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Justiça anula condenações de acusados do 'Caso Evandro'

Réus foram absolvidos após fitas de áudios indicarem que eles foram torturados para confessar crimes que não cometeram

Kamila Murakami

Os acusados pela morte do menino Evandro Ramos Caetano, crime que ficou conhecido como “Caso Evandro”, foram inocentados pelos desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), por maioria dos votos, nesta quinta-feira (9). O caso aconteceu em Guaratuba, no litoral do Paraná, no ano de 1992. 

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Em revisão criminal, o tribunal de desembargadores absolveu, por 3 votos a 2, Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira (falecido em 2011). “Vencemos a luta da nossa vida”, disse Beatriz, após a anulação da pena.  

A revisão criminal serve para o Judiciário analisar novamente um caso julgado anteriormente, no qual o réu entende que foi condenado de forma injusta. Ela pode ser solicitada em quatro casos: quando a condenação foi contrária a uma lei; quando a condenação foi contrária a uma evidência dos autos; quando a condenação foi fundada em uma prova falsa; ou quando houver uma nova prova da inocência do condenado.

Os desembargadores Gamaliel Seme Scaff, Adalberto Xisto Pereira e o desembargador substituto, juiz Sergio Luiz Patitucci, votaram a favor, com o entendimento que os condenados foram torturados para fazerem uma falsa confissão. A decisão dos magistrados se deu após fitas de áudio com os indícios de tortura se tornarem públicas.

Segundo o Tribunal de Justiça do Paraná, os desembargadores Miguel Kfouri Neto e Lidia Maejima votaram contra por entenderem que as fitas precisariam ter passado por perícia. A decisão dessa quinta-feira (9) não cabe recurso, portanto, além da anulação, todos os condenados podem pedir uma indenização na esfera civil.

Em nota, a defesa dos agora inocentados afirmou que "hoje, a justiça foi feita". E destacou ainda o trabalho do jornalista Ivan Mizanzuk, responsável por identificar as fitas com indícios de tortura.

" O julgamento de hoje é uma lição para o presente e para o futuro. Os Desembargadores Adalberto Jorge Xisto Pereira, Gamaliel Seme Scaff e Sérgio Luiz Patitucci fizeram história ao deixar claro que a tortura não será aceita como método de investigação", concluiram os defensores. 

Fitas

Em agosto deste ano, os desembargadores decidiram permitir que gravações com indícios de que os réus foram torturados por policiais fossem usadas como provas no julgamento da revisão criminal do caso. Os áudios foram encontrados em minifitas cassetes pelo jornalista Ivan Mizanzuk e revelados em uma série documental da “Globoplay”, baseada no podcast Projeto Humanos.

As gravações indicam que os réus confessaram os supostos crimes mediante tortura e recebendo instruções para a confissão. O material estava nos autos do processo desde a época da condenação, mas a versão utilizada para incriminar os réus não tinha os trechos que indicam a tortura. A versão considerada pelos desembargadores é a íntegra da gravação.

Relembre o caso

No ano de 1992, Evandro Ramos Caetano, à época com seis anos, sumiu no trajeto entre a casa onde morava e a escola. Após ele ser encontrado morto com sinais de violência, sete pessoas foram acusadas pelo crime e quatro foram condenadas, são elas: Airton Bardelli dos Santos, Francisco Sérgio Cristofolini, Vicente de Paula, Osvaldo Marcineiro, Davi dos Santos Soares, Celina Abagge e Beatriz Abagge.

Segundo a investigação, Evandro estava com a mãe, Maria Caetano, que era funcionária de uma escola municipal de Guaratuba, e disse a ela que iria voltar para casa após perceber que havia esquecido o mini-game. Essa foi a última vez que ele foi visto. 

Em 11 de abril de 1992, um corpo foi encontrado em uma área de matagal, e o pai de Evandro, Ademir Caetano, afirmou ao Instituto Médico-Legal (IML) de Paranaguá ter reconhecido o filho por meio de uma pequena marca de nascença nas costas.

Na época, as investigações apontaram que Beatriz Abagge e a mãe dela, Celina Abagge, então primeira-dama de Guaratuba, haviam encomendado a morte do menino em um ritual. O caso chegou a ser chamado de as “Bruxas de Guaratuba" e as duas passaram mais de cinco anos encarceradas. Davi e Osvaldo também foram presos acusados de sequestrar e matar o menino.

O caso teve cinco julgamentos diferentes. Um dos tribunais do júri, realizado em 1998, foi o mais longo da história do Judiciário brasileiro, com 34 dias. Nesse momento, Beatriz e Celina foram inocentadas porque não houve a comprovação de que o corpo encontrado era do menino Evandro.

No entanto, o Ministério Público recorreu e um novo júri foi realizado em 2011. Nele, Beatriz foi condenada a 21 anos de prisão. Celina, a mãe, não chegou a ser julgada, pois, como estava com mais de 70 anos, o crime prescreveu.

As penas de Osvaldo Marcineiro e Davi dos Santos se extinguiram pelo cumprimento. O último réu, Vicente de Paula, morreu por complicações de um câncer em 2011, no presídio onde cumpria pena.

(*Kamila Murakami, estagiária de Jornalismo, sob a supervisão de Hamilton Braga, coordenador do núcleo de Política)

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