Campanha Fevereiro Roxo amplia debate sobre o lúpus

Doença autoimune e crônica precisa de tratamento precoce para que paciente viva normalmente

Elisa Vaz

O diagnóstico precoce é essencial em diversos quadros clínicos, especialmente nas doenças crônicas, podendo evitar o surgimento de outras enfermidades e estender a vida com mais qualidade. Com o objetivo de conscientizar sobre esta questão, a campanha Fevereiro Roxo amplia o debate sobre o Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES), doença autoimune multissistêmica, ou seja, que pode atingir qualquer parte do corpo.

No Pará, como não há um centro de referência apenas em Lúpus e a enfermidade é tratada em vários hospitais, não há um estudo com o número de casos no Estado. Em todo o país, estima-se que cerca de 65 mil pessoas sejam portadoras da patologia, sendo a maioria mulheres. Mesmo ocorrendo em qualquer idade, é mais frequente por volta dos 30 anos, tendo incidência maior em pessoas de raça negra do que branca.

Segundo a médica reumatologista Roberta Vilela Koyama, que é professora doutora da Universidade do Estado do Pará (Uepa), a forma mais ampla de explicar o Lúpus é dizer que é uma doença autoimune e inflamatória, em que a pessoa produz anticorpos contra ela mesma, então é uma agressão contra o próprio corpo. “O indivíduo tem uma predisposição genética, mas a doença também pode ter relação com os hormônios, por isso é mais frequente em mulheres jovens que estão em idade fértil. Mas são os próprios hormônios do corpo delas, não tem a ver com a ingestão de anticoncepcional, por exemplo”, afirma.

Essa produção de anticorpos geralmente causa inflamações, que podem ocorrer nas articulações, causando dor e inchaço; na pele, criando vermelhidão; na boca, especialmente na área interna; nos rins, com a perda de proteína e podendo até se transformar em uma insuficiência renal; entre outros. Os sintomas mais comuns, que podem ser um alerta para que os pacientes procurem um médico da área, são as febres, cansaço no corpo e dores nas juntas. Para fazer o diagnóstico, além dos sintomas, é necessário que se faça uma série de exames específicos.

Como as inflamações podem acometer qualquer órgão do corpo, o tratamento varia. A intensidade da doença, por exemplo, pode ser maior se o quadro chegar aos rins ou sistema nervoso, se tornando mais grave e evoluindo com mais rapidez. O tratamento é dividido em dois: o medicamentoso, em que a administração dos remédios dependerá do órgão que está acometido - pode ser anti-inflamatório e até imunossupressor em casos mais graves; e o não medicamentoso, quando o paciente passa pelo processo de compreender a doença, o que ela pode causar, a importância do tratamento, e passa a evitar o sol, usar filtro solar, fazer atividades físicas, ter uma alimentação saudável e balanceada, tomar vacinas para prevenir infecções, entre outras ações necessárias.

A importância do tratamento correto se dá na recuperação da normalidade na rotina do paciente. “O Lúpus não tem cura, mas tem tratamento para controlar. Se a pessoa tratar de forma adequada e precoce, consegue ter uma vida normal. Tudo depende do diagnóstico e do tratamento. A doença também pode entrar em remissão, então o tratamento vai depender disso - pode ser leve ou pesado, de acordo com cada pessoa. Não significa que ela vai tomar imunossupressor para sempre, isso nós suspendemos com o tempo. O que sempre precisará tomar é a Hidroxicloroquina, o mais indicado para o tratamento em todos os casos relacionados ao Lúpus”, orienta a médica reumatologista.

Quanto ao panorama geral do Estado, Roberta afirma que o combate ao Lúpus tem evoluído muito. Antes, não existia medicação, e hoje há várias, segundo a doutora. Ela diz que os pesquisadores têm descoberto cada vez mais estratégias para melhorar esse tratamento, e todo ano surgem medicamentos novos. A conscientização da população, para ela, é um desafio. “Há muita dificuldade na saúde pública; as pessoas que dependem disso, geralmente, têm quadros mais graves porque demoraram mais a ter o diagnóstico e o tratamento. Se o acesso à saúde fosse melhor, talvez teríamos menos casos graves”, pontua a médica.

A presidente da Sociedade Paraense de Reumatologia, Louise Bedahan, concorda. Como explica a especialista, uma das maiores dificuldades hoje no Pará é o acesso às consultas regulares. Antes, o hospital especializado em tratamento de Lúpus era a Santa Casa, mas hoje não há um centro de referência no Estado. Com isso, os atendimentos ficam descentralizados. O principal hospital, atualmente, é o Jean Bitar, ligado ao governo estadual, mas também há atendimentos na Santa Casa e no Barros Barreto, de maneira menos efetiva, por conta da quantidade de consultas disponibilizadas. Há ainda o Centro Integrado de Inclusão e Reabilitação (Ciir) e a Unidade de Referência Especializada (Ures), que fica na avenida Visconde de Souza Franco, a Doca.

Com a falta de um centro de referência, as dificuldades aumentam. “A demanda é muito grande, muita gente vem do interior do Estado. Nosso maior número de reumatologistas ainda fica na capital, então muitos pacientes de interiores mais distantes têm dificuldade de acesso. Ultimamente, há mais vagas e mais disponibilidade de acesso, estamos melhorando, mas ainda não é um cenário ideal, nem para as primeiras consultas e nem para o retorno. Também temos dificuldade na adequação do tratamento, há pacientes que ainda ficam um tempo sem consultas. O ideal seria a cada três meses, mas às vezes passa disso. É um cenário difícil para uma doença tão grave”, analisa a presidente da Sociedade.

Outro desafio é quanto ao acesso à medicação necessária para o tratamento do Lúpus. Como são remédios caros, há um acesso limitado, e muitos pacientes precisam do medicamento por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa), e, em muitos casos, faltam remédios para a população. Além disso, há muita burocracia, e os pacientes do interior precisam vir até a capital para buscar seus remédios.

Ainda de acordo com Louise Bedahan, a entidade vem tentando retomar alguns projetos que incentivem a maior conscientização da sociedade quanto às doenças reumatológicas, já que, em muitos casos, as pessoas tendem a procurar ortopedistas para tratar esses quadros. Ela conta que há algumas parcerias com empresas, para fazer campanhas sobre o Lúpus e outras doenças da área de reumatologia. “É algo bem inicial. No Estado, temos associações, mas não são muito fortes, isso dificulta o acesso da sociedade a esse conhecimento. Temos um projeto para divulgar um site com informações sobre doenças reumatológicas, suas características e quais médicos devem ser procurados. Deve entrar no ar no fim de abril”, adianta.

Confira algumas características do Lúpus

- Doença inflamatória crônica

- É autoimune         

- Pode progredir de forma lenta ou rápida

- Acomete vários órgãos

- Os sintomas dependem dos órgãos acometidos

- A intensidade varia, assim como o tratamento

- A origem pode ser genética, hormonal e ambiental

- Tem períodos de atividade e de remissão

Saiba quais são os principais sintomas da doença:

- Gerais: cansaço, desânimo, febre baixa, emagrecimento, perda de apetite

- Pele: manchas avermelhadas, denominadas lesões em asa de borboleta; lesões discoides, bem delimitadas e podem deixar cicatrizes; vasculite; sensibilidade à luz solar; alopecia ou queda de cabelos.

- Articulares: artralgia, com ou sem artrite (inchaço nas juntas) em mãos, punhos, joelhos e pés, e tendinites.

- Inflamação das membranas: que recobrem o pulmão (pleurite) e coração (pericardite), leves e assintomáticas, ou se manifestando como dor no peito, falta de ar, tosse seca, palpitações.

- Rins: pode ocorrer nefrite ou apresentar sintomas como edema em membros inferiores, perda de proteínas na urina, hipertensão arterial. Nesse caso, quando não tratada rápida e adequadamente, pode levar à insuficiência renal.

- Alterações neuropsiquiátricas: convulsões, alterações de humor ou comportamentos, depressão, alterações no sistema nervoso periférico e da medula espinhal.

- Sangue: anemia, leucopenia ou linfopenia, e plaquetopenia.

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