Belém 408 anos: De espécie asiática, mangueiras e seus túneis se tornaram a cara de Belém

Árvores foram plantadas em larga escala nas ruas da cidade durante a gestão de Antônio Lemos

Ádria Azevedo | Especial para O Liberal

Belém é conhecida como “Cidade das Mangueiras”, por conta dos túneis formados por essas árvores, em várias vias da capital. As mangueiras belenenses não apenas embelezam a cidade: trazem o conforto da arborização, dão mangas para qualquer pessoa que se dispuser a pegá-las e estabelecem com moradores uma relação de afetividade.

Apesar de não ter sido quem originalmente introduziu a espécie em Belém, Antônio Lemos foi responsável pelo seu plantio pelas principais ruas da cidade, durante sua gestão, na virada do século XIX para o século XX. Foi esse plantio que deu origem aos famosos túneis de mangueiras.

Por serem tão a cara de Belém, as mangueiras são um patrimônio para a cidade, que os moradores acreditam que precisa ser preservado.

Afetividade

Seja por conta das mangas, da beleza dos túneis ou da sombra que elas dão, muitos belenenses têm com as mangueiras uma relação de afetividade. 

image Mangueiras fazem parte da história da jornalista Regina Romeiro, que cresceu no bairro de Nazaré (Foto: Marx Vasconcelos | Especial para O Liberal)

A jornalista Regina Romeiro, moradora do bairro de Nazaré, conta que as mangueiras fazem parte de sua história. “Eu nasci na Avenida Nazaré, então eu tenho essa relação afetiva, todo esse encanto pelas mangueiras. Dizem que ela não é o tipo de árvore mais adequado para a nossa cidade, mas eu acho que casou tão bem. Formou esses túneis maravilhosos que a gente vê, que rendem imagens belíssimas”, elogia.

Para ela, as mangueiras são um patrimônio a ser preservado. “Acho que é algo que tem um potencial enorme. Não só para o turismo, mas para o aconchego do próprio belenense. Porque dá essa arborização, esse conforto. E tem a beleza do verde, presente em meio à selva de pedra”, opina.

Regina diz que também gosta quando chega o período de manga. “Nessa época, eu corro atrás de manga, junto, como, levo para os amigos”, relata. O apreço pela fruta é compartilhado pelo auxiliar de serviços gerais Vandernei Pastana. “Quando trabalhava em uma empresa em São Brás, tinha uma mangueira próximo, e as mangas eram nossa sobremesa, nosso lanche. Era manga maçã, uma das melhores mangas que existem. O vento batia no início da tarde, as mangas caíam e a gente pegava”, conta. 

Pastana também acredita que os túneis de mangueiras são pontos turísticos da capital. “As pessoas vêm visitar, vêm ver esses túneis, eles dão beleza às ruas. Acho que tem que ser preservados sempre”, conclui.

História

Segundo José Edmar Urano de Carvalho, engenheiro agrônomo da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), não se sabe com precisão quando a mangueira, uma espécie asiática, foi introduzida em Belém. “O historiador paraense Augusto Meira Filho, baseado em um manuscrito de Alexandre Rodrigues Ferreira, postula que a espécie foi introduzida pelo arquiteto bolonhês radicado no Pará Antônio Landi. A leitura minuciosa do manuscrito revela, no entanto, que o verdadeiro introdutor da mangueira foi o capitão João Manoel Rodrigues, sogro de Antônio Landi. Landi teve papel importante, pois semeou parte das sementes recebidas pelo capitão”, relata. O arquiteto Landi viveu no Pará no século XVIII.

Nesse sentido, as mangueiras teriam inicialmente sido plantadas em terrenos particulares, como o sítio de Landi, com sementes importadas da Índia, Filipinas e Paquistão. Apenas sob a gestão de Antônio Lemos, elas foram semeadas em logradouros públicos, para embelezar e arborizar a cidade que deveria ser a “Paris n’América”. 

Além dos objetivos estéticos e climáticos, o plantio de mangueiras tinha ainda um outro papel para Lemos: o sanitarista. “No final do XIX, acreditava-se que os odores ruins encontrados em águas paradas, alimentos em decomposição e outros continham os miasmas, ou seja, elementos responsáveis pela transmissão de doenças que causavam diversas epidemias. A teoria miasmática é importante para a compreensão da arborização implantada na época. Por conta dela, constroem-se as diversas praças, como a Praça da República e Praça Batista Campos, assim como se plantam as mangueiras, como uma das maneiras de combater os miasmas”, conta o doutorando em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal do Pará, George Lima. 

“A escolha da mangueira, segundo o que se encontra nos relatórios de Antônio Lemos, vincula-se ao bom cheiro das folhas, ao fruto que alimentaria a população de baixa renda e migrante, assim como o grande porte e sombra para refrigério dos paraenses”, completa o pesquisador.

Kayan Rossy, diretor do Departamento de Áreas Verdes Públicas da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Belém (Semma) complementa: “Durante o plantio por Antônio Lemos, eles queriam árvores de copa grande e com rápido crescimento, mas na época não avaliaram a questão do enraizamento, que hoje sabemos que traz problemas”, lembra.

image Preservação das mangueiras frente às necessidades da urbanização apresentam um desafio; fiação elétrica precisa ser toda desligada para realizar as podas (Foto: Marx Vasconcelos | Especial para O Liberal)

Conservação

Kayan Rossy explica que a conservação das mangueiras, realizada pela Semma, envolve controle de pragas, podas de diversos tipos, construção de gola no entorno da base do vegetal e limpeza. “Os maiores desafios estão relacionados aos fios elétricos que envolvem 70% desses vegetais. Com isso, dependemos do desligamento da rede de energia no local para fazer o trabalho”, esclarece. “As demandas de podas são espontâneas ou por meio de solicitação. Nossas equipes fiscalizam os vegetais e, caso identifiquem riscos ou necessidade de intervenção, elas são programadas”, explica.

Sobre os desafios de conciliar a preservação das mangueiras com o crescimento da cidade, o especialista ressalta que precisa haver um processo de conscientização dos profissionais de urbanização e construção civil. “É perfeitamente possível construir em harmonia com a natureza. Já existem tecnologias, soluções e técnicas que nos permitem colocar árvores de diversas formas em locais já urbanizados. Avanço não é só concreto e asfalto, é imprescindível haver muito verde”, alerta.

Safra

De acordo com José Edmar Urano, a safra de manga em Belém se inicia por volta da segunda quinzena de outubro e se prolonga até o final de março. “O pico de produção ocorre entre a segunda quinzena de dezembro e a primeira quinzena de janeiro. As mangueiras utilizadas na arborização da cidade produzem, por ano, entre 40 e 60 toneladas de frutos”, detalha.

Apesar disso, o pesquisador informa algo que pode ser uma decepção para alguns belenenses: “Embora Belém seja a Cidade das Mangueiras, a quase totalidade das mangas comercializadas nos supermercados de Belém (mais de 95%) é importada das regiões nordeste e sudeste do Brasil”.

Serviço

Solicitações para realização de podas podem ser feitas ao Departamento de Áreas Verdes Públicas da Semma, no número (91) 98496-9039.

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