As múltiplas faces da felicidade na era da tecnologia

Em grego, felicidade se diz "eudaimonia", palavra que é composta do prefixo "eu", que signifca bom, e de "daimon" (demônio), que, para os gregos, é uma espécie de semi-deus ou gênio, que acompanhava os seres humanos. Ser feliz era dispor de um "bom demônio", o que estava relacionado à sorte de cada um. Felicidade, do latim felicitas, é também definida como estado de satisfação plena e global de todas as tendências humanas.

E no século XXI, como a felicidade é definida? No Dia Internacional da Felicidade, comemorado nesta quarta-feira, 20, fomos ouvir algumas pessoas sobre o assunto. "Buscar a simplicidade", diz o filósofo André Teixeira. "Aceitar-se e soltar mágoas e ressentimentos", fala a psicóloga Michelle Malcher. "Gratidão é a energia que faz você entrar no campo da felicidade", afirma a terapeuta holística Egle Martins. "É viver ancorado no presente, sem a ansiedade do que virá ou a depressão do que passou", completa o professor de meditação Ney Messias.

Já o advogado e professor Paraguassu Éleres, com a autoridade de quem acaba de completar 80 anos de idade, revela que pôs a felicidade como filosofia de vida para si e para a família. "Felicidade é um estado de espírito. Sempre digo que 'basta amor e humor que o resto vem sem dor'", aconselha.

A frase de Paraguassu Éleres virou um ditado de família, que costuma ser repetido com frequência dentro de casa. "Já tive momentos felizes, infelizes e neutros. A felicidade decorre do bem estar, que pode ser físico, espiritual, amoroso, material ou o encontro de uma pessoa que se gosta de ver ou que não se vê há muito tempo", conta.

Ele observa a elevada vendagem de livros de autoajuda e opina que as pessoas buscam neles um "autocomando" para a felicidade. "É um grande desafio ser feliz. Lao-Tsé, disse que a felicidade podia ser conquistada pegando o exemplo da natureza que é serena. As doutrinas se preocupam em definir o que é a felicidade, que pode ser prazerosa ou apenas de satisfação. Ou pode estar feliz apenas por não ter preocupação. Estou feliz pelo meu casamento de 55 anos, a minha mulher, Cecília, que conheço há 60 anos, a minha vida que tem 80 anos, meus cinco filhos com as vidas organizadas, meus oito netos inteligentes. Sou um homem feliz? Certamente sim"

A felicidade é frequente no vocabulário desse professor, que ficou órfão aos oito anos e idade e, antes da advocacia, formou-se em marcenaria, trabalhou como operário, foi agrimensor e ator de teatro e televisão na antiga Marajoara. "Tenho uma vida muito rica para não ser feliz. Tenho a felicidade de ter sido filho de um topógrafo, que morreu muito cedo. Tenho orgulho e felicidade de ter sido criado por meu pai juiz e desembargador João Bento de Souza, do qual sempre me espelho na retidão e serenidade, um homem pobre de uma dignidade invejável. E, hoje, a maior felicidade que eu tenho é da esposa, filhos, netos e amigos. Não é a cara que faz a felicidade, você não consegue ver o espírito das pessoas".

Há séculos o homem busca o caminho para uma vida feliz

A felicidade é objeto de estudo de vários pensadores da história. "Aristóteles diz que a razão última da existência humana é ser feliz. No entanto, o que ele chama de felicidade é uma vida moderada, politicamente ativa e em que o indivíduo seja capaz de trabalhar pelo bem comum e, ao mesmo tempo buscar nessa busca da felicidade a prática das virtudes. O existencialista Sartre diz que o homem está condenado à liberdade e isso compreende o nosso maior desejo e também o nosso maior medo, porque o homem anseia a liberdade, mas também o deixa sozinho, pois cada um de nós precisará tomar decisões, você pode ouvir as pessoas, ser tensionado por alguma realidade social ou valor moral", aponta o professor de Filosofia da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), André Teixeira.

"A felicidade é extremamente relativa: se você perguntar para quem tá com fome 'o que é ser feliz?', é um prato de comida, para o doente, a cura, depende do recorte que a gente fizer. Felicidade é um estado de momento, que ultrapassa a alegria, é o momento de olhar o mundo e de entender a realidade, mesmo sabendo que nem sempre estaremos alegres."

A psicóloga Michelle Malcher, assim como Paraguassu, afirma que a felicidade é um estado de espírito que se caracteriza pela sensação de bem estar e de paz, que pode ser influenciado, mas não depende de motivo. "Quando a gente realiza um sonho, se relaciona com alguém, recebe um bom dinheiro, ganha um presente lindo, o que a gente sente com essas coisas é satisfação. Ela alimenta a felicidade, mas não é a felicidade. A felicidade está dentro de nós, quando se está tranquilo e em equilíbrio com a mente e o corpo. A gente busca felicidade nas coisas, nas pessoas, nas realizações, mas não é isso. Quem tem a consciência da felicidade é feliz na sua essência mesmo quando está cheio de problemas".

Para trilhar o caminho da felicidade, ela recomenda a aceitação de si mesmo, das outras pessoas e também das coisas como são, compreendendo que nada é estático; assim como o perdão das ofensas recebidas. "É preciso deixar de validar a maldade ou o erro dos outros, mas 'soltar' a mágoa, a raiva e outros sentimentos negativos. Não se deve colocar a responsabilidade da nossa vida nas mãos do outro. Quando você fizer o mergulho pessoal, quando entrar no casulo, vai sentir dor, mas quando sair do casulo você olha o mundo com olhos de borboleta e vai ser lindo. Ser feliz é muito interno, muito próprio e muito leve."

A terapeuta holística e integrativa de várias modalidades, como onstelação familiar, hipnose clínica e erecsoriana, reiky, ThetaHealing, Técnicas de Renascimento, EFT e Access Conciense, Egle Martins, afirma que a felicidade é um estado de consciência presente, onde a pessoa vibra na energia da gratidão.

"É o momento em que se sente pleno, completo, integrado, fazendo parte do todo. Não é ter o melhor carro, o melhor casa, mas vibrar estando no lugar, fazendo o que faz, que o casamento é o que se sonhou, que os amigos fazem sentir acolhimento e pertencimento. Gratidão é um estado de pensamento positivo. Sentir a gratidão ancora uma energia importante e essencial para ser feliz. É importante vibrar na gratidão, sair da vibração do trauma e do drama, parar de culpar as pessoas pelas situações, parar de se sabotar e assumir a responsabilidade sobre todas as atitudes da própria vida. Vou passar a olhar mais pra mim do que do outro. Até quando as pessoas sofrem, é importante agradecer porque trouxe conhecimento, experiência. Você pode ser grato no silêncio".

Já para o instrutor em formação em Mindfulness pela Universidade Federal de São Paulo, Ney Messias, a grande razão de ser feliz é conseguir viver e dar valor às pequenas coisas da vida. "A vida é feita de pequenos milagres diários que a gente acaba se desconectando. Essa história de redes sociais acabou potencializado o desejo de ter uma vida espetaculosa. A vida de todo mundo é espetaculosa e ninguém se percebe sobre o que é a vida real, se existe alegria e felicidade.

"Ele observa que a felicidade está em primeiro curtir o que está ao alcance, como "uma cadeira na sacada do apartamento com uma vista bacana." "A infelicidade está no esperar porque as pessoas esperam o que não têm, "quando não se consegue regozijar com o que tem. Muito da felicidade está 'não esperar'", recomenda. Ney recomenda a meditação para curar a ansiedade e a depressão, que são muito ancorados no passado e no futuro. "A grande mudança da meditação é me tirar do 'não presente'. Isso tira uma agonia fantástica"

Dez dicas para ser feliz segundo os entrevistados:

1) Ter simplicidade;

2) Buscar a paz;

3) Viver o presente, sem a ansiedade do futuro e a depressão do passado;

4) Ter gratidão;

5) Ter amigos;

6) Aceitar-se;

7) Perdoar;

8) Liberar traumas e ressentimentos;

9) Aceitar as outras pessoas e situações como são;

10) Não atribuir aos outros a responsabilidade sobre a própria vida;