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Artista paraense participa de exposição pelo Centenário da Semana de Arte Moderna em São Paulo

Danielle Fonseca compõe a mostra com seu trabalho sobre o estilo arquitetônico modernista raio-que-o-parta.

Alexandra Cavalcanti

Foi observando a fachada da casa onde a família mora há décadas no bairro do Umarizal, em Belém, que a artista visual e escritora paraense Danielle Fonseca começou a se encantar pelo estilo arquitetônico conhecido como “raio-que-o-parta”. Encontrado em fachadas de moradias antigas da cidade, ele é composto pela justaposição de azulejos coloridos, quebrados, que formam desenhos geométricos e angulados parecidos com setas, bumerangues e raios. E não por acaso, esse é o tema central da exposição da artista, “Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil”, que passa a integrar a partir do próximo dia 16, o Diversos 22 – Projetos, Memórias, Conexões, em razão das efemérides do centenário da Semana de Arte Moderna e do Bicentenário da Independência do Brasil. A mostra paulista é composta por 600 obras de 200 artistas e pode ser visitada até o dia 07 de agosto de 2022.

Na ocasião, a artista também vai lançar seu novo filme, o curta “Um céu partido ao meio” sobre o estilo arquitetônico “Raio-que-o-parta”. O vídeo mostra a relação desses desenhos com os moradores. Para tanto, foram colhidos os depoimentos de três moradores para contar um pouco dessa relação. Uma delas é Katia Caripunas, moradora do bairro do Umarizal. Ela é neta do mestre de obras João Domingos Caripunas, que construiu várias casas nesse bairro, entre elas, a da Danielle. “Quando escrevi o roteiro pensei, sobretudo, no bairro que nasci que para mim foi berço da cultura negra em Belém. Por isso, ele é uma homenagem à cultura afro-brasileira. À medida que a urbanização do bairro avançou, o processo de negação da cultura afro-brasileira foi aumentando também”, reforça.

O filme conta com participações especiais do ator Pascoal da Conceição, interpretando Mário de Andrade e da cantora e atriz Cida Moreira narrando um poema que encerra o filme. A edição é de Marcelo Rodrigues. Participaram ainda da equipe do filme Ito Alves na percussão, Igor Marotti nas cenas feitas no Teatro Oficina em São Paulo.

Em ambos os trabalhos, está presente a relação da artista com esse estilo arquitetônico que perpassa pela história de moradia de sua família. “Essa lembrança na verdade é a minha vivência em uma casa no estilo raio que o parta, no Umarizal, onde nasci e moro até hoje. Foi deixada pelo meu bisavô Norberto Fonseca, mas o estilo raio foi feito em 1960 com minha bisavó assumindo a casa e seguimos preservando até hoje. A obra foi desenhada pelo Mestre de obras João Domingos Caripunas, cuja história está no filme”, conta a artista.

As pesquisas para o trabalho aguçaram ainda mais o interesse da artista pelo estilo. “O que mais me causa curiosidade e encanta são os mosaicos coloridos e seus raios, bumerangues, meio-raio, entre outros, próprios do estilo modernista. Além disso, esse estilo de casa só existe aqui no Pará”, destaca. Para a exposição, Danielle captou imagens do estilo arquitetônico nos bairros do Umarizal, Pedreira, Campina, Icoaraci, São Brás e Guamá.

A arquiteta Laura Caroline Costa, que orientou a artista nesse processo e faz doutorado sobre o tema, afirma que é comum ver casas com mosaicos de azulejos na maioria dos bairros de Belém, tanto no centro histórico quanto em bairros de formação mais recente, como Marco e Pedreira. “Mas também há ocorrências em Abaetetuba e no Marajó, por exemplo. Isso nos mostra que houve ampla disseminação da estética dos raios em nosso estado”, diz.

Além disso, ela afirma que o estilo é considerado um lado B do modernismo. “Ele foi uma forma de assimilar a arquitetura moderna quando não havia a formação de arquitetos na nossa região. Então, os profissionais da construção civil, engenheiros, mestres de obra e pedreiros, foram os principais responsáveis por criar soluções que combinavam elementos do modernismo e painéis com cacos coloridos. Hoje vemos muito interesse pelo tema, associando o Raio que o parta à cultura paraense, o que nos leva a entender que o estilo representa um jeito peculiar de combinar arte e arquitetura”, analisa.

O convite para participar da mostra em São Paulo partiu do curador geral Raphael Fonseca. “Estar nessa mostra junto com tantos artistas e escritores que tanto admiro é um presente, mesmo que soe clichê dizer isso, e junto com Bruno de Menezes e o grupo Vândalos do Apocalipse importante movimento aqui de Belém que demarca bem nosso modernismo. O vídeo também foi um convite dele, que está me proporcionando contar um pouco dos nossos raios em forma de videoarte documental”, ressalta

image Trecho do filme "Um Ceu Partido ao Meio" de Danielle Fonseca. (Divulgação)

 

 

 

 

Obras

As obras que compõem o espaço expositivo, com cerca de 1.300m², foram cedidas por mais de 100 instituições e colecionadores brasileiros, dentre eles, a Pinacoteca do Amazonas, o Museu Nacional de Belas Artes e o Museu de Arte de Belém. A curadoria foi feita pelos pesquisadores Aldrin Figueiredo, Clarissa Diniz, Divino Sobral, Marcelo Campos, Paula Ramos, Raphael Fonseca e consultoria de Fernanda Pitta.

A mostra tem como objetivo mostrar ao público que arte moderna já era discutida por artistas, intelectuais e instituições de Norte a Sul do país, desde o final do século 19. Além disso, pretende expor diversos tipos de linguagens e formas de criar e compartilhar imagens nesse período.

Para tanto, o trabalho dos sete pesquisadores e curadores da mostra foi dividido em quatro núcleos, propondo uma imersão no espaço e no tempo histórico e social das artes modernas brasileiras. Os títulos de cada núcleo, assim como da própria exposição, fazem alusão às manifestações artísticas existentes no país.

Além do trabalho inédito da paraense, a mostra tem obras de artistas como Lídia Baís, Mestre Zumba, Genaro de Carvalho, Anita Malfatti, Tomie Ohtake, Raimundo Cela, Pagu, Alberto da Veiga Guignard, Rubem Valentin, Tarsila do Amaral e  Mestre Vitalino.

O projeto traz exemplos importantes de desenhos, pinturas e esculturas, além de fotografia, cinema, revistas ilustradas, música e documentação de ações efêmeras, essenciais para ampliar a compreensão das muitas modernidades presentes no Brasil.

 

Agende-se: Exposição Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil. Local: Sesc 24 de Maio – 5º andar – Rua 24 de Maio, 109 – Centro/SP. Aberta até 07/08/2022, de terça a sábado, das 10h às 20h. Domingo e feriado, das 10h às 18h. Visitação gratuita. 

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