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Pedro Veriano: um desbravador do cinema e da história

Leia o texto do professor e pesquisador Relivaldo Pinho, escrito especialmente para O Liberal.

Relivaldo Pinho (especial para O Liberal)
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Nenhum trabalho sobre o cinema paraense foi mais importante em termos históricos do que o de Pedro Veriano. Há mais de 20 anos, quando consegui o livro “A crítica de cinema em Belém”, publicação que ele coordenou em 1983, aquela obra foi a verdadeira desbravadora sobre o cinema no Estado.

Seu legado como crítico, pesquisador, historiador e exibidor permanecerá, como devem permanecer o pioneirismo daqueles que abrem caminhos para que outros possam neles seguir em suas próprias trilhas.

Veriano, como fazia questão de enfatizar, não era um historiador clássico que se prendia a um memorialismo ortodoxo, mas alimentava suas pesquisas com informações coletadas por depoimentos, jornais e sua própria lembrança.

Sua própria lembrança, porque Veriano foi um daqueles casos nos quais o sujeito escreve a história do qual foi protagonista, no seu caso, em pelos menos dois elos da cadeia cinematográfica, como produtor e como exibidor.

Entre suas experiências cinematográficos estão os filmes “A visita” (1952) e o filme “Brinquedo perdido”, de 1962, que narra a história de um garoto, vendedor ambulante, que caminha pelas ruas de Belém conduzindo um carrinho de brinquedo.

Desde cedo, sua experiência com o cinema o empurrou também para a exibição de filmes que fazia, ainda menino, na garagem da sua casa para os vizinhos.

Uma imagem que, ao lermos em um de seus livros, o médico Pedro Veriano nos transporta para o garoto de “Cinema paradiso” (1990).

Seu Paradiso era o seu Cine Bandeirante, o espaço que iria abrigar, posteriormente, também as exibições prévias do primeiro cineclube de Belém, “Os espectadores”.

O cineclubismo estava em voga e na década de 1960 é fundada a Associação Paraense de Críticos Cinematográficos (APCC) que Veriano iria dirigir a partir de 1967, juntamente com o cineclube da entidade.

O papel dos cineclubes na divulgação de filmes fora do circuito comercial e na formação de espectadores, que mais tarde iriam se tornar produtores, foi fundamental.

Surgiria, como eco dessa atividade da qual Veriano foi um dos maiores incentivadores, a geração que produziu em bitolas 8 e 16 mm em Belém.

Além do seu Bandeirantes, ele iria programar outras salas e participar de outras produções estrangeiras. Mas é seu trabalho de crítico que é um dos destaques de sua longa e produtiva jornada.

Antes de se tornar um crítico, assumindo a coluna de Acyr Castro em A província do Pará, em 1966, e seguindo por anos escrevendo sobre cinema nos mais diversos jornais, Veriano iria utilizar o espaço de Acyr no jornal para travar uma polêmica em 1963.

Tratava-se do seu “calcanhar de aquiles”, o filme “A felicidade não se compra” (“It's a Wonderful Life”), de 1946, de Frank Capra. A polêmica se deu com o também “cinemaníaco” Arnaldo Prado Júnior.

Dentre outras observações, Arnaldo diria que o filme não escapava de um estilo esquematizado e até piegas. Veriano responderia: “Capra não fez um filme realista. ‘It's a Wonderful Life’ é uma utopia. Justifica-se, portanto, o final e as situações que o crítico achou ‘esquematizadas e até piegas’”.

Era outra época. Um tempo no qual a crítica ainda detinha o manto da autoridade, ainda parte dela não sucumbia ao tilintar das moedas, ou, como em tempos de internet, não se curvava diante das curtidas aos textos escritos por cinéfilos de super-heróis.

Naquele período, é provável que como conhecedor e divulgador dos vários aspectos que envolvem a sétima arte, somente Acyr Castro tenha sido tão presente e influente como Veriano.

Mas eram estilos diferentes. Veriano traria para o cinema a história do cinema feito na região, da região, de parte de sua experiência comercial, dos cineclubes, da exibição e da crítica.

Na abordagem desses temas, além do livro “A crítica de cinema em Belém”, completariam a tríade o influente “Cinema no tucupi” (1999) e “Fazendo fitas: memórias do cinema paraense” (2006). Todos deveriam merecer reedição cuidadosa, mesmo que de forma digital.

Esse sentido da história é uma de suas principais contribuições na área do cinema. Em seu primeiro livro, ele traduziria essa ideia dizendo que queria “crer numa investigação paralela à produção de filmes ‘amazônicos’ através do conhecimento de como o cinema era visto no meio”.

De algum modo (marquei esse trecho no livro) essa proposição se refletiu no trabalho que desenvolvemos em 2004 no livro “Cinema na Amazônia: textos sobre exibição, produção e filmes”.

Exatamente porque nesse livro, dentre outras contribuições, tivemos a feliz participação de Pedro Veriano escrevendo textos contextualizados a partir de imagens da pesquisa que realizamos. Foi surpreendentemente revelador termos algumas das primeiras imagens e textos sobe alguns dos principais cinemas de Belém.

A contribuição de Veriano ao cinema e ao cinema da Amazônia deve permanecer porque é pioneira e tirou o véu do esquecimento sobre o cinema no Pará.

Veriano foi um desbravador que conseguiu unir a estética do cinema à experiência de sua história.

(Relivaldo Pinho é pesquisador, escritor e professor do Centro Universitário Fibra)

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