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Passageiros reclamam de falta de ônibus e veículos lotados

Nos tempos da pandemia de covid-19, a principal recomendação é evitar aglomerações. Como há menos ônibus circulando, as paradas ficam cheias e os veículos lotados. Um contrassenso em conflito com o interesse público.

Victor Furtado

Usuários do sistema de transporte público, na Região Metropolitana de Belém, sempre tiveram de suportar longas esperas nas paradas sem abrigos, horários irregulares e veículos lotados e sucateados. O novo desafio, desde que a pandemia de covid-19 — doença causada pelo coronavírus sars-cov-2 — foi decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), é conseguir se locomover evitando aglomerações. Porque todos os problemas anteriores foram potencializados.

Nos últimos pronunciamentos, o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, tem demonstrado preocupação com um possível colapso do sistema de transporte público. O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belém (Setransbel), aponta queda de até 60% no número de usuários. Os empresários, que há alguns anos vêm tendo a demanda de reajustes de tarifas atendidas, historicamente, reclamam que os transportes por aplicativos absorveram parte do público dos ônibus.


Na estimativa do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Belém (Sintrebel), a frota dos quase 2 mil veículos da RMB foi reduzida, em pelo menos, 50%. A redução é ainda maior à noite e quase total no final de semana. E aí, aponta o vice-presidente da entidade, Ewerton Paixão, a conta não fecha: como é exigido que não se formem aglomerações, se com menos ônibus, ficam mais pessoas nas ruas e mais os ônibus ficam lotados?

A preocupação, diz Ewerton, é generalizada. A redução do número de ônibus nas ruas gera uma série de fatores de risco em meio à pandemia. Os passageiros e os rodoviários estão vulneráveis. Rodoviários lidam e têm mais contato direto com pessoas. Precisam pegar em dinheiro.

As empresas, critica o sindicalista, não fornecem álcool gel e nem máscaras aos trabalhadores. Só é feita a limpeza nos finais de linha. Ou motoristas e cobradores se viram para garantir a própria proteção ou estarão ainda mais expostos. O Sintrebel vem tentando negociar escalas de trabalho e medidas preventivas junto ao Ministério Público do Trabalho (MPT).

Ewerton ainda aponta que algumas empresas estão transformando linhas menos rentáveis em linhas mais rentáveis (com mais passageiros e maior trajeto). Com isso, algumas linha tiveram redução de quase 100%, enquanto outras ficaram com excesso de oferta e mal distribuída.

"Tem um decreto municipal que estabelece que os passageiros devem estar sentados e não pode haver mais de oito pessoas em pé. Já nem deveria ser assim. Aí a gente tem menos ônibus. Como que dá conta de levar? As paradas estão lotadas e os ônibus também. Não podemos recusar passageiros, nem queimar paradas e nem tem ônibus suficiente. Como atender todos esses interesses?", conclui o sindicalista.

 

 

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Mais especificamente, quem trabalha com comida tem sido ainda mais demandado à noite e finais de semana durante o período de distanciamento social temporário. A realidade de muitos trabalhadores é não ter transporte oferecido pelos empregadores. Então a dependência do transporte público sempre gerou uma demanda reprimida. Demanda que é atendida pelo transporte alternativo.

Nas vans, o preço cobrado é acima do valor padrão da tarifa metropolitana. Via de regra, cobram de R$ 4 a R$ 5, mas apenas para trajetos mais demandados, como São Brás, Ver-o-Peso, Doca, BR-316 e Icoaraci. Dependendo do destino, o passageiro precisa fazer conexões com outras vans ou mototáxi para chegar a bairros específicos. Aí, rapidamente, o custo com uma única viagem pode escalar para R$ 10 ou mais.


Além de esperar mais, passageiros não se sentem seguros nos ônibus e paradas


Pela manhã e à tarde, a espera pode significar mais tempo aos usuários expostos ao sol e à chuva, já que muitas paradas não possuem abrigos. À noite, há o medo de passar muito tempo esperando. Como o movimento nas ruas não é tão intenso, a sensação de insegurança e exposição é ainda maior.

Rosângela Duarte é empregada doméstica. Mora no Distrito Industrial de Ananindeua e pega quatro conduções por dia. Disse que notou um aumento na espera por ônibus. Antes, em 30 minutos ou pouco mais, conseguia se deslocar. Agora não espera menos de uma hora. "Sempre demorou muito. Mas agora é mais porque as frotas estão reduzidas. Já a limpeza dentro dos ônibus, nem todo mundo se importa", conta.

"Precisamos trabalhar. O governo está fazendo a parte dele e de forma correta. Mas tem menos ônibus nas ruas e fica esse transtorno. Antes eu passava uns 10 minutos na parada. Agora são 40, 50 minutos. E quando passa ônibus, está lotado", comenta o autônomo Wagner Silva.

Na opinião da corretora de imóveis Thamires Correa, ao menos nos ônibus que ela pega, a lotação diminuiu. Mas não ficou mais fácil pegar ônibus. Enquanto isso, diz que viu a quantidade de vans explodir. "Agora segura eu não me sinto não. Só algumas pessoas se preservam do vírus.. Eu só saio de casa por necessidade mesmo", diz.

À noite, a reportagem fez o teste no sábado e no domingo, às 22h, na avenida Augusto Montenegro. Algumas pessoas nas paradas apontavam esperar três horas por linhas como Satélite-UFPA e Icoaraci-UFPA, que até 23h30 não passaram. Muitos desistiam e iam de vans ou de mototáxi. Ou pegavam qualquer um para descer num ponto de maior movimento e pegar outro transporte para o destino desejado.

Quem tinha coragem de pegar os celulares para ver quanto daria uma corrida por aplicativos, se assustava em ver valores até 50% mais elevados. Isso porque muitos motoristas, com a redução do número de viagens, entregaram carros alugados e a oferta diminuiu. A mobilidade  urbana sempre foi desafio para quem depende do transporte público. A pandemia de covid-19 só escancarou problemas que vinham sendo combatidos desde as jornadas de junho de 2013.


Semob e Setransbel dizem estar fazendo o melhor que podem


Em nota, a Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (Semob) informou que "...vem mantendo a fiscalização de transporte em toda a cidade, buscando cobrir o maior número de áreas, sendo que a cidade possui cerca de 1,5 mil pontos de parada e mais de 1.000 coletivos circulantes".

"Em dois dias de fiscalização da nova portaria complementar ao decreto municipal, que determina no máximo lotação de oito passageiros em pé, cinco veículos foram flagrados trafegando acima da capacidade e as empresas foram autuadas", seguiu a nota da Semob. O órgão não falou sobre medidas para garantir o transporte à noite e em finais de semana.

Também por nota, o Setransbel garantiu que "...vem seguindo as orientações da Semob, com a frota sendo dimensionada de acordo com a demanda de passageiros e sempre priorizando a melhor oferta no horário de pico. Vale destacar que essa programação é reavaliada diariamente".

Ainda na nota, os empresários de transporte disseram: "Ressaltamos que o setor gera mais de 10 mil empregos diretos e o transporte reflete a realidade da economia da cidade e é tão essencial quanto outros serviços. Por isso, diferente de demais segmentos, as empresas de ônibus não deixam de operar ainda que em momentos como este, porém amargam prejuízos, que podem ocasionar o colapso do sistema".

Belém