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Mulheres ocupam apenas 37% dos cargos de liderança no mundo

Na contramão da falta de equidade de gênero, paraenses lideram empresas de sucesso

Daleth Oliveira

As mulheres ocupam menos da metade dos cargos de liderança em empresas no mundo. Um levantamento do Fórum Econômico Mundial revela que a participação feminina em postos de liderança subiu de 33% em 2016 para 37% em 2022. Um aumento de apenas 5% em cinco anos mostra que para que haja equiparação nos cargos por gênero, ainda há um longo caminho pela frente.

Em alguns setores econômicos, as mulheres representam quase a metade dos cargos de liderança, como em ONGs e associações (47%), educação (46%) e serviços pessoais e de bem-estar (45%). No outro extremo, há setores em que as mulheres estão em absoluta minoria, como tecnologia (24%), energia (20%) e infraestrutura (16%). A vice-presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Iza Reis, afirma que o cenário é reflexo de machismo estrutural na sociedade.

“O que faz as mulheres serem minoria nos espaços de chefia é a falta do desejo das empresas de terem mulheres em posições de liderança, por conta do machismo estrutural. Então, quando a empresa entende que as mulheres não estão preparadas ou não dão oportunidades, elas entendem que apenas homens podem ocupar espaços de liderança, então, esse é o principal motivo”, diz a especialista.

O conceito de machismo estrutural, segundo o psicanalista, filósofo e pesquisador brasileiro Helio Hintze, se baseia na construção, organização, disposição e ordem dos elementos que compõem o corpo social, dando sustentação à dominação patriarcal, enaltecendo os valores constituídos como “masculinos” em direto e desproporcional detrimento dos valores construídos como “femininos” em todas as suas manifestações, em especial na mulher. Portanto, por conta da estrutura da sociedade, muitas pessoas já crescem entendendo que as mulheres não podem ser líderes. O que não é verdade.

Em Belém, Janice Tanaka, 42, é gerente geral da empresa em que trabalha. Ela atua na área de contabilidade e, além disso, ainda tem tempo para ser instrutora de treinamento do sistema financeiro do Governo do Pará. Liderar para ela, nunca foi um problema, sempre obtendo resultados positivos, mesmo sentindo que precisa provar que é capaz.

“Já ocupei outros cargos de gestão e tenho perfil de liderança. Ser mulher facilita o trato com a equipe de trabalho, temos empatia para tornar o ambiente agradável para o convívio diário. Quando comecei a trabalhar onde estou hoje, o clima era frio, os funcionários não se soltavam, era cada um por si. Atualmente, estão interagindo mais com brincadeiras e até colaborando com o trabalho dos outros colegas. Porém, percebo que precisei demonstrar que tenho conhecimento e capacidade para ocupar minha função, pois temos funcionários com mais idade, porém menos experientes”, relata Tanaka.

Iza Reis completa que os benefícios não param no ambiente interno do trabalho, mas também refletem no externo, causando boa impressão na imagem da empresa que promove equidade de gênero nos altos cargos.

“A vantagem de ter uma mulher na liderança é diversificar os perfis na chefia. É a empresa se posicionar e entender as diferenças, estilos e a forma de trabalhar de cada gênero. Então, quando uma empresa se dispõe a ter mulheres em cargos de gestão, ela está dizendo para o mercado que ela é uma empresa diversa, inclusiva e que ela respeita todos os gêneros e isso traz muitos impactos positivos de atratividade e reputação”, explica a vice-presidente do conselho da ABRH.

Porém, apesar dos bons resultados e vantagens explícitas na contratação de Tanaka, ainda há funcionários e clientes da empresa que resistem a respeitá-la como gestora. “Já percebi tratamento diferenciado por funcionários com mais idade, eles demoram a entender que não foi a idade que me colocou onde estou. Também já notei a confusão de clientes homens em tentar impor uma solicitação que não era viável e precisei respaldar minha decisão com todo embasamento legal pertinente à situação disposta no momento”, fala Janice.

Dona do próprio negócio

Vânia Trindade, 56 anos, é co-fundadora de uma Fintech de Crédito e CEO de um grupo empresarial do ramo de contábeis. Após perder o emprego, sua única fonte de renda foi em 1993, ela decidiu montar seu próprio negócio e buscar a independência financeira. “Eu era atendente bancária, o que enchia meus olhos pois era minha zona de segurança, eu achava. Enfim, eu saí de férias e quando retornei, a agência bancária tinha fechado em Belém e eu, desempregada”, conta a empreendedora. 

“Não estava nos planos empreender naquele momento, mas sem ver outra opção, resolvi fazer daquele limão, uma limonada. Peguei o dinheiro da minha rescisão, mais uma máquina de escrever velha e fui arriscar empreender em contabilidade em uma salinha de três metros quadrados, sozinha”, relembra Vânia.

Ela descreve ainda que teve dificuldades técnicas quando começou a trabalhar por conta própria. “O mercado era muito fechado, não havia internet, os contadores não se relacionavam, não tinha acesso às informações e confesso que em vários momentos pensei em desistir. Mas a persistência precisa estar presente no ato de empreender. Não se aprende, não se cresce, não se ganha autoridade, não se aprimora processos e ideias, e não se alcança uma posição no mercado sem persistência”.

Para chegar onde chegou, os obstáculos foram muitos, porém, ela afirma que nunca ligou para os olhares tortos por simplesmente ser mulher. “Nunca me importei e não ficava prestando atenção. Prova disso é que nunca me deixei abater e sempre procurei driblar os diversos percalços, não me importando se a situação era por uma questão de gênero. Simplesmente fui pra cima”, conta orgulhosa.

Manutenção do emprego

Além da dificuldade de uma funcionária chegar ao cargo de liderança, também existem impasses para a manutenção do emprego. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que mais de 178 mil mulheres perderam seus trabalhos em dezembro de 2022.

Os motivos podem ser muitos, entretanto, as particulares do sexo feminino, como a necessidade de afastamento em licença maternidade, são um dos principais motivos para o público feminino ter dificuldade para manter seus empregos, aponta Iza. "Às vezes as mulheres precisam paralisar as carreiras para cuidar dos filhos, dos pais, da casa ou da família. De fato, isso as colocam em um lugar desigual, quando comparado aos homens com a mesma formação acadêmica e faixa etária”, diz a especialista.

Vânia concorda que esses são pontos que ainda precisam ser superados. “Tradicionalmente, o desafio para mulher no mercado de trabalho é muito maior. Tendo elas filhos ou não, além de darem conta do trabalho empresarial, acabam ficando com a tal jornada tripla, toda a responsabilidade com a casa e ainda toda a parte de cuidados com as crianças”, justifica.

“Mas também temos muito a comemorar porque já rompemos muitas barreiras e a população feminina vem ganhando espaço no mercado, passando a ocupar cargos antes exclusivamente destinados aos homens. Sabemos que são lentas, mas muito importantes”, destaca a empreendedora.

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