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Sem abrigos públicos, Belém estuda implantação de casas de acolhimento para idosos

Dentre as instituições privadas, a Casa do Pão de Santo Antônio acaba de completar 95 anos de assistência a esse público na capital paraense

Gabriel da Mota

A ideia de enviar um idoso para um abrigo ainda gera preconceitos e interpretações equivocadas, sendo muitas vezes associada ao abandono familiar. No entanto, a realidade é que esses espaços são essenciais para garantir cuidados adequados a idosos que necessitam de acompanhamento especializado. Em Belém, apesar de iniciativas privadas bem estruturadas como a Associação da Pia União do Pão de Santo Antônio, não há abrigos públicos em funcionamento, segundo a Fundação Papa João XXIII (Funpapa). Para a Ordem dos Advogados do Brasil — Seção Pará (OAB/PA), o Ministério Público pode ser um parceiro do Poder Executivo na garantia desse tipo de direito aos idosos.

Fundada em 13 de janeiro de 1930, a Casa do Pão de Santo Antônio surgiu de uma promessa feita por Ernestina Cerqueira Magalhães a Santo Antônio, após a recuperação de seu esposo de uma grave enfermidade. Desde então, a instituição se tornou referência no acolhimento de idosos na capital paraense, atendendo atualmente cerca de 70 residentes, mas com capacidade para 100. A instituição é privada, sem fins lucrativos, e se mantém por meio das mensalidades dos residentes, doações privadas e promoções.

“Nosso objetivo é oferecer convívio com pessoas da mesma idade, assistência integral e um ambiente acolhedor e cheio de amor”, explica Socorro Morgado, diretora-presidente da instituição. A rotina é estruturada para promover bem-estar, com atividades físicas, cognitivas, terapêuticas e espirituais, além de cuidados médicos diários.

image Atualmente, 70 idosos residem na Casa do Pão de Santo Antônio em Belém (Thiago Gomes / O Liberal)  

O processo de entrada no abrigo é criterioso e envolve avaliação técnica por uma equipe multidisciplinar composta por assistente social, geriatra, enfermeira, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, psicóloga e nutricionista. A assistente social Valéria Costa destaca que esse cuidado inicial é fundamental:

“O idoso conhece a instituição junto com a família, tirando dúvidas e garantindo que a decisão seja confortável para todos. O acompanhamento da adaptação é diário e contínuo”. 

Além disso, a Casa do Pão de Santo Antônio busca oferecer uma estrutura que favoreça a autonomia e a integração social dos residentes. “As atividades em grupo ajudam os idosos a manterem a memória, a atenção e a conexão com a sociedade, estimulando habilidades antigas e novas”, explica a terapeuta ocupacional Raphaella Loureiro. Jhessica Silva, enfermeira da Casa do Pão de Santo Antônio, destaca a importância do cuidado especializado oferecido aos idosos: “Aqui, muitos chegam com problemas como hipertensão e diabetes descontrolados, mas, com o acompanhamento próximo e o cuidado da equipe multiprofissional, conseguimos estabilizar essas condições. A medicação é administrada de forma assertiva, nos horários e doses corretos, o que melhora significativamente a qualidade de vida deles”.

O impacto nas famílias e nos idosos

A aposentada Ana Celeste Arnould Torres, 81 anos, vive na Casa do Pão de Santo Antônio há um ano e sete meses, após enfrentar dificuldades em morar sozinha. “Eu morava em um apartamento que teve um problema de incêndio. Fui para a casa de uma parente, mas não deu certo, porque ela viajava muito. Depois fui para um hotel, mas era muito dispendioso. Então, parentes do meu sobrinho me ajudaram a vir para cá”, explica. Ana Celeste tem uma rotina estruturada, com atividades que a mantém ocupada. 

Sobre a adaptação à nova realidade, Ana Celeste reflete: “Sempre dormi em cama de casal e, quando cheguei aqui, estranhei muito a cama de solteiro, mas fui me adaptando. Participo das atividades, gosto de sair de vez em quando para comer pizza ou comida japonesa, e também tenho meu tempo de descanso. Aqui eu tenho um espaço meu, leio bastante, assisto meus programas. A gente tem que se adequar”.

Direitos e obrigações do Estado

De acordo com o Estatuto do Idoso, é dever do Estado assegurar direitos básicos, como saúde, moradia e assistência social. A advogada Ana Maria Magno Freitas, da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa da OAB/PA, reforça que o acolhimento institucional é uma obrigação pública em situações onde a família não tem condições de cuidar do idoso.

“Quando a família opta por colocar o idoso em um abrigo público ou particular, ela deve comprovar que não tem condições de continuar com o idoso em seu meio familiar. Isso leva em consideração que muitos familiares estão trabalhando para sua própria sobrevivência. Nessas situações, o Estado tem a obrigação de oferecer abrigos com condições adequadas de segurança, alimentação, preocupação com a saúde e atendimento individualizado”, explica a advogada.  

À reportagem, a Prefeitura de Belém, por meio da Fundação Papa João XXIII (Funpapa), informou que está em fase de estudos técnicos e de viabilidade orçamentária para a implantação de um abrigo público para idosos, mas ainda não há prazo para a conclusão do projeto.

De acordo com a representante da OAB/PA, o Ministério Público é a 'mola mestra' da questão. "Considerando que ele é o fiscal da lei, junto com a OAB, eles podem entrar como dois parceiros de consórcio em uma ação ou resolução para intervir no sentido de proteger o direito dos idosos", argumenta.

Belém