Algumas formas e manifestações típicas de individualismo, que se repetem em diferentes ações e decisões de grupos e corporações isolados, comprometem situações e procedimentos que, entretanto, dependem do entendimento entre os envolvidos. Consta, por exemplo, que às vésperas do jogo da seleção brasileira com a russa, na Copa de 1958, o treinador Vicente Feola teria chamado o ponta-direita Garrincha para orientar sobre a melhor forma de ultrapassar o marcador soviético e chegar ao gol. Deveria receber a bola, correr até a linha de fundo e cruzar para a área, onde o atacante Vavá já estaria pronto para mandar às redes. Como resposta do atacante, com a simplicidade peculiar ao jogador, teria recebido outra pergunta óbvia: “já combinou com os russos?”
Certa lógica elementar, que a interrogação sugere, se assenta a estes tempos pré-eleitorais, quando partidos e integrantes discutem nomes a concorrerem aos cargos eletivos majoritários sem procurar saber o que pensa o respeitável público eleitor, enquanto a participação da outra parte, o povo, se resume aos que servem os comes e bebes, prestam apoio na luz e som e depois, higienizam os espaços utilizados. Parecem sempre relegar a importância decisiva dos ilustres esquecidos que, entretanto, tem se apresentado mais atentos e objetivos a cada eleição, plugados nas redes sociais, cada vez mais ativas, comportamento extremamente diferenciado dos tempos de antigamente, interpretando e reagindo ao universo paralelo em que se vê deixado à margem.
Esquecem e ignoram quanto está contido no “Vox Populi”, o vocábulo latino reverberado como “A voz do povo”, a que a crença popular tem acrescentado refletir “a voz de Deus”. Também tangenciam o dispositivo constitucional, que insere, no artigo 1º da outrora designada, mas circunstancialmente negligenciada, como “Lei Magna”, que “... o Poder emana do povo ...”. Quantos atuam distantes do povo, parecem ainda não terem acordado para o recado das eleições recentes, em que o povo votou nos que lhes falaram mais de perto, em exemplares reencarnações da popularidade que sustentavam e sobrevivem até hoje, como Magalhães Barata, no Pará; ACM, na Bahia; Paulo Maluf em SP; ou José Sarney, no Maranhão, surpreendendo apenas os surdos às “vozes roucas das ruas”.
Para que se tenha alguma ideia da desconexão da classe política com “os russos”, somente o site “e-Cidadania”, do Senado Federal, recebeu milhares de “Ideias Legislativas”, com mais de 100 mil assinaturas, engavetadas principalmente porque, na maioria, reclamava soluções para os problemas básicos, entre eles combate à corrupção, afastamento de corruptos da vida pública e atenção à segurança, educação e saúde. Há pouco do primeiro turno do pleito de outubro próximo, ainda não se teve notícia de qualquer pretenso candidato apresentando propostas efetivas, relacionadas ao que o povo reclama, preferindo discutir interesses pessoais e corporativos, propiciando a eleição de quem está onde o povo está, como Milton Nascimento poetizou.