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Projetos de lei visam a retirar o plástico do cotidiano

Deputados e vereadores miram em sacolas, canudos, copos e outros artigos

Keila Ferreira

Sacolas, canudinhos, pratos, copos e outros utensílios de plásticos parecem estar com os dias contados. Os legisladores paraenses têm apresentado projetos que tentam retirar das ruas este que é um dos maiores vilões do meio ambiente: o plástico. Porém, fazer com que essas medidas não se transformem em letra morta requer um caminho mais longo, que passa pela mudança de comportamento da população, atitude dos empresários, fiscalização dos órgãos competentes, atuação dos próprios parlamentares, em cobrar do poder público ações para o cumprimento das leis, e políticas públicas voltadas ao meio ambiente.

Na última terça-feira (17), na Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), a Comissão de Constituição e Justiça aprovou o projeto de lei que dispõe sobre a substituição e recolhimento de sacolas plásticas em estabelecimentos comerciais existentes no Estado, revogando legislação que já tratava sobre o mesmo tema. Há dois anos, foi sancionada em Belém outra lei, determinando a substituição de sacolas convencionais por material oxibiodegradável, biodegradável ou de papel. Ela também alterava legislação anterior, que instituiu a disponibilidade de uso de sacolas ecológicas, em substituição das sacolas plásticas convencionais nos estabelecimentos comerciais no município. Mais recentemente, no dia 14 de agosto deste ano, os vereadores da capital aprovaram outro projeto, proibindo o uso de canudos plásticos em restaurantes, bares, quiosques, comércio ambulante, hotéis e similares de Belém. Emenda aditiva também incluiu o uso de copos e pratos plásticos nessa proibição. A proposta precisa ser sancionada pelo prefeito Zenaldo Coutinho.

Propostas são positivas, afirma a Aspas

Presidente da Associação Paraense de Supermercados (Aspas), Jorge Portugal observa que o projeto em tramitação na Assembleia Legislativa é mais rigoroso do que o aprovado anteriormente, do ex-deputado Marcio Miranda, e da Câmara Municipal, que ainda permitiam o uso de material oxibiodegradável. Segundo ele, o que está prestes a ser apreciado pelos deputados estaduais é similar ao que vem sendo adotado em Estados como Rio de Janeiro e São Paulo, onde os estabelecimentos comerciais passaram a usar material biodegradável, oriundo de fontes renováveis, como a cana-de-açúcar.

Responsabilidade - "A vantagem é o clamor mundial contra a poluição. A gente tem visto reportagens no mundo todo, sobre a quantidade de plástico nos oceanos, que é jogado no meio ambiente", afirma o presidente da Aspas, que considera as medidas positivas. "Nós somos também responsáveis pelo meio ambiente, não só o governo", diz. Além disso, um dos objetivos do projeto de lei é incentivar o uso de sacola retornável. "Quando você vai às compras, você leva as suas sacolas, onde você traz as suas compras e evita o uso indiscriminado (de sacolas plásticas)", argumenta. Pelo texto da matéria em tramitação na Alepa, de autoria do presidente da casa, deputado Dr. Daniel Santos (MDB), os estabelecimentos comerciais do Pará ficam proibidos de distribuir gratuitamente ou cobrando, sacos e sacolas plásticas descartáveis compostos por polietilenos, polipropilenos ou similares, devendo substituí-los, pelo prazo de 18 meses, por sacolas retornáveis. Ainda conforme o projeto, as sacolas e/ou sacos plásticos reutilizáveis/retornáveis, poderão ser distribuídos mediante cobrança máxima de seu preço de custo. Feitas com fontes renováveis, elas deverão ser confeccionadas nas cores verde, para resíduos recicláveis, e cinza para outros rejeitos, de forma a auxiliar o consumidor na separação dos resíduos e facilitar a identificação para as respectivas coletas de lixo. 

Incentivo - Jorge Portugal admite que o valor da sacola biodegradável é superior ao cobrado pela sacola de plástico. Ele ressalta, porém, que pela lei, esse material poderá ser vendido pelo seu valor máximo, que, em São Paulo, é R$ 0,07, por exemplo. "Mas hoje, o que a gente enxerga, é a questão de incentivar a retornável. A cultura nossa precisa ser mudada", avalia. 

Matéria-Prima - Questionado sobre o abastecimento do mercado local com esse material, o presidente da Aspas sinaliza que não há preocupação em relação a isso. "Como as indústrias que produzem sacolas plásticas no Pará não precisam mudar equipamento nem nada. Apenas a matéria-prima usada na produção desses artigos é que muda. Elas continuariam abastecendo o mercado estadual, só mudariam o tipo de produto. Em vez de utilizar o polietileno, que é derivado do petróleo e se tornou poluente, seria derivado da cana-de-açúcar. Futuramente, vamos passar a ter duas cores de sacola: a verde para aquilo que pode ser reciclado, cujo destino seriam as cooperativas de produtos que podem ser recicláveis como plástico e alumínio; e a cinza com os resíduos orgânicos, que serão levados diretamente para os aterros sanitários das cidades", explica.

Produto "ecológico" é mais caro

Proprietário de uma distribuidora de materiais descartáveis, Flávio Cardoso Neto explica que as sacolas renováveis são entre 15% e 25% mais cara que as sacolas plásticas e hoje, segundo ele, o Pará não tem indústria que desenvolva a produção da sacola retornável. Por isso, os fornecedores serão as grandes indústrias que trabalham no Sul e Sudeste. Em relação aos canudinhos, ele conta que já trabalha com os feitos de papel, mas a procura é muito baixa. "É mais caro também, 20%", afirma. "O canudo já começou a aparecer em algumas localidades que trabalham com vida saudável, então, não adianta eu comprar para estocar e ficar no estoque sem venda. O aumento da procura foi irrisório. Tanto é que eu nem tenho estoque, só compro de acordo com a demanda", diz o comerciante. O promotor da 1ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo, Benedito Wilson de Sá, reforça que a fiscalização tem que ser implantada pelos órgãos municipais e estaduais e defende, inclusive, que a licença de funcionamento seja condicionada ao cumprimento de leis como essas. "Em relação às dificuldades de cumprimento, não vejo nenhuma. Essa prática tem sido feita em outros locais e colou, porque a população se conscientizou. É uma prática extremamente salutar", declarou. 

Impactos são limitados, diz pesquisador

Doutor em Desenvolvimento Socioambiental do Núcleo de Meio Ambiente da Universidade Federal do Pará (UFPA), André Farias, avalia que o impacto desses projetos de lei estaduais e municipais são limitados. O Brasil é o 4º maior produtor de lixo plástico do mundo, e só recicla 1,2% do total descartado, de acordo com a organização WWF. “Então, esse é um problema mundial e está ligado a própria matriz de desenvolvimento de vida no mundo, onde o petróleo é a principal fonte de energia, que serve para fazer funcionar a máquina desses países industrializados,.O plástico é um derivado do petróleo”, diz o professor. Isso fez com que a sociedade adotasse a cultura do descartável, responsável por uma produção imensa de resíduos, entre eles o plástico. Além dos problemas nos grandes centros urbanos, ele observa que esse comportamento traz outra grave consequência, que é a contaminação dos oceanos ou rios, pelo microplástico, que está ocasionando problemas com a fauna aquática. O professor cita pesquisas já realizadas pelas instituições de ensino superior do Estado, na área de ecologia aquática, no rio Amazonas e Xingu, que constataram resíduos plásticos no aparelho digestivo de pelo menos 30% das espécies de peixe analisadas. “O Pará é um dos maiores produtores e consumidores de peixes, então podemos estar vivendo um problema de saúde pública”, ressalta.

Belém