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OPINIÃO: O clima mudou, a Amazônia mudou. E agora?

Ima Vieira é Pesquisadora Titular do Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG) e Assessora da Presidência (FINEP)

Ima Vieira*

Na Amazônia, aproximadamente 20% das florestas foram destruídas, e outros 40% estão gravemente degradadas. A combinação de temperaturas elevadas e precipitações abaixo da média, sucedendo anos de extrema seca, culminou em uma estiagem severa em 2024. O fogo invadiu florestas que antes eram úmidas. Essa degradação e perda de florestas estão ameaçando a sobrevivência de inúmeras espécies, reduzindo a resiliência das florestas e sua capacidade de fornecer serviços ecossistêmicos vitais.

Estudos recentes do INPE indicam que os incêndios florestais na Amazônia e em outros biomas, cresceram consideravelmente em 2023, com um aumento ainda maior em 2024. Embora esses incêndios sejam causados por atividades humanas, é reconhecido pela ciência que as mudanças climáticas — evidenciadas pelo aumento das temperaturas, redução da umidade do solo e diminuição das chuvas — são um fator essencial no incremento dos incêndios florestais na Amazônia. O fenômeno El Niño adiciona mais risco, associando-se a períodos prolongados de seca na região.

Com secas extremas, como a atual, a fragmentação da paisagem, a utilização de fogo em atividades agrícolas e a presença de áreas degradadas, devido a incêndios anteriores, espera-se que o risco de incêndios aumente ainda mais na Amazônia

Nos anos secos, como 2023 e 2024, o fogo pode facilmente se tornar incontrolável, pois toda a paisagem se torna altamente inflamável. À medida que o desmatamento fragmenta a paisagem, gerando mais bordas entre florestas e áreas abertas, estas se tornam mais vulneráveis ao fogo. Com secas extremas, como a atual, a fragmentação da paisagem, a utilização de fogo em atividades agrícolas, a presença de florestas mais degradadas devido a incêndios anteriores, e o desmatamento ilegal, espera-se que o risco de incêndios aumente ainda mais. A região de Santarém, por exemplo, já é considerada um “hotspot” para incêndios florestais, com megaincêndios ocorrendo desde os anos 90. No leste da Amazônia, nos últimos 40 anos, observou-se uma redução nas chuvas, entre 30 a 40%, e um aumento na temperatura de 2 a 2,5°C durante a estação seca.

A transformação da Amazônia é um motivo de grande preocupação para a sociedade e os formuladores de políticas, pois essa situação pode levar ao colapso da floresta, a mudanças intensas e frequentes nos fluxos e níveis de água dos grandes rios amazônicos, como vimos atualmente. Isso afeta milhões de pessoas nas áreas urbanas e rurais da região, com impactos significativos no Brasil e no mundo.

Embora alcançar o desmatamento zero na Amazônia seja um passo crucial para a proteção da floresta, essa medida isoladamente não será suficiente para prevenir incêndios florestais

Embora alcançar o desmatamento zero na Amazônia seja um passo crucial para a proteção da floresta, essa medida isoladamente não será suficiente para prevenir incêndios florestais. É urgente implementar ações mais audaciosas para enfrentar os complexos desafios que ameaçam a Amazônia. Entre essas medidas, destaca-se o fortalecimento de políticas de manejo integrado do fogo. A nova Lei nº 14.944/2024, que institui a Política Nacional de Manejo do Fogo (PNMF), representa um avanço para o Brasil, pois abre a possibilidade de um planejamento mais estratégico e de longo prazo para o manejo do fogo, incluindo ações de prevenção, combate e recuperação.  Apesar de ser um passo importante, a lei ainda precisa ser aprimorada em alguns aspectos, como o investimento em recursos para o combate a incêndios. Atualmente, a falta de recursos e a precarização das condições de trabalho dos brigadistas, com contratos de curta duração, prejudicam as ações de prevenção e dificultam uma resposta eficiente a longo prazo.

É fundamental que as políticas públicas incorporem a gestão do fogo de forma integrada, incluindo ações de prevenção, conscientização e combate a incêndios, buscando alternativas mais eficientes e eficazes para proteger o meio ambiente e garantir a segurança das comunidades. Também é importante apoiar pesquisas científicas para melhor entender as interações entre clima, fogo e vegetação. Além disso, é indispensável reforçar a fiscalização e garantir o cumprimento das leis ambientais, para que as atividades ilegais sejam devidamente punidas.

Na estratégia da gestão do fogo e conservação florestal, também é necessário o compromisso e envolvimento dos gestores municipais e vereadores. Como ressaltou Bertha Becker, as cidades precisam ser atuantes na proteção das florestas, que lhe fornecem serviços ecossistêmicos essenciais ao seu funcionamento, produtividade e bem-estar.

Essas ações combinadas são essenciais para proteger a Amazônia de incêndios e conservar sua biodiversidade única.

*Pesquisadora Titular do Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG) e Assessora da Presidência (FINEP)

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