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Brasil e eleições presidenciais argentinas: atenção ao vizinho e grande parceiro comercial do país

Rodolfo Marques

As eleições presidenciais argentinas de 2023 vêm causando apreensão em toda a América do Sul. No primeiro turno, cerca de 74% dos 35 milhões de eleitores compareceram às urnas. A Argentina passa por uma profunda crise econômica, com inflação anual batendo os 140% e com altos índices de pobreza e de conflitos sociais. Neste século, em verdade, o cenário do país platino vem se agravando – e dado representativo desse processo foi o governo do representante da direita liberal, Mauricio Macri, que governou o país entre 2015 e 2019. Macri foi o único que rompeu, de forma mais clara, o ciclo de governos alinhados ao maior movimento político do país, o peronismo.

O peronismo, representado por Sergio Massa, ministro da Economia do governo Alberto Fernandez, teve o menor número de votos, nos últimos 40 anos, no primeiro turno eleitoral, ocorrido em 22 de outubro. Foram pouco mais dos 36% dos votos válidos para o candidato da aliança “União pela Pátria”. Por outro lado, demonstrou força, principalmente considerando-se o desempenho na província de Buenos Aires e o resultado obtido nas eleições primárias (PASO), ocorridas em 13 de agosto. 

O candidato de extrema-direita, Javier Milei, apostou no discurso libertário e no “combate à casta política”, focando em um discurso antissistema e apelando para o armamento da população e para o uso de palavrões e de bravatas. Milei conseguiu grande sucesso entre os mais jovens. Chegou a 30% dos votos válidos na “primeira volta”. Todavia, o líder da coligação “A liberdade avança” perdeu adesões nas semanas anteriores ao primeiro turno, não somente com a campanha de desconstrução da imagem política conduzida pela equipe de Massa, mas também pelas próprias contradições presentes em suas falas públicas e em suas atitudes. Ele continua com boas chances, mas está em viés de baixa para o segundo turno, a ocorrer em 19 de novembro.

A candidata da direita liberal (grupo “Juntos pela Mudança”), Patricia Bullrich, conseguiu 23% da preferência dos eleitores e, mesmo tendo sido amplamente criticada por Milei nos debates públicos, optou por apoiar o candidato radical no segundo turno. Bullrich ressaltou que o “males maiores” seriam o peronismo e o kirchnerismo (hoje, personificado na figura da vice-presidente, Cristina F. de Kirchner), representados por Massa. 

E o Brasil nesse contexto? A Argentina tem mais de 1.200 quilômetros de fronteira terrestre com o país. Os platinos são o terceiro maior destino de exportações brasileiras, enquanto o Brasil é o maior comprador de produtos argentinos. O governo Lula procura não participar diretamente do processo eleitoral no vizinho, mas não esconde sua preferência pelo candidato da situação. O próprio Sergio Massa destacou a importância do Brasil nas relações comerciais e declarou ter em Lula um grande aliado para um eventual governo sob sua liderança na Argentina. 

Por outro lado, a campanha de Milei trocou várias informações com o ex-presidente Jair Bolsonaro e com os bolsonaristas. A perspectiva ideológica e as estratégias político-eleitorais são bem parecidas. No dia do pleito no primeiro turno, estiveram presentes em Buenos Aires os deputados federais Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Marcel Van Hattem (NOVO-RS), no apoio à candidatura do libertário. Em relação ao contexto diplomático, o candidato de extrema-direita proferiu várias críticas e ofensas contra Lula, e disse que “não negociaria com comunista”, ameaçando suspender as relações com o Brasil, além de retirar o país do Mercosul e da versão ampliada do BRICS. Muito provavelmente, essas declarações são próprias de uma campanha e parecem mais bazófias do que realidade. 

Não há dúvidas, portanto, de que “a segunda volta” na Argentina é muito esperada por todo o globo terrestre. Além da relevância regional do país, há uma observação de como as forças políticas irão se reordenar no país após o pleito – tanto no âmbito da América do Sul quanto em outros campos do ambiente internacional. Massa e Milei tendem a manter a polarização e representam, para a Argentina, modelos muito diferentes de país e de gestão pública. 

Rodolfo Marques