MEIs do Pará caem em armadilhas virtuais e perdem dinheiro após abertura do CNPJ
E-mails falsos com valores a pagar confundem empreendedores e dificultam acesso a informações oficiais
A publicitária belenense Karoline Peres, de 24 anos, mal tinha saído de um trabalho temporário em uma agência em 2022 quando começou a receber e-mails com supostas cobranças para regularizar seu Microempreendedor Individual (MEI). Os valores variavam entre R$ 100 e R$ 300. "Era sempre o mesmo remetente, com um site todo bonitinho, bem feito. Eu cliquei, vi que os valores cobrados por email batiam com os que apareciam nesse site falso e paguei. Achei que tinha resolvido", conta.
Mas não resolveu. Meses depois, ela percebeu que a dívida nunca tinha aparecido no sistema oficial, o PGMEI (Programa Gerador de DAS do Microempreendedor Individual), e entendeu que tinha sido vítima de um golpe.
“Caí de novo quando fui abrir um novo MEI. Paguei R$ 200 achando que era obrigatório, mas era golpe de novo. Depois que abri sozinha, percebi que o MEI é gratuito”, lamenta Karoline.
A confusão começou quando a própria agência onde Karoline trabalhava se ofereceu para intermediar a abertura do MEI, colocando o advogado da equipe à disposição para cuidar do processo. Após deixar o projeto, passou a receber e-mails insistentes sobre cobranças e, sem desconfiar da veracidade, chegou a solicitar à agência o valor para quitá-las. “O mais estranho é que ninguém desconfiou. Nem eu, nem quem me enviou o dinheiro para pagar”, conta.
A história dela se repete no Pará. A jornalista Karine Sued, de 32 anos, quase caiu na mesma armadilha. Assim que teve o CNPJ emitido por um contador de confiança, recebeu um e-mail com boleto no valor de R$ 170. “Parecia oficial. Se eu não tivesse mostrado para o contador, teria pago”, relata. Hoje, ela afirma receber esse tipo de mensagem todo mês.
O que mais surpreendeu Karine foi a rapidez e a precisão dos dados contidos na mensagem. Apenas meia hora após a criação do MEI, o e-mail já estava na sua caixa de entrada — com nome completo, CNPJ e até o valor exato para pagamento no mesmo dia. A jornalista, que trabalha como freelancer, reforça a importância de ter alguém de confiança por perto.
“Eu tive o cuidado de perguntar a um profissional da área contábil, mas sei que muita gente não pergunta e acaba pagando”, pontua.
Como os golpistas agem?
Segundo Diego Abreu, especialista em Segurança da Informação e professor da Universidade da Amazônia (UNAMA), a armadilha funciona porque parte dos dados dos MEIs é pública. “Informações como nome, e-mail e atividade econômica estão disponíveis nos portais da Receita Federal e do Simples Nacional. Bots automatizados ficam varrendo esses registros e, assim que surge um novo, um e-mail falso é disparado”, explica.
Além disso, as mensagens costumam conter informações reais, como o CNPJ do usuário, o que aumenta a chance de engano. “O e-mail simula um canal oficial, com endereços parecidos com os do governo, como ‘receita.federal@meigov.br’. E como muitos MEIs não têm intimidade com tecnologia, acabam pagando”, acrescenta.
Como se proteger
O professor Diego recomenda que qualquer cobrança recebida por e-mail seja tratada com desconfiança.
“O governo não envia boletos por e-mail, WhatsApp ou SMS. A única forma segura é acessar diretamente o site oficial, o www.gov.br/mei”, alerta.
Não responder às tentativas de comunicação é uma atitude crucial. “Nunca responda a esses e-mails com informações pessoais, pois isso só alimenta mais fraudes”, orienta o professor. Ferramentas como Gmail e Outlook permitem marcar mensagens como spam e bloquear remetentes.
Para quem não tem facilidade com internet, o especialista recomenda buscar orientação presencial no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). “Eles ajudam na criação, no pagamento e até no encerramento do MEI”, destaca.
“Infelizmente, a transparência no cadastro de MEIs também traz essa vulnerabilidade. O melhor que podemos fazer é informar e educar para evitar novas vítimas”, conclui.
Como denunciar
Segundo a Polícia Civil do Pará (PCPA), os golpes envolvendo MEIs não são contabilizados separadamente nas estatísticas, pois integram o total de estelionatos praticados por meios virtuais. Todos os casos podem ser registrados em qualquer delegacia do estado, além de contar com duas unidades especializadas: a Delegacia Especializada em Investigação de Estelionato e Outras Fraudes (DEOF) e a Diretoria Estadual de Combate a Crimes Cibernéticos (DECCC), responsável por ocorrências no ambiente digital.
A instituição reforça algumas orientações básicas para evitar cair em golpes:
- Desconfie de cobranças inesperadas: sempre confirme diretamente com a instituição antes de qualquer pagamento.
- Não clique em links suspeitos: eles podem levar a sites falsos que roubam seus dados.
- Verifique os dados do boleto: confira CNPJ, razão social e valores antes de pagar.
- Cuidado com pressão para pagar rápido: golpistas usam o senso de urgência para impedir a verificação da cobrança.
Ao perceber que foi vítima de um golpe, a recomendação da PCPA é registrar um boletim de ocorrência. Isso permite que o caso seja devidamente investigado e pode ajudar a prevenir novas fraudes.
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