Sobre Amar e o 'Tempo da Delicadeza' Lena Mouzinho 19.12.19 20h00 Só lembrando: estamos na Terra para aprender a Amar, realizando conexão conosco mesmos e com tudo o mais que pulsa vivo além de nós, transformando num continuum, conflitos intrapessoais, interpessoais, grupais, sistêmicos, em sínteses e em novas aprendizagens. Assim evoluímos como seres. Tudo o que fazemos todos os dias, é somente meio para esse fim. O belo e amoroso planeta, corpo vivo do qual fazemos parte, nos oferta o ethos mais que perfeito para a expansão e aprofundamento desta aprendizagem. Entenda-se por Amor, a força cósmica capaz de manifestar-se entre nós, ao nos encontrarmos autenticamente com outros seres, em vínculos diversos, cada um com intensidade e qualidade de contato singular, dependendo da relação na qual nos encontramos em experiência. O par é um lócus privilegiado no qual seguiremos aprendendo como viver interligados. Seja lá qual o par. Dentre todos os vínculos humanos as relações conjugais tem-me instigado profundamente. Complexas e encantadoras, são tecidas por pessoas que chegam diante uma da outra, com uma bagagem repleta de experiências vividas em culturas bem diferentes – até opostas - para conviver e lidar com o desafio de gerir juntos o dia-a-dia, enquanto desenham uma outra cultura. O desafio? Construir uma ansiada intimidade preservando a individuação de cada pessoa. Ah intimidade... Uma experiência tão desejada e paradoxalmente, tão temida... Temor de que a força de nossa fome de nos conectar nos misture, nos confunda com o outro, nos faça perder os contornos de nossa identidade, de sermos dominados, controlados e nos tornarmos apenas uma extensão de uma outra pessoa...Como na primeira experiência íntima. A primitiva vivência humana de intimidade é a do bebê com o adulto cuidador. Caracterizada pela total dependência da criança para a satisfação de suas necessidades. Como se ambos fossem um só corpo, sem fronteiras. Depois é o par conjugal que se torna a forma relacional humana mais íntima, inclusive fisicamente. Quando alguém se vê convidado pela dança da vida a compor um casal, questões inquietantes costumam surgir (a não ser que a decisão seja tomada na fase do apaixonamento): É possível continuar sendo “eu” e “tu” em realização e ao mesmo tempo construir juntos, um precioso, apoiador e acolhedor “nós”? É possível desenvolver intimidade com liberdade? Aliança conjugal é algema? Como cultivar conexão com um outro, tão próximo, e administrar fronteiras entre nós, para viver intimidade com liberdade? Como viver experiências de compartilhamento de vulnerabilidades, entrega e “fusão” e continuar inteiro? Um laço e não um nó Viver em casal é aprendizado infindo de amar intimamente. Construção delicada de um laço e não de um nó. Obra de arte criada artesanalmente, por artífices que estão ao mesmo tempo se construindo, enquanto constroem muitas outras coisas, em outros espaços relacionais. Uma experiência promissora principalmente quando vivida, numa fase da vida em que já estamos engajados no exercício de aprimorar autonomia. Pois, para nutrir uma bela relação de amor com outra pessoa é preciso estar, pelo menos, disponível a buscar “casar” consigo próprio, investindo em auto-descobrimento, auto-cuidado, auto-responsabilidade e acolhimento de seus “verdes ainda não maduros”, para amadurecer. Autonomia – refere-se ao poder sobre si próprio – vai-se adquirindo no processo da gestão de potenciais, pela responsabilidade na satisfação de necessidades pessoais e ao providenciarmos condições que facilitem o desabrochar e aperfeiçoamento de nossos dons e talentos. Bem diferente de independência e de auto-suficiência, que são somente mitos. Intimidade conjugal se constrói pelo exercício da interdependência – arte de dar e receber, cooperação que flui em via de mão dupla, que soma e gera abundância justa e apoio mútuo, em todos os sentidos. Somos capazes de casar verdadeiramente, portanto, quando nos encontramos mais disponíveis e em condições de compartilhar generosamente: “dar de coração”, o que não torna o outro meu devedor pois, o que dou transborda do meu bem estar na vida. Tornando um laço íntimo Intimidade é tessitura delicada e corajosa, que tem direta relação com o cultivo da espontaneidade e transparência entre pessoas, o que gera confiança e entrega. É poderosa atitude compartilhada de amor. Viável em laços onde existem permissão e acolhimento respeitoso, para com a expressão honesta da humanidade vulnerável de cada uma das pessoas. O mesmo solo fecundo de onde brota auto-conhecimento para cada uma delas e onde o medo de amar míngua, pois os jogos usuais de “perde e ganha” perdem o sentido. Uma busca de confluência que concebe instantes crescentes de satisfação emocional, coroada pela experiência erótica que fusiona temporariamente. E de liberdade para só ser! Mas, para usufruir deste fértil e precioso “solo” há que nutri-lo, todos os dias. O cuidado fundamental? • Reconhecer com Reverência o Outro, como um LEGÍTIMO OUTRO, como diz Humberto Maturana. Cada um de nós é obra de arte em processo de criação. Ao mesmo tempo o artista, com ritmo, estilo e formas ímpares de “olhar”, de escolher a “matéria prima” para se constituir, de se movimentar no mundo enquanto se compõe numa história peculiar, com raízes que necessitam ser honradas. Entre nós não há superiores e nem inferiores. E a experiência de um não se sobrepõe a de outro. Somos únicos e incomparáveis. E não temos poder para “reformar” ou “retocar” a obra de arte que é uma outra pessoa, que não é meu objeto de posse, nem muito menos matéria prima a ser manipulada. Este outro é um Ser de Escolhas. Leia esta “jóia”: “Um dos sentimentos mais gratificantes que conheço - e também um dos que mais oferecem possibilidades de crescimento para outra pessoa ao meu lado - advém do fato de eu apreciar essa pessoa do mesmo modo como aprecio um pôr-do-sol. Pessoas são belas como um pôr-do-sol. Quando olho para um pôr-do-sol, como fiz numa tarde destas, não me ponho a dizer: 'diminua um pouco o tom do laranja... coloque um pouco mais de vermelho- púrpura na base e olha...usa um pouco mais de rosa naquela nuvem'. Não faço isso. Não tento controlar um pôr-do-sol. Somente o assisto. E me encanto com sua evolução. Gosto mais de mim quando consigo contemplar assim a pessoa que vive comigo, ou alguém da minha equipe, meu filho, minha filha, meus netos, ou outros pares... Pra mim isto é profundamente gratificante” (Carl Rogers em “Um Jeito de Ser”). Outro cuidado vital? • A generosa fluidez da comunicação que alimenta, cura e repara. Somos bosques misteriosos para nós e para o outro. E vice-e-versa. As imagens que construímos sobre nós e sobre os outros são como garatujas, rabiscos, no máximo esboços do que SOMOS essencialmente. Quanto mais nos auto-observamos em nossas emoções e no que importa realmente em nossa vida, mais nos conhecemos. Quanto mais nos conhecemos mais temos condições de nos traduzir para outros. Quanto mais nos damos a conhecer, mais cresce a confiança mútua e a segurança entre nós. E não...não nos tornaremos tediosos se nos desnudarmos, pois continuaremos vivos, desabrochando. Portanto, não é a sonegação de informações, nem jogos de manipulação que cultivam “mistérios”, que alimentam o amor. Alimentam sim a ansiedade, a insegurança, a impotência, o ciúme...coletivo de emoções as quais chamamos de paixão, que também é medo de amar, em suas diversas nuances. A comunicação honesta, empática e sua transparência, possibilita-nos acender luzes, sinalizar trilhas, facilitando o trânsito entre nós. Nossos comportamentos e palavras guiam o outro a embrenhar-se em nosso “bosque”, como se dissessem: “siga por aqui e vás encontrar uma clareira, onde a luz solar filtrada pelas copas das árvores, ilumina perfumadas e coloridas orquídeas pendentes” ou, “se fores neste ritmo podes assustar uma “fera” que mora na caverna próxima e ela costuma reagir agressivamente para se proteger”... Conversar faz-nos sair do estado de confusão para a clareza. Conversar requer escuta, genuinamente curiosa, pois o que temos certeza sobre o outro são apenas nossas interpretações. Escutar que é muito mais que ouvir. É ouvir com atenção, que nos faz sentir o que ouvimos. Para incluir às nossas hipóteses a compreensão dos significados que palavras e eventos tem para o outro, no lugar de exigir que a pessoa se adéqüe aos nossos referenciais. Nossa visão se modifica, se enriquece e chegamos cada vez mais perto um do outro. E conversar também requer aprender a falar, facilitando para que a outra pessoa nos escute. Falar de mim e sobre mim, abrindo escaninhos secretos, para desmitificar fantasias ameaçadoras que possam propiciar defesas ameaçadoras contra mim. Conversando descobrimos a linguagem de amar do outro: o que significa ser amado para esta pessoa? Como ela compreenderia que eu a amo? E conversando posso esclarecer sobre minha linguagem de amar. E fazer pedidos, pois o que a mim parece óbvio, ao outro pode parecer obscuro. Se o desejo de nos manter em conexão for mútuo, esta será uma bela oportunidade para aprendermos mais uma “língua estrangeira”. Para descobrir como fazer harmonia. Lembram de uma comovente apresentação musical? Uma voz canta. O instrumento que faz harmonia a acompanha “emoldurando” a expressão do canto, atento, gentil, produzindo beleza a partir da conexão ou, pode ser que um instrumento faça o solo, o outro acompanha e de repente invertem-se os papéis...cada expressão reverenciando a expressão do outro, mútua e belamente conectados, vibrando em uníssono. Os séculos de ênfase nas experiências competitivas nos fizeram banalizar e naturalizar violências no cotidiano de “vidas que andam juntas.” Nos afastaram e nos fizeram temer o amor. Somos, no entanto, programados biologicamente para nos conectar. E podemos mudar a história, mudando a cultura. Queres inaugurar o “Tempo da Delicadeza” nas relações com teus pares? Urge! Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱 Palavras-chave lena mouzinho colunas COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA OFF Lena Mouzinho . Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo! 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