Arthur Friedenreich: quem foi o atleta negro e primeiro craque brasileiro

Ultrapassando as barreiras do racismo, "El Tigre" se tornou o 1º craque negro da Seleção Brasileira. Ex-jogador foi homenageado pelo Google

Gabriel Bentes
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Primeiro homem negro a jogar futebol profissional no Brasil, Arthur Friedenreich foi o homenageado na tela principal do Google neste 18 de julho, dia de seu nascimento. Quatro anos após a abolição escravidão no Brasil, nascia no ano de 1892, na cidade de São Paulo, aquele que seria o pioneiro no esporte exclusivo para pessoas não-pretas.

image Friedenreich é homenagem pelo Google em forma de "Doodle" (Reprodução/Google)

Filho de um imigrante alemão, chamado Oscar Friedenreich, e uma professora, chamada Matilde de Morais e Silva, Friedenreich começou cedo no futebol amador, até que, por meio de seu pai, que tinha conexões com imigrantes alemães, conseguiu adentrar no esporte de forma profissional. O motivo propulsor para isso foi o acidente que o rapaz alto, forte e de olhos verdes sofreu, de acordo com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Durante uma partida em uma rua, o jovem foi atropelado e sofreu alguns arranhões. Preocupado, seu pai não queria que esse fato viesse a ocorrer novamente e matriculou o filho no clube Germânia (atual Pinheiros), sendo este o primeiro time profissional que o rapaz teve contato.

Aos 17 anos de idade, Friedenreich estreou oficialmente no Germânia e impressionou o público com suas habilidades com a bola. Após algumas trocas de clubes de futebol, em apenas quatro temporadas, ele se tornou o artilheiro da liga de São Paulo com 16 gols – e se tornaria ainda o artilheiro da Liga Paulista mais sete vezes.

"El Tigre" da Seleção

O apelido de "El Tigre", "O Tigre" em português, surgiu após uma partida da Seleção contra o Exceter, da Inglaterra, em 1914. Arthur Friedenreich perdeu dois dentes da frente depois de uma entrada dura e, mesmo assim, prosseguiu até o fim do jogo. O episódio lhe rendeu o apelido que referencia o seu espírito de luta, dedicação e agilidade.

Cinco anos depois, "El Tigre" viria a se tornar o ídolo do país. Disputando o Sul-Americano no Estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro (RJ), “El Tigre” marcou quatro gols, e foi o responsável por marcar o gol que garantiu o primeiro grande título da Seleção Brasileira. A decisão foi mais emocionante pois o craque acertou as redes na prorrogação da partida contra o Uruguai.

Pela Seleção, Friedenreich jogou três partidas, o suficiente para se tornar o primeiro a marcar um hat-trick (três gols em um único jogo) na Copa América.

Consequências do Racismo

Apesar de sua existência no futebol profissional ser um papel importante na luta contra o racismo e seu talento em campo ser indiscutível, o seu tom de pele foi parâmetro para que, em 1921, Arthur Friedenreich ficasse fora do Campeonato Sul-Americano, um dos torneios mais importantes do esporte.

Após determinação do Presidente da República da época, Epitácio Pessoa , somente atletas brancos deveriam representar a Seleção no exterior. Assim, "El Tigre" e os demais negros ficaram fora do torneio. Segundo o Museu do Futebol, o Brasil perdeu a disputa.

Por conta do preconceito massivo, antes de algumas partidas Friedenreich alisava o cabelo e passava pó na pele para ficar mais clara e se parecer mais com um europeu.

Revolução de 1932

Em 1932, Arthur Friedenreich decidiu deixar os estádios de lado e foi jogar no campo da revolução, segundo a Folha de S.Paulo. Aos 40 anos de idade e 20 de futebol, o craque da época decidiu apoiar a Revolução Constitucionalista de 1932, um conflito entre paulistas e o governo de Getúlio Vargas.

Friedenreich liderou o Batalhão Esportivo, que tinha quase 3 mil outros atletas, e foi promovido a segundo tenente. Por meio de uma rádio, o jogador convidou um apelo aos colegas esportistas para que se juntassem à causa: "Imiteis meu gesto, inscrevendo-vos na Mobilização Esportiva, a fim de que todos juntos defendamos a causa sagrada do Brasil", declarou “El Tigre”. "Tudo por São Paulo num Brasil unido!", disse Friedenreich.

Para financiar a luta armada contra o governo Vargas, o jogador doou suas medalhas e troféus. A tropa do presidente acabou derrotada. No entanto, após quase três mese, a Revolução de 1932 chegou ao fim com a rendição paulista.

Após a guerra, Friedenreich retorna aos campos e joga por mais três anos. Em 22 de janeiro de 1966, ele se manifestou publicamente sobre os rumos do futebol da época em artigo publicado no jornal O Globo com o título "Para Vencer na Inglaterra":

“Quando tive a honra de defender as cores do Brasil, o futebol era simples e sem mistérios”, escreveu o jogador. “Obedecia-se à clássica formação das três 'fatias', ou seja, defesa, meio de campo e ataque”, expressou Friedenreich.

Adeus oficial aos campos

Em 21 de julho de 1935, quando jogava pelo Flamengo, Friedenreich encerrava oficialmente sua vida nos gramados. Apesar das pontuações não serem registradas corretamente na época, ele é lembrado por marcar 1.329 gols até sua aposentadoria aos 43 anos.

Em seguida, o jogador passou a trabalhar numa companhia de bebidas. Viveu em uma casa cedida pelo São Paulo até morrer em 6 de setembro de 1969, aos 77 anos.

image Camisa exclusiva em homenagem à Arthur Friedenreich (Foto: Museu do Futebol)

(*Gabriel Bentes, estagiário sob supervisão de Pedro Cruz, coordenador do Núcleo de Esportes de O Liberal)

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