CONTINUE EM OLIBERAL.COM
X

GUSTAVO FREITAS

GUSTAVO FREITAS

Internacionalista e comentarista de política internacional em O Liberal. Com experiência recente nas eleições argentinas, Estados Unidos e Oriente Médio, usaremos este espaço para falar sobre tudo que acontece pelo mundo.

Imigração, guerra comercial e recuos estratégicos marcam os 100 primeiros dias de governo Trump

Gustavo Freitas
fonte

O governo de Donald Trump completará 100 dias na próxima quarta-feira, 30. Nos Estados Unidos, este período é compreendido como crítico para avaliar o início da gestão de quem entra na Casa Branca. Em pouco menos de quatro meses, o novo governo foi marcado por uma agenda com significativas dificuldades de ser executada. A administração Trump concentrou esforços em temas centrais de sua campanha, como imigração, guerra comercial com parceiros globais, negociações envolvendo a guerra na Ucrânia e o programa nuclear do Irã.

A política de imigração foi um dos pilares da campanha de Trump, que prometeu deportações em massa de imigrantes ilegais. Nos primeiros dias de governo, a administração intensificou operações da Polícia de Imigração e Alfândega (ICE), com 538 prisões registradas em um único dia, incluindo supostos membros de gangues e indivíduos com condenações criminais. Aviões militares, como o C-17 Globemaster III, foram utilizados pela primeira vez para repatriar imigrantes, uma medida que gerou críticas por relatos de condições precárias e abusos durante o processo. Até o final de janeiro, cerca de 11 mil imigrantes foram deportados para o México, e 29 mil foram detidos na fronteira sul, segundo autoridades mexicanas.

Apesar do ímpeto inicial, o ritmo das deportações não superou os números do último ano do governo Biden, frustrando Trump, que prometeu remover “milhões” de imigrantes. A resistência veio de múltiplas frentes: estados de tendência democrata, como a Califórnia, recusaram-se a cooperar com as autoridades federais, enquanto até estados republicanos, dependentes da mão de obra imigrante, questionaram a viabilidade econômica das deportações em massa.

Além disso, ações judiciais contestaram a legalidade de medidas como a suspensão do Programa de Admissão de Refugiados e o fim de iniciativas que permitiam a entrada legal de migrantes de Cuba, Haiti, Nicarágua e Venezuela.

Protestos em cidades como Washington, com cartazes exigindo “parem de armar Israel” e apoio aos deportados, reforçaram a pressão pública contra a política migratória. A Suprema Corte de Wisconsin, em uma derrota simbólica para a administração, elegeu uma juíza progressista, sinalizando possíveis reveses judiciais futuros.

A guerra comercial continua sendo foco central, com Trump inicialmente impondo tarifas de 25% sobre importações de aço e alumínio do Canadá e México, 10% sobre produtos chineses e ameaçando taxar países como o Brasil, acusado de “cobrar demais” dos EUA. Essas medidas, anunciadas como forma de incentivar a produção doméstica, geraram turbulência nos mercados financeiros e críticas de líderes globais.

VEJA MAIS

image Trump diz aguardar Ucrânia assinar documentos sobre acordo de terras raras

[[(standard.Article) EUA não vão abandonar tarifas contra a China a menos que país dê algo em troca, diz Trump]]

Internamente, as tarifas enfrentaram resistência de setores econômicos dependentes de importações, como a indústria automotiva, com a Jaguar Land Rover interrompendo envios de carros para os EUA. A promessa de Trump de combater a inflação herdada do governo Biden, especialmente no preço dos ovos, não se concretizou, e a alta nos custos de bens importados agravou a percepção de crise econômica.

Em 2 de abril de 2025, Donald Trump anunciou uma tabela detalhando tarifas recíprocas impostas a mais de 180 países, com taxas variando de 10% a 50%, marcando o início de uma agressiva guerra tarifária global. A medida, chamada por Trump de "Dia da Libertação", alegava corrigir supostas injustiças comerciais e proteger a indústria americana, com taxas específicas como 10% para o Brasil e até 50% para países com maior déficit comercial com os EUA.

A decisão gerou reações imediatas, com aliados como a União Europeia criticando as tarifas, alertando para inflação global e prometendo retaliações. Apesar da ofensiva inicial, Trump anunciou em 9 de abril de 2025 uma pausa de 90 dias nas tarifas para a maioria dos países, reduzindo-as para 10%, exceto para a China, que enfrentou um aumento para 145% (somando 125% de tarifa recíproca a 20% já existentes).

Esse recuo foi interpretado como uma resposta à pressão de mercados e aliados, com líderes como o primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, elogiando a pausa como uma chance para negociações.

A China, no entanto, seguiu sem recuar, elevando suas tarifas contra os EUA para 125% em 12 de abril e apresentando queixas à OMC, enquanto Pequim comparava as ações de Trump à Lei Tarifária de 1930, que aprofundou a Grande Depressão.

A guerra tarifária intensificou as tensões entre os dois, com Trump sinalizando negociações, mas sem avanços concretos, enquanto pequenas empresas chinesas buscavam novos mercados, como a Europa, para mitigar os impactos.

Falando no Salão Oval na terça-feira, Trump também disse que estava otimista sobre a melhoria das relações comerciais com a China. Ele disse que o nível de tarifas que ele impôs às importações chinesas "cairia substancialmente, mas não será zero"

Elon Musk, inicialmente um defensor das políticas de Trump, pressionou o presidente a rever as tarifas, argumentando que elas prejudicavam cadeias globais de suprimentos, incluindo as da Tesla. Essa divergência pública expôs fissuras na aliança entre Trump e Musk, dificultando a narrativa de unidade do governo.

IMPASSES NA GUERRA DA UCRÂNIA

Na política externa, Trump prometeu encerrar a guerra na Ucrânia “em um dia”, mas os primeiros 100 dias revelaram a complexidade do conflito. A administração adotou uma postura dura contra o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, criticado publicamente por Trump e pelo vice-presidente JD Vance em um encontro televisionado na Casa Branca. A suspensão da ajuda militar americana à Ucrânia, seguida de negociações bilaterais com a Rússia na Arábia Saudita, sem a participação ucraniana, intensificou as tensões com Kiev.

Zelensky exigiu ser incluído em qualquer mediação, enquanto o senador democrata Chuck Schumer acusou Trump de “fazer o trabalho sujo de Putin”. Embora Trump tenha anunciado que tanto Zelensky quanto Putin expressaram disposição para negociar, as conversas não avançaram. Uma trégua limitada foi anunciada, mas teve pouco efeito prático, com bombardeios russos continuando em áreas residenciais ucranianas.

A aproximação de Trump com Putin, incluindo planos para uma reunião em abril na Arábia Saudita, rompeu o isolamento internacional de Moscou, mas alienou aliados europeus, especialmente após Vance repreender líderes da Conferência de Segurança de Munique por restringirem a liberdade de expressão em seus países.

Nas últimas semanas, o governo norte-americano anunciou o início de negociações indiretas com o Irã sobre seu programa nuclear, conduzidas pelo enviado especial Steve Witkoff em Roma e Omã. A administração Trump adotou uma política de “pressão máxima”, com sanções e ameaças de intervenção militar caso Teerã avance na busca por armas nucleares.

Em março, Trump autorizou bombardeios contra os Houthis no Iêmen, aliados do Irã, como um recado a Teerã, e enviou um segundo porta-aviões à região. Apesar disso, o presidente se opôs a um ataque israelense a instalações nucleares iranianas, priorizando as negociações.

Em entrevista recente, Trump afastou qualquer possibilidade de conflito direto, frustrando os anseios do governo israelense. “Netanyahu não pode me arrastar para uma guerra com o Irã. Eu estou pronto para dialogar com o líder supremo iraniano”, afirmou o republicano.

As conversas, no entanto, enfrentam obstáculos. O aiatolá Ali Khamenei expressou pessimismo quanto às intenções americanas, e o Irã ameaçou retaliar qualquer ataque. A falta de avanços concretos e a escalada retórica, com Trump afirmando que “cada tiro dos Houthis será visto como um tiro do Irã”, torna as negociações cada vez mais sensíveis .

APROVAÇÃO EM QUEDA

A popularidade de Trump, que começou o mandato com apoio sólido de sua base, agora está em 44%, segundo a Fox News. O republicano tem o pior início de um presidente desde Bill Clinton, em 1993. Protestos em massa, como os 700 atos organizados em 19 de abril, criticaram as políticas de imigração, os cortes de gastos públicos e o apoio a Israel.

A oposição democrata, embora enfraquecida e fragmentada, ganhou tração com figuras como Bernie Sanders e Alexandria Ocasio-Cortez, que atraíram milhares em comícios contra a “oligarquia” de Trump.

Elon Musk, figura central na campanha de Trump, assumiu a liderança do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), com a missão de cortar gastos e reduzir a burocracia federal. Nos primeiros 100 dias, o DOGE demitiu cerca de 200 mil funcionários públicos, gerando protestos e ações judiciais. Musk anunciou cortes de US$ 105 bilhões, mas apenas US$ 8,6 bilhões foram verificados, levantando dúvidas sobre a transparência e eficácia da iniciativa. A forma de se fazer política do bilionário, incluindo demissões em massa, foi criticada como insensível, e parlamentares republicanos enfrentaram a ira de eleitores em reuniões públicas.

A imagem de Musk também sofreu abalos devido à queda de 40% nas ações da Tesla e a uma redução de 76% nas vendas na Alemanha, atribuídas parcialmente a sua associação com Trump e à rejeição de consumidores progressistas. Atos de vandalismo, como a destruição de Teslas em Londres e nos EUA, simbolizaram a revolta contra o bilionário.

Rumores de sua saída do governo, confirmados por Trump em abril, indicam que Musk pode deixar o DOGE em breve para se dedicar à Tesla, que enfrenta seu pior trimestre desde 2022. Apesar dos elogios de Trump, que o chamou de “fantástico” e “patriota”, a percepção de Musk como um “fardo político” cresceu, especialmente após sua derrota na eleição judicial de Wisconsin e divergências públicas sobre as tarifas.

Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞
Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Gustavo Freitas
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!