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“Conclave”: o que é fato e o que é ficção no filme vencedor do Oscar?

Longa vencedor do Oscar revela os bastidores da escolha de um novo papa, equilibrando fatos históricos com licenças criativas para contar uma história de poder, fé e segredos.

Thaline Silva

Vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Adaptado, Conclave (2024) trouxe uma nova onda de curiosidade sobre os bastidores da escolha de um novo papa. Baseado no livro de mesmo nome escrito por Robert Harris, o longa mistura eventos reais com elementos ficcionais para criar uma narrativa intensa, envolvente e, em certos momentos, surpreendente. Mas o que, afinal, é historicamente precis e o que foi inventado apenas para dar mais emoção ao enredo?

O que o filme retrata com fidelidade

1.  Procedimento do conclave

A sequência do conclave mostrada no filme segue os ritos tradicionais da Igreja Católica. De fato, os cardeais se reúnem na Capela Sistina, entregam seus votos em cédulas de papel e aguardam o resultado sinalizado pela fumaça que sai da chaminé — preta quando não há decisão, branca quando um novo papa é escolhido. O isolamento dos cardeais durante o processo também é real. Segundo o professor Piotr H. Kosicki, da Universidade de Maryland, todos os rituais no Vaticano são conduzidos exclusivamente “em italiano ou latim. Ponto.”

2. Disputas internas na Igreja 

O filme acerta ao mostrar a Igreja como um espaço de tensão ideológica. Conflitos entre alas conservadoras e progressistas são comuns, especialmente em momentos de escolha de um novo líder espiritual. O reverendo Thomas Reese, em entrevista à rádio americana NPR, comentou que “mesmo entre aqueles com boa vontade e desejo de fazer o melhor pela Igreja, os desentendimentos existem. Isso é humano e normal.

3. Atmosfera de mistério e recolhimento

Outro ponto acertado pela produção é o clima introspectivo e solene que envolve o conclave. Silêncio, orações e um ambiente de ritualismo marcam esse momento histórico. O filme traduz bem esse sentimento, criando uma atmosfera que respeita a tradição e, ao mesmo tempo, sustenta a tensão narrativa.

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O que é invenção para fins dramáticos

1. Cardeal “in pectore” dentro do conclave

Um dos pontos mais comentados do filme é a presença de um cardeal secreto no processo de votação. Na trama, ele aparece inesperadamente, levantando questões sobre sua legitimidade. Na realidade, isso não seria possível. O papa pode, sim, nomear cardeais “in pectore” — ou seja, em segredo — por razões políticas ou de segurança. No entanto, esse nome precisa ser revelado publicamente antes da morte do pontífice. Como isso não ocorre na narrativa de Conclave, esse detalhe é pura licença poética.

2. Reviravoltas cinematográficas

Como todo bom thriller, o filme aposta em grandes viradas. Segredos do passado vêm à tona, alianças improváveis se formam, tensões pessoais entre cardeais se intensificam — e até ameaças físicas entram em cena. Nada disso faz parte do processo real do conclave, que, embora seja cercado de tensão, não inclui confrontos dramáticos ao estilo hollywoodiano. Essas escolhas servem apenas para dar ritmo e impacto à história.

No fim das contas, 'Conclave' não se propõe a ser um documentário. Seu mérito está justamente em conseguir manter o respeito pela tradição católica enquanto cria uma ficção envolvente. O filme funciona como um lembrete de que, por trás de instituições milenares, há pessoas com dúvidas, desejos e contradições — ingredientes perfeitos para uma boa história.

(*Thaline Silva, estagiária de jornalismo, sob supervisão de Mirelly Pires, editora web de OLiberal.com)

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