Economia global vive temor de nova recessão
Alta dos preços e crescimento fraco marcam primeiro semestre nas maiores potências econômicas do mundo
As projeções recentes dos indicadores das principais economias mundiais colocaram o mercado em alerta para a alta contínua da inflação em vários países e o risco de recessão global. Na quinta-feira, 28, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos divulgou que o Produto Interno Bruto (PIB) do país teve uma retração de 0,9% no segundo trimestre, que soma-se ao recuo de 1,6% registrado nos três primeiros meses do ano.
Ao mesmo tempo, o país enfrenta a maior taxa de inflação dos últimos 40 anos, chegando a marca de 9,1% ao ano. Para conter essa elevação, o Federal Reserve anunciou também nesta semana a quarta alta consecutiva da taxa básica de juros. Desta vez, o banco central americano elevou em 0,75% o índice fixando um intervalo de 2,25% a 2,5% ao ano. Os índices tem preocupado a equipe econômica do presidente Joe Biden, que assumiu a gestão do país em janeiro do ano passado.
Em outras economias relevantes o cenário também não é favorável. Na China, do presidente Xi Jinping, por exemplo, o segundo trimestre de 2022 registrou uma desaceleração acentuada no PIB, com variação positiva de apenas 0,4%, enquanto nos três meses anteriores o crescimento foi de 4,8%. O desempenho fraco remonta à queda de 6,8% que o país teve no primeiro trimestre de 2020 durante a primeira onda de covid-19. Dessa vez, a pandemia refletiu novamente nos indicadores econômicos, já que, entre março e abril, as principais cidades chinesas passaram por lockdowns totais ou parciais. Em Xangai, o PIB teve uma contração de 13,7%, enquanto a produção reduziu 2,9% em Pequim.
Já na Europa, a Alemanha tem hoje níveis de inflação equiparáveis aos da crise do petróleo na década de 1970. De acordo com o Departamento Alemão de Estatísticas (Destatis), o índice de preços ao consumidor saltou de 5,1% em fevereiro para 7,3% em março, logo após a invasão russa na Ucrânia, refletindo o aumento dos preços de energia no continente. O impacto da crise elevou a inflação para 8,7% em maio, mas em junho, uma série de medidas governamentais tenta conter o ritmo de altas dos combustíveis. Apesar disso, em julho o índice fechou em 8,5%. O primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, anunciou que o país vai voltar a repassar os altos custos de energia para os consumidores entre setembro e outubro.
A alta inflacionária é hoje uma tendência nos países da zona do euro. Segundo informações da Eurostat, agência de estatísticas europeia, divulgados na sexta-feira, 29, o índice subiu para 8,9% em julho no comparativo com o mesmo período do ano passado. Quanto ao crescimento do PIB, os países do bloco tiveram uma ligeira recuperação no segundo trimestre, com aumento de 0,7% nesse período ante 0,5% dos três primeiros meses.
Argentina reestrutura governo para enfrentar crise
No cenário latino-americano, a situação que mais chama atenção é da Argentina. Diante de uma crise socioeconômica, com registros de inflação acumulada de 64% nos últimos 12 meses, déficit fiscal e desvalorização do peso argentino, protestos tem pressionado o governo por auxílios e aumentos salariais. Para melhorar o cenário, o país, que tem uma dívida de mais de U$ 44 bilhões, se reuniu com o Fundo Monetário Internacional (FMI) em busca de novos acordos.
A missão de melhorar a economia agora está a cargo de Sergio Massa, presidente da Câmara dos Deputados, que assumiu o Ministério da Economia em substituição a Silvina Batakis que ocupou o posto por apenas 24 dias. Com status de “superministro”, Massa vai comandar em conjunto as pastas de economia, desenvolvimento produtivo e agricultura, gado e pesca, além de articular as relações com órgãos internacionais e de crédito.
A nomeação de Massa foi uma medida tomada pelo presidente argentino, Alberto Fernández, que anunciou nesta semana uma reestruturação ministerial para tentar reverter a crise política do país, que gerou uma profunda falta de confiança da sociedade e dos mercados.
Brasil tem tido resultados melhores no cenário global
Na contramão deste movimento, o Boletim Focus, divulgado pelo Banco Central (BC), indica inflação menor e crescimento maior do PIB para o Brasil em 2022. A expectativa é que a geração de riquezas tenha alta de 1,93%, superior à previsão de 1,75% da semana passada. Além disso, os analistas do mercado financeiro preveem que a inflação será de 7,30% ante os 7,54% projetados anteriormente. No mesmo sentido, o FMI reviu de 0,8% para 1,7% a estimativa de crescimento da economia.
Aliado a isso, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou na última sexta-feira que a taxa de desemprego no país teve um recuo de 1,8% entre os dois trimestres desse ano, passando de 11,1% para 9,3%. Em números, são atualmente 10,1 milhões de desempregados contra os 12 milhões do trimestre anterior, o que representa uma queda de 15,6%. O índice de desemprego é o menor desde 2015.
Para o economista Nélio Bordalo Filho, os sinais emitidos pelos governos e os mercados merecem a devida atenção. Ele lembra que, no caso dos Estados Unidos, a administração de Joe Biden nega uma recessão devido aos bons níveis de empregabilidade e da elevação do consumo. Por outro lado, diminuiu o volume de aquisições de imóveis, os estados contiveram suas despesas e o consumo está muito influenciado pelo reajuste de preços no setor de serviços. Nesse cenário, Bordalo avalia que há uma real possibilidade de que a economia estadunidense se contraia, bem como de que a guerra entre Rússia e Ucrânia e a pandemia contribuam para mais instabilidade a nível mundial.
“O aumento e a persistência da inflação de vários países têm levado ajustes na política monetária pelos seus governos. A escassez de oferta de produtos, principalmente os relacionados com alimentos, devido à guerra pressiona a inflação, além de trazer dificuldades de suprimentos para as indústrias”, diz Nélio Bordalo, que reitera: “com todo esse cenário desfavorável, é possível um risco de recessão global, que pode ser acelerada com o prolongamento da guerra Rússia X Ucrânia”.
Em relação ao Brasil, o economista considera que as projeções favoráveis estão de acordo com o desempenho do país no primeiro semestre. “Certamente, o FMI analisou o cenário positivo a economia brasileira, principalmente na redução dos níveis de desemprego, não ocorreram desabastecimentos significativos de produtos para as indústrias e população em geral, elevação das exportações brasileiras movimentada pelo agronegócio, sensível mais gradual retomada da economia do país, e principalmente pelas ações do governo federal em desacelerar o crescimento da inflação”, analisa.
Crise internacional afeta exportações paraenses
Os indicadores positivos do Brasil até então contam com uma contribuição importante do Estado do Pará. Nélio Bordalo destaca que o Estado figura na quinta posição entre os maiores exportadores brasileiros, com participação de 6,61% na balança comercial nacional.
Para ele, caso as projeções do FMI se confirmem, os benefícios tendem a se espraiar por todos os setores tanto em nível local, quanto nacional. “Os reflexos positivos na economia do Estado do Pará geram reflexos para os consumidores e população através de redução de preços de produtos, maior oferta de produtos no mercado, mais oportunidades de empregos e melhoria na renda, o que resulta em melhoria no consumo das famílias”, esclarece o economista.
Porém, os efeitos de uma desaceleração econômica mundial já são sentidos nos principais segmentos da pauta exportadora paraense. Cassandra Lobato, coordenadora do Centro Internacional de Negócios, da Federação das Indústrias do Estado do Pará (CIN/FIEPA), diz que o setor produtivo observa com preocupação a queda de 39,73% na exportação de minério detectada no primeiro semestre.
A atenção se deve ao fato de que só a exportação de minério de ferro é responsável por uma receita de U$ 6 bilhões ao Estado. Outro fator complicar é que os diversos tipos de minérios respondem por 82% da pauta paraense. “A China e os Estados Unidos são nossos principais compradores, somando a participação deles chega a 72% da pauta paraense. Há uma preocupação, porém a gente sabe que são países que tem uma segurança financeira muito grande, mas de qualquer forma isso acende o sinal de alerta para os exportadores, principalmente o risco de recessão”, afirma Cassandra Lobato.
Apesar dessa retração, a balança comercial do Pará apresenta alguns resultados positivos. De janeiro a junho deste ano, a exportação de madeira cresceu 105%, a carne bovina subiu 52,65%, a soja teve incremento de 71% e o cacau de 362%. Para a coordenadora do CIN, isso é reflexo de um esforço dos empreendedores locais para diversificar seus produtos e compradores, o que pode garantir melhor desempenho para a economia mesmo diante das incertezas provocadas pelas eleições e o temor geral de crise econômica.
“Temos que aguardar com paciência a reabertura e o reaquecimento dessa economia. Eu sou otimista, acredito numa retomada até porque a China precisa muito do nosso produto por conta da indústria siderúrgica e da construção civil. Nesse momento, a questão é ir atrás de diversificar mais e de levar nossos produtos a novos mercados”, frisa Cassandra Lobato, destacando que mesmo em cenários adversos, a economia paraense se mostrou resiliente e tem potencial para se recuperar a médio prazo.
Brasil sobe em ranking global de gasolina mais barata
As notícias sobre desaquecimento da economia tem impactado também o mercado de combustíveis, que acaba sendo um importante fator na composição da inflação em diferentes países. De acordo com levantamento do site Infomoney, com a forte queda no preço da gasolina e a valorização do dólar, o Brasil subiu para a 41ª posição em um ranking que compara o valor do combustível em 168 países e territórios. Em março, antes da redução do ICMS e quedas do preço anunciadas pela Petrobras, o país ocupava a 115 posição.
No Brasil, o preço médio da gasolina caiu de R$ 7,39 o litro no fim do mês passado para R$ 5,89, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Segundo o ranking da globalpetrolprices.com, com um dólar a R$ 5,34, o preço da gasolina brasileira considerado foi de US$ 1,10 por litro — o que fez o país subir para a 41ª posição.
No levantamento, o Brasil possui gasolina mais barata que os Estados Unidos, que parecem na 51 primeira posição, com valor médio de US$ 1,22 ( ou R$ 6,50 na conversão). A Alemanha também possui gasolina mais cara, ocupando a posição 123 do ranking. No país, a gasolina custa em média US$1,77, ou R$9,47, se feita a conversão em real. No Reino Unido, que também sofre com o impacto na Rússia, o valor é ainda maior: US$2,24 ou R$11,99, deixando o país na posição 160 da lista. Na comparação com outros países, o Brasil ainda está abaixo da Argentina, que mesmo com crise financeira, está dez posições no ranking acima do Brasil (31). No país vizinho, a gasolina custa, em média, US$ 0,97 – o equivalente a R$5,23. Entre os países dos Brics, o Brasil está bem atrás da Rússia, na 25 posição (R$ 4,58 ou US$ 0,86) – uma das potências energéticas do mundo – e à frente dos demais, como Índia, na 65 posição, com valor médio de R$ 6,97 ou US$ 1,30, China na 80 colocação, com gasolina custando em média R$ 7,44 ou US$ 1,39 e da África do Sul, que ocupa a 100 posição, com valor médio da gasolina em R$ 8,33 ou US$ 1,56.
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