegaram. Quem tem que dar a resposta de 'até onde o futebol do Pará pode chegar' são os torcedores. Eles querem um clube que só dispute o campeonato paraense com seu principal rival, ou querem colocar o time num outro patamar? Se você tiver recursos e estrutura, você compete na Série A e, eventualmente, ganha um título nacional. Isso tudo depende da relação entre dirigente e torcedor. Se a ideia for abandonar esse projeto pouco ambicioso, a SAF é um caminho. Será que os torcedores querem só gritar uma vez por ano 'é campeão paraense' ou querem vibrar numa sintonia nacional?
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