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Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial: avanço na lei antirracista auxilia na luta do negro

Advogada e militante do movimento negro Samara Tirza Dias Siqueira fala sobre o avanço das leis antirracistas, instrumentos importantes no combate ao racismo no Brasil. Saiba como conhecer e apoiar a luta dos movimentos negros

Gabriel Bentes

No Brasil, comemora-se em 3 de julho o Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial. A data surgiu em homenagem ao dia da aprovação pelo Congresso Nacional, em 1951, sobre a primeira lei contra o preconceito racial no país, conhecida como Lei Afonso Arinos - nome do Deputado Federal da União Democrática Nacional (UND) mineira que apresentou o Projeto de Lei em julho de 1950 - e visa dar luz às batalhas e conquistas de direitos sociais para todas as raças.

Essa iniciativa foi motivada pela discriminação enfrentada pela bailarina afro-americana Katherine Dunham, que tentou se hospedar em um hotel em São Paulo mas foi barrada devido à cor de sua pele. O caso recebeu pouca atenção no Brasil, mas gerou ampla repercussão negativa internacionalmente, destacando a questão do racismo no país. Com isso, surgiu a lei que considera contravenção penal as práticas racistas no Brasil. Mas, de lá para cá, a lei foi atualizada diversas vezes para combater com mais efetividade as diversas expressões de discriminação racial.

Avanço da lei contra o racismo no Brasil

Apesar do avanço constitucional em 1951 após o período escravocrata no Brasil (1535-1888), a lei não teve muita efetividade por não haver condenação, e sofreu alterações ao longo do tempo. Veja como a lei mudou:

  • Em 20 dezembro de 1985, foi instituída a Lei Nº 7.437, que inclui entre as contravenções penais a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil, dando nova redação à Lei nº 1.390, de 3 de julho de 1951 - Lei Afonso Arinos
  • Em 1988, no centenário da abolição da escravidão, o deputado negro Carlos Alberto Caó de Oliveira promulgou à Constituição Federal de 1988 a Lei Nº 7.716, conhecida como Lei Caó - referindo-se ao político, advogado, jornalista e militante do movimento negro autor da nova redação - que buscava a mudança da ótica pelo jurídico sobre o racismo, atualizando-o de contravenção penal para crime propriamente dito. Aprovada, em 5 de janeiro do ano seguinte, a lei, ainda vigente, prevê pena de reclusão de um a três anos e multa - valendo ainda para atos discriminatórios de raça, etnia, religião ou procedência nacional;
  • Em 11 janeiro de 2023, a injúria racial foi equiparada ao crime de racismo pela Lei 14.532, com a mesma pena para ambas as práticas. Além disso, a lei prevê pena para a prática de racismo religioso e recreativo.

Para a advogada Samara Tirza Dias Siqueira, que também é professora universitária, doutoranda e Mestra em Direito e militante do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará, a mudança na lei no ano passado foi bastante importante para o combate do racismo no país, porque “geralmente o judiciário, as delegacias de polícia, acabavam enquadrando os crimes de racismo como injúria racial. E isso tinha muito prejuízo para a vítima, porque tinha todo um tratamento jurídico diferente entre esses dois crimes”.

“É um imenso avanço, para a gente expandir juridicamente e começar a valorar juridicamente outras expressões de racismo, como o religioso”, complementa a advogada.

Mas qual a diferença de racismo e injúria racial?

Após a modificação da lei em 2023, o racismo e a injúria racial passam a ter o mesmo tratamento jurídico. Mas qual a diferença entre as práticas? A advogada Samara Siqueira explica: “A injúria racial tem um cunho de violação, de ofensa mais pessoal, aquela violação que ela é mais direcionada a uma pessoa. Se eu chego e chamo a pessoa de ‘macaca’, de ‘urubu’, de ‘preta vagabunda’. Ela é uma ofensa direcionada para alguém. É diferente do racismo, que é uma ofensa coletiva. ‘Para mim, todas as pessoas negras não prestam, todas as pessoas negras têm mau-caráter’. Isso é considerado crime de racismo".

Combate ao racismo no Brasil

Além das leis contra o racismo, o combate à discriminação racial está ligado também na educação do ser humano sobre a diversidade de pessoas e igualdade entre elas. No Brasil, a Lei No 10.639 “estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática 'História e Cultura Afro-Brasileira', e dá outras providências”, que reforça o ensinamento nas escolas sobre história da ancestralidade do próprio país.

“A partir do momento que a gente começa a ensinar e começa a desmistificar as imagens que estão presentes [no imaginário], as imagens pejorativas, as imagens subalternizadas, as imagens marginalizadas no imaginário social - e a gente começa isso pela educação -, eu acho que é uma forma também de enfrentamento eficaz do racismo. Mas, a gente precisa que essa lei também seja eficaz, seja efetiva, seja garantida nas escolas, que geralmente não é”, observa Samara.

Além disso, a advogada e militante do movimento negro complementa que é extrema importância apoiar os movimentos sociais das pessoas negras. “Não foram leis que nos foram dadas, foram leis que foram propostas com muita luta dos movimentos negros. Então, a gente precisa fortalecer as atividades dos movimentos, respeitar as atividades dos movimentos negros, que têm um papel essencial na nossa sociedade de enfrentamento ao racismo”, diz a professora.

(*Gabriel Bentes, estagiário de jornalismo, sob supervisão de Vanessa Pinheiro, editora web de oliberal.com)

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