Arco Norte: logística do Pará terá investimentos bilionários para atender maior safra de grãos
A CDP negocia o aporte de R$ 300 milhões em duas áreas de Santarém e de R$ 750 milhões em Barcarena, para a operação portuária
A expectativa de que a safra de grãos em 2024/2025 seja a maior da história, com uma alta de 9,4% prevista em relação à temporada anterior, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), deve gerar investimentos bilionários em rodovias, ferrovias, portos e hidrovias do Pará. Com a concentração dos aportes no Arco Norte, que abrange as regiões Centro-Oeste e Norte, deve circular pelas rodovias que cruzam o Estado cerca de 31 milhões de toneladas da produção, como estima o Ministério dos Transportes.
O chamado Arco Norte compreende eixos de transporte que levam a portos situados acima do paralelo 16° S, uma linha geográfica que "corta" o Brasil ao meio. O empreendimento é importante porque gera economia aos produtores brasileiros no transporte da mercadoria, com escoamento pelos portos mais próximos dos locais de produção.
De toda a exportação nacional de milho e soja em 2024, foi escoado pelos portos do Arco Norte 38,14% da quantidade total vendida pelo país entre janeiro e dezembro, contra participação de 36,54% no ano anterior, como aponta o Boletim Logístico da Conab. Porém, para que a opção pelo Arco Norte continue se tornando atraente, é necessária não apenas a melhoria da infraestrutura portuária, mas também das diversas vias de transporte que levam aos portos, em seus diferentes modais – rodoviário, ferroviário e hidroviário.
Investimentos
O Grupo Liberal entrou em contato com o Ministério dos Transportes para saber mais detalhes dos investimentos, mas, até o fechamento desta matéria, não obteve retorno. Informações públicas dão conta de que os aportes por parte do governo federal, previstos para as rodovias BR-163, BR-155 e BR-158, ainda não serão feitos neste ano, porém, os valores constam no orçamento de 2025, embora ele ainda não tenha sido aprovado pelo Congresso Nacional.
Por meio do Ministério de Portos e Aeroportos, o governo federal também estima R$ 1,7 bilhão em investimentos públicos em portos no ano de 2025. O Porto de Santarém está entre os principais portos do país para o escoamento de grãos e fertilizantes. Já nas hidrovias, os investimentos somam R$ 946 milhões em três obras, incluindo o Pedral do Lourenço. A Pasta também não deu retorno ao Grupo Liberal.
Também está em fase de negociação, segundo o diretor-presidente da Companhia das Docas do Pará (CDP), Jardel Silva, o aporte de R$ 300 milhões em duas áreas de Santarém e de R$ 750 milhões em Barcarena, para a operação portuária. “Se as negociações em Santarém avançarem, devemos receber R$ 300 milhões. Em Barcarena, também estamos bem avançados, já fizemos consultas públicas e está em análise pelo Tribunal de Contas da União (TCU) um arrendamento que prevê investimentos de 750 milhões. Os dois são para movimentação de grãos”, enfatizou.
A nível estadual, o governo do Pará, por meio da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Transportes (Seinfra), informou à reportagem que, desde 2019, vem investindo na construção de rodovias e pontes, com o objetivo de garantir a mobilidade e o desenvolvimento na região. “Com mais de 2 mil quilômetros de rodovias asfaltadas e 300 pontes entregues, o governo garante segurança e rapidez ao escoamento de produtos agrícolas, minério e gado. A meta é atingir 4 mil quilômetros de rodovias pavimentadas até 2026”, detalhou a Pasta.
Ainda segundo a administração estadual, mais de 30 rodovias estaduais já foram entregues pelo governo do Estado desde o início da atual gestão. Entre elas estão a PA-370, Transuruará, com 150 quilômetros, ligando Santarém e seus portos às regiões do Baixo Amazonas e Xingu; e a PA-256, trecho que integra Paragominas a Tailândia, uma das vias mais extensas do Pará, com 364 quilômetros.
O governo também destaca a “Perna Leste”, entregue em 2024 e localizada entre os municípios de Acará e Bujaru, nas regiões de Integração Tocantins e Rio Capim. A via está interligada ao Complexo da Alça Viária (PA-483), beneficiando municípios como Acará, Bujaru, Concórdia do Pará e Tomé-Açu. Outra obra em andamento é a duplicação da PA-481, que leva até o Porto de Barcarena, com 12,7 quilômetros de extensão, ligando o entroncamento da PA-483 (Trevo da Peteca) ao Rio Itaporanga.
“Todos esses investimentos fazem parte de uma visão estratégica do governo, que iniciou o mandato com apenas 40% das rodovias asfaltadas e, atualmente, está com 70% dos cerca de 7.700 quilômetros pavimentados, melhorando a qualidade de vida da população, que tem mais segurança e diminui seu tempo de deslocamento, gerando emprego, renda e fomentando o desenvolvimento no Estado”, destacou o governo estadual.
Maior safra da história
Como a Conab divulgou, os produtores brasileiros devem colher 325,7 milhões de toneladas de grãos na safra 2024/2025, um crescimento de 9,4% em relação à temporada anterior. Esse resultado, segundo a entidade, é reflexo de um aumento de 2,1% na área cultivada, estimada em 81,6 milhões de hectares, e na recuperação de 7,1% na produtividade média das lavouras, prevista para 3,99 mil quilos por hectare.
A companhia aponta, por exemplo, para um aumento na produção total de milho, com expectativa de chegar a 122 milhões de toneladas, alta de 5,5% sobre a colheita no ciclo anterior. Projeta ainda crescimento de 2,4% para a área de plantio, refletindo em uma produção de 96 milhões de toneladas, crescimento de 6,4%. A soja também deve ser destaque. Com 14,8% da área já colhida, a expectativa é de que a produção da oleaginosa alcance 166 milhões de toneladas, 18,3 milhões acima do total produzido na safra anterior.
Já a área destinada para o arroz deve atingir 1,7 milhão de hectares, 6,4% superior à área cultivada na safra anterior. A Conab estima que a produção chegue a 11,8 milhões de toneladas, alta de 11,4%, se comparada com a colheita da safra passada. Para o feijão, a companhia espera um maior volume colhido em 2024/2025, com as três safras da leguminosa chegando a 3,3 milhões de toneladas. Há outros produtos que devem ser destaque neste ano.
Para o diretor-presidente da CDP, Jardel Silva, é motivo de comemoração o fato de que, todos os anos, há uma crescente na movimentação de grãos no Estado. “Os portos estão preparados, o desafio da infraestrutura e logística é sempre iminente, sempre que aumenta o volume temos que nos preocupar, mas, até o momento, a gente estima que a estrutura está preparada para receber uma safra maior”, pontuou o representante.
Gargalos na infraestrutura
No entanto, para dar conta do aumento de colheita, mais investimentos são necessários. O presidente da Associação dos Produtores de Soja do Estado do Pará (Aprosoja-PA), Vanderlei Ataídes, discorda de que a região esteja preparada. Segundo ele, na época em que se criou as primeiras concessões de portos no Pará, o Estado ainda era uma “criança” na produção de grãos, o que já mudou - há a possibilidade de colher quase 4 milhões de toneladas de soja em breve.
“Nós já estamos sem espaço para colocar a soja do Pará nos portos de Barcarena. Há uma grande reclamação por parte das empresas, que não têm espaço. A CDP tem que, urgentemente, leiloar espaços. Parte da região sul do Pará iria para São Luís, mas, ultimamente, está descendo para Barcarena”, explicou o produtor. Da mesma forma, segundo ele, o Porto de Santarém atua em sua capacidade máxima.
“E surgiu um novo agravante. A produção que for do Pará e entrar no Maranhão terá cobrança de imposto, isso vai forçar que as comercializações sejam todas direcionadas a Barcarena, e parte do Mato Grosso também vai ser canalizado aqui. Precisamos de investimento. A produção do Maranhão está crescendo, a nossa também, e não estamos tendo a velocidade de oferta de portos como está crescendo o agronegócio no Brasil”, complementou.
Há ainda obstáculos na questão ambiental, de acordo com o diretor-presidente da CDP, Jardel Silva. A ideia do setor, disse ele, é gerar desenvolvimento econômico ao mesmo tempo em que se reduz o impacto ambiental. Um dos projetos regionais que costuma esbarrar em discussões ambientais é o derrocamento do Pedral do Lourenço, uma formação rochosa localizada entre os municípios de Marabá e Tucuruí e que impacta a navegabilidade da bacia Tocantins-Araguaia.
“Há quase uma década o projeto está parado, é muito tempo aguardando licenciamento, e é uma obra importante para a infraestrutura local. A gente tem visto a sensibilidade do governo em trabalhar para liberar essa licença e o apelo do governador Helder para que a gente veja isso o mais rápido possível”, comentou.
O presidente da Aprosoja-PA, Vanderlei Ataídes, o derrocamento poderia reduzir muitos custos. “Isso é um sonho antigo. A situação já poderia ter sido resolvida. Se nós resolvermos a questão do Pedral, trazemos os caminhões só até Marabá, e isso alivia o sofrimento de muita gente que faz uso das estradas”, opinou. Para ele, esta seria uma forma de aumentar o potencial de escoamento de grãos no Pará e reduzir custos para os produtores.
Impactos econômicos
A melhoria da infraestrutura logística no Estado contribui para a maior integração regional, geração de oportunidades e atração de investimentos, na avaliação do economista Sérgio Melo, doutor em economia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Ele afirmou que a região Norte é marcada por grandes entraves no deslocamento de pessoas e mercadorias, e daí a importância constante de planejamento e sustentabilidade nessas ações.
Segundo ele, o crescente protagonismo do Arco Norte no escoamento da produção agrícola reflete a posição estratégica dos portos da região, que estão mais próximos das áreas produtoras do Centro-Oeste do Brasil. “Esse avanço tem sido impulsionado por investimentos em infraestrutura logística nos últimos anos, como a melhoria da rodovia Cuiabá-Santarém”, comentou.
É certo que a economia do Pará será acionada para a provisão de comércio e serviços que giram em torno da dinâmica de escoamento, trazendo resultados benéficos para o Estado. “Potencialmente, várias atividades podem se beneficiar da modernização da infraestrutura gerada, principalmente aquelas de localização próxima às rodovias e portos criados e aprimorados”.
Com a maior circulação de pessoas e mercadorias, Sérgio detalhou que o turismo, comércio de produtos essenciais e serviços automotivos, são algumas das atividades diretamente beneficiadas. Indiretamente, novos negócios da sociobiodiversidade também podem surgir. E processamento e fabricação de produtos alimentícios, feiras de economia solidária, produtos do artesanato, fabricação de medicamentos naturais, entre outras atividades, podem se beneficiar.
O doutor em economia pontuou ainda que os investimentos em infraestrutura levam à geração de empregos durante a construção das estruturas planejadas e, posteriormente, produzem maior integração intra e interregional, por reduzir os custos de transporte, aumentando a circulação de pessoas e mercadorias, além de aumentarem a arrecadação do Estado.
Principais portos exportadores de milho (toneladas)
Janeiro a dezembro de 2023
- Arco Norte: 23.260.224 (41,6%)
- Santos: 21.350.536 (38,2%)
- Paranaguá: 4.242.885 (7,6%)
- Vitória: 414.213 (0,7%)
- São Francisco do Sul: 4.568.606 (8,2%)
- Rio Grande: 598.059 (1,1%)
- Imbituba: 528.646 (0,9%)
- Outros: 934.874 (1,7%)
- Total: 55.898.042
Janeiro a dezembro de 2024
- Arco Norte: 18.454.988 (46,4%)
- Santos: 16.701.153 (42%)
- Paranaguá: 1.244.537 (3,1%)
- Vitória: 409.505 (1%)
- São Francisco do Sul: 2.395.552 (6%)
- Rio Grande: 76.127 (0,2%)
- Imbituba: 0 (0%)
- Outros: 501.306 (1,3%)
- Total: 39.783.168
Principais portos exportadores de soja (toneladas)
Janeiro a dezembro de 2023
- Arco Norte: 34.392.398 (33,8%)
- Santos: 30.560.637 (30%)
- Paranaguá: 14.314.237 (14,1%)
- Rio Grande: 10.467.891 (10,3%)
- São Francisco do Sul: 5.031.110 (4,9%)
- Vitória: 4.130.754 (4,1%)
- Outros: 2.972.863 (2,9%)
- Total: 101.869.890
Janeiro a dezembro de 2024
- Arco Norte: 34.408.983 (34,8%)
- Santos: 27.961.080 (28,3%)
- Paranaguá: 13.721.397 (13,9%)
- Rio Grande: 10.793.863 (10,9%)
- São Francisco do Sul: 6.942.565 (7%)
- Vitória: 3.871.093 (3,9%)
- Outros: 1.113.942 (1,1%)
- Total: 98.812.923
Fonte: Conab