Estou a um mês de completar 28 anos na magistratura trabalhista, todos eles na Amazônia, especificamente na abrangência territorial dos Estados do Pará e do Amapá, jurisdição federal do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª região.
Aprovado em 1º lugar, a posse ocorreu no dia 13 de dezembro de 1996, numa sexta-feira, a partir das 18:00 horas, no cargo de juiz substituto, o inicial da carreira.
Agora, olhando pelo retrovisor da história, o flashback – aquelas lembranças ou recordações de algo passado – apresenta-se como o resultado das experiências do extraordinário tempo que tive para fazer e para garantir a justiça para aqueles que, verdadeiramente, tiveram seus direitos violados.
Dia a dia, majoritariamente de segunda a sexta-feiras, uma quantidade de processos que não pode ser medida porque é muito grande – mas estão na casa das milhares de audiências presididas, das milhares de sentenças proferidas, dos milhares de acordos judiciais homologados e dos incontáveis despachos judiciais — foram decididos como medidas judiciais resolutivas dos conflitos trabalhistas.
Por trás dos números, estão histórias com narrativas verdadeiras e falsas; reais e irreais, éticas e não éticas, bem próprias da variável natureza ontológica do ser humano, sempre com as mais diversas motivações. Essa quantidade incontável demonstrou que os processos, bem além das questões monetárias, no fundo, dizem respeito aos valores éticos das partes envolvidas.
Vinte e oito anos da minha vida na magistratura representam um tempo riquíssimo de aprendizado sobre as coisas humanas e seus conflitos nem sempre justificáveis e, em muitos casos, desarrazoados ou despropositados de uma causa real.
São causas que, se bem observadas, de certo modo, apresentam conotações messiânicas, visto que revelam situações bem evangélicas, conforme as pregações de Jesus, de acordo com os relatos evangelistas.
Em regra, o dinheiro tem sido a maior motivação das ações judiciais, como se a monetização fosse o principal valor a ser preservado ou reparado diante dos casos concretos das ameaças ou das violações dos direitos e da dignidade humana – causas que colocam nos dois “pratos” da balança da Justiça verdades, meias-verdades ou mentiras.
Foran incontáveis processos com pretensões condenatórias milionárias, bem vultosas mesmo, onde em muitos casos o fato real claramente perdeu espaço para a retórica, cuja finalidade – ao que se percebeu para repetição das narrativas – parecia intimidar a parte contrária e, por lógica, impressionar o julgador, situações que me levaram à reflexão sobre outra advertência de Jesus, segundo o relato de Mateus (Marcos 8:36-37): “Pois, que aproveitaria ao homem ganhar todo o mundo e perder a sua alma? Ou que daria o homem pelo resgate da sua alma?”
Demandas grandes e demandas pequenas, dentre elas, ações de parentes contra parentes (mãe contra filha, filho contra pais, sobrinhos contra tios, ex-esposas contra ex-maridos) – casos que reportam ao que Jesus advertiu, conforme o evangelista Lucas (12:52-53): “Os pais vão ficar contra os filhos, e os filhos, contra os pais. As mães vão ficar contra as filhas, e as filhas, contra as mães. As sogras vão ficar contra as noras, e as noras, contra as sogras”
Mas julguei causas simples de pessoas humildes. Elas queriam apenas ter a garantia da reparação moral e a certeza de que não mais seriam violadas em seus direitos, nem lesadas em seus valores básicos e fundamentais relativos à sua condição de vida honesta.
Esse é um típico problema que, nos tempos do rei Salomão, já se questionava sobre o valor do trabalho humano: “Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, em que ele trabalha debaixo do sol?” (Eclesiastes, 1:3), questão que leva à bem-aventuranças ou esperança teológica anunciada pelo Messias aos injustiçados: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos”. (Mateus 5:6).
Na balança do tempo, confirmou-se cotidianamente que as verdades são imutáveis e, por isso, sempre prevalecem como critérios éticos aos julgamentos judiciais. Por outro lado, a mentira – o dicionário a define como o ato deliberado de enganar e de ludibriar – processualmente tipifica a má-fé, como nos casos da conduta da parte que pretenda vantagem não prevista em lei ou que altera a verdade dos fatos e, ainda, que se utiliza do do processo para conseguir objetivo ilegal.
Julgar com o código de ética da magistratura nacional cravado na mente e no coração, dia a dia, e em cada processo, é o maior compromisso de todos os magistrados. E o meu tempo de magistratura revelou que isso tem um valor sublime: coibir pretensões ilícitas e não éticas – naquelas casos da utllização do processo para conseguir objetivo ilegal – representa a batalha moral da Justiça em defesa do justo e értico contra o ilícito e o não ético .
As horas, os dias, as semanas, os meses e os anos – que somam as quase três décadas do meu tempo de magistratura – de igual modo, conduziram à compreensão de que a arte de julgar (como resultado de experiência e de conhecimento) revela, bem além do pensamento legal, o próprio caráter ético-moral do juiz.
Do que vivi e do que aprendi por todo o tempo dignificante, minha consciência me diz: continue com o seu firme propósito de lutar pela Justiça ética, ainda que os ventos soprem ao contrário, baseado no tríplice compromisso desde o início: atuar com responsabilidade jurisdicional, julgar com ética processual e sempre implementar eficiência jurisdicional.
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