Inflação em alta altera hábitos de consumo dos paraenses
Para lidar com os preços elevados, consumidores buscam promoções e substituem marcas
Ir ao supermercado tem sido um desafio cada vez maior para os paraenses. O aumento contínuo dos preços faz com que muitos consumidores precisem repensar o que colocar no carrinho, priorizando promoções, cortando itens da lista ou optando por marcas mais baratas. Produtos essenciais como carne, ovos, café, óleo e açúcar vêm tendo altas expressivas, tornando ainda mais difícil equilibrar o orçamento doméstico.
Um levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese/PA), revelou que o preço desses itens subiu significativamente em janeiro, no comparativo com dezembro de 2024. O café, por exemplo, teve um aumento de 9,10%, chegando a custar R$ 54,57 o quilo. A carne bovina também subiu, alcançando R$ 44,21 por quilo. Os ovos também tiveram alta, tornando-se um peso maior no orçamento das famílias. Além disso, o óleo de cozinha subiu 6,33% e o açúcar, 7,39%, dificultando ainda mais a manutenção de uma alimentação equilibrada.
Estratégias para economizar
Para driblar essa realidade, os consumidores têm adotado diferentes estratégias. Ana Cláudia Borba, diretora escolar, conta que tem reduzido ao máximo suas compras no supermercado, pois o salário já não acompanha os preços das mercadorias. Entretanto, mesmo diante da alta dos alimentos, ela evita produtos de qualidade duvidosa. "Dentro das marcas desconhecidas, os produtos que eu não tenho segurança de que vão nos ajudar na boa alimentação, eu não compro", explica. "Infelizmente, são os mais caros que nos dão essa garantia, então tentamos procurar os mais em conta dentro desse grupo".
Além do critério de qualidade, Ana Cláudia também avalia o custo-benefício da localização dos supermercados na hora de abastecer a despensa de casa. "Cada um tem algo mais barato, mas o resto está caro. Então, tem que fazer uma dosagem", explica. "Para mim, é mais tranquilo comprar perto de casa, porque se eu for atrás de promoções distantes, acabo gastando ainda mais, seja com transporte, gasolina etc".
Neida Sirotheau, professora aposentada de 67 anos, também sente no bolso o impacto da inflação e, por isso, busca promoções e pesquisa preços antes de encher o carrinho. "O café, por exemplo, ontem eu deixei de comprar em um supermercado porque estava R$ 15 e eu já tinha visto que em outros lugares ele está por R$ 13, então tento comprar realmente onde está mais barato”, relata.
Na tentativa de economizar, Neida tem substituído alguns produtos. "As frutas subiram e não voltaram mais ao preço normal. Quando uma está muito cara, procuro outras mais baratas, principalmente as que são da nossa região, que às vezes estão com preços melhores do que as importadas", explica.
Por outro lado, há produtos que, mesmo com o aumento, ela continua comprando, por não abrir mão da qualidade. "O leite condensado e o creme de leite, por exemplo, já têm misturas que não têm nada de leite, só sabor artificial", critica. "Tem produtos que estão caros, mas a gente tem que consumir. Pode ser em menor quantidade, mas precisamos manter essa mínima qualidade".
O risco dos ultraprocessados
A alta dos alimentos tem levado muitas famílias a optarem por produtos ultraprocessados, como embutidos e compostos alimentares que imitam ingredientes tradicionais, como as misturas lácteas, bebidas sabor café, cevada, mistura sabor manteiga etc. Everson Costa, técnico e pesquisador do Dieese/PA, explica que o consumo desses produtos cresceu nos últimos meses, apesar da falta de estudos detalhados sobre seu impacto.
"A alimentação sobe de preço para as proteínas normais e saudáveis, e isso empurra a sociedade, sobretudo a de menor renda, para comprar aquilo que é possível. O problema é que, muitas vezes, o que é possível não tem valor nutricional adequado e pode prejudicar a saúde a longo prazo", afirma.
A visão dos supermercados
Jorge Portugal, diretor da Associação Paraense de Supermercados (Aspas), observa que os consumidores estão buscando alternativas para produtos que tiveram aumentos mais expressivos. "A manteiga tem sido substituída por margarina, o leite por composto lácteo. O problema é que esses produtos não têm a mesma qualidade nutricional que os tradicionais", destaca.
Portugal também aponta que alguns itens, como café e azeite, são insubstituíveis para muitos consumidores, então o que ocorre é uma redução no consumo. "Pessoas que tomavam café diariamente passaram a diminuir a quantidade", explica.
Fatores climáticos também influenciam na alta dos preços, como no caso do ovo. "A exportação aumentou devido à gripe aviária que teve em outros países, enquanto a produção caiu por conta das chuvas. Isso reduziu a oferta e elevou o preço", explica.
A inflação tem mudado não apenas os hábitos de consumo, mas também a qualidade da alimentação da população. Com preços elevados e poucas alternativas, muitas famílias enfrentam o desafio de manter uma dieta equilibrada sem comprometer ainda mais o orçamento.